Borrelho-de-coleira-interrompida. Foto: Rison Thumboor/Wiki Commons

Investigadores criam site com 26 anos de censos às aves do Estuário do Mondego

Pilritos, tarambolas e borrelhos são algumas das espécies aquáticas invernantes mais comuns no Estuário do Mondego, segundo o novo site que reúne 26 anos de dados naquela importante zona húmida.

 

Todos os anos, durante o Inverno, milhares de aves aquáticas migram para zonas mais temperadas em busca de climas mais amenos. Por isso, esta é a melhor altura para se fazer um recenseamento detalhado das populações de aves aquáticas, incluindo muitas espécies que nidificam nas zonas árticas.

O Censo Internacional de Aves Aquáticas (International Waterbird Census) acontece em 143 países. No mês de Janeiro, ou Fevereiro, centenas de investigadores e voluntários de diversas instituições juntam-se para contar estas aves e estimar o tamanho das suas populações e como evoluem ao longo do tempo.

 

Flamingos no Estuário do Mondego. Foto: Ricardo Jorge Lopes

 

As aves aquáticas registadas são garças, corvos-marinhos, cegonhas, íbis, colhereiros, flamingos, patos, gansos, borrelhos, gaivotas, entre muitas outras.

Em Portugal, o Censo Internacional é coordenado pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), com o objectivo de conhecer as tendências das populações de aves aquáticas que passam o Inverno no nosso país.

O Estuário do Mondego é um dos locais onde são feitas contagens. Este programa de monitorização faz registos há 26 anos e para celebrar o Dia Mundial das Zonas Húmidas (a 2 de Fevereiro) lançou um site onde os dados recolhidos estão disponíveis ao público.

Desde 1994, no âmbito do Censo Internacional de Aves Aquáticas e do Programa Nacional de Monitorização de Aves Aquáticas Invernantes (ICNF), são contadas anualmente, em Janeiro, todas as aves aquáticas que invernam no Estuário do Mondego.

 

Estuário do Mondego. Foto: Ricardo Jorge Lopes

 

“Quando iniciámos as contagens em 1994, no âmbito dos nossos objectivos de investigação, apercebemo-nos que a longo termo os dados obtidos poderiam ser únicos a nível português, devido à sua qualidade e persistência temporal”, disse, em comunicado, o investigador do CIBIO-InBIO e coordenador do programa, Ricardo Jorge Lopes. “Por um lado, o Estuário do Mondego é relativamente pequeno, o que permite contar com exatidão todas as aves presentes, o que não é possível em estuários maiores. Por outro lado, as nossas contagens foram sempre feitas com a mesma metodologia e voluntários, o que torna os nossos dados muito robustos.”

Até agora já foram contabilizadas no Estuário do Mondego um total de 62.388 aves de 25 espécies, vindas principalmente do Norte da Europa, Islândia, Gronelândia e Sibéria. Estes dados contabilizam o grupo mais abundante de aves aquáticas neste estuário, geralmente conhecido por aves limícolas. Os dados sobre as restantes aves aquáticas serão brevemente disponibilizados.

Desde 1994, o número total de aves limícolas aumentou no Estuário. Segundo Ricardo Jorge Lopes, “foi interessante observar o aumento da abundância de algumas espécies. Por exemplo, o flamingo (Phoenicopterus roseus) e a garça-branca-grande (Egretta alba) são espécies que começaram a utilizar o estuário assiduamente. O pernilongo (Himantopus himantopus), que nidifica nas salinas do estuário e migra para áreas mais meridionais, começou a ser observado em Janeiro, o que pode indicar mudanças nas suas estratégias de migração”.

Mas nem tudo são boas notícias, acrescentou. “Para algumas espécies houve diminuições drásticas, como é o caso do alfaiate (Recurvirostra avosetta)”.

 

Ricardo Jorge Lopes, durante o censo de 2019. Foto: Tiago Múrias

 

Os dados do Programa de Monitorização no Estuário do Mondego, agora disponíveis, são a série temporal mais longa e consistente sobre a abundância de aves invernantes num estuário português. As informações reunidas ajudam a perceber a importância do Estuário do Mondego para as aves aquáticas e já contribuíram para a designação deste Estuário como Zona Ramsar (Zona Húmida de Importância Internacional) em 2006, e como IBA (Área Importante para as Aves e Biodiversidade) em 2005.

O Programa de monitorização que, além do CIBIO-InBIO, teve o apoio do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE), vai continuar a realizar as contagens no Estuário do Mondego, bem como em outros estuários nos próximos anos.

Ricardo Jorge Lopes pretende ainda promover a disponibilização dos dados nacionais, para que seja possível identificar as espécies que podem estar em declínio, e com isso contribuir para a gestão efectiva das populações locais e para a conservação das aves aquáticas.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Conheça aqui o Programa de Monitorização de Aves Aquáticas do Estuário de Mondego: “Mondego Estuary International Waterbird Census”

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.