Crias de lince-ibérico. Foto: Programa de Conservação Ex-situ

Já nasceram 136 linces no Centro de Reprodução português desta espécie ameaçada

Início

A 26 de Outubro cumpriram-se 11 anos de trabalho do Centro Nacional de Reprodução de Lince-Ibérico (CNRLI) para ajudar a travar a extinção desta espécie de felino.

O primeiro lince chegou ao CNRLI a 26 de Outubro de 2009. Foi a fêmea Azahar, vinda do Zoobotânico de Jerez de La Frontera. Durante esse ano de 2009 foram chegando os primeiros 15 linces reprodutores. Esta era uma solução de fim de linha para tentar evitar a extinção da espécie.

Crias de lince-ibérico. Foto: Programa de Conservação Ex-situ

O lince-ibérico (Lynx pardinus) tem tido uma história atribulada. No século XIX a população mundial da espécie estava estimada em cerca de 100.000 animais, distribuídos por Portugal e Espanha; mas no início do século XXI restavam menos de 100. Então, os dois países juntaram-se para recuperar habitats e reproduzir animais. O CNRLI é uma das peças deste quebra-cabeças conservacionista que ainda hoje não está resolvido.

Até Abril de 2020 já nasceram naquele Centro um total de 136 crias. Destas, 101 sobreviveram e 35 crias morreram antes de chegarem aos três meses, segundo o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). Assim, a taxa de sobrevivência é de 74%.

Em 2020 nasceram 14 linces no CNRLI, fruto do emparelhamento de cinco casais. Dos 14 linces, 12 sobreviveram.

Lince-ibérico, cria. Foto: Programa Ex-situ (arquivo)

“As crias que nascem em cada época reprodutora são libertadas nas diferentes áreas pré-selecionadas de reintrodução de lince, tanto em Portugal como em Espanha, em função da sua genética e de outras condicionantes”, explica o instituto.

Até à data foram reintroduzidos na natureza 75 animais nascidos no CRNL. A maioria (23) foram reintroduzidos em Castilha-La Mancha, Espanha; 21 foram libertados na Andaluzia (Espanha), 17 na Extremadura espanhola e 14 em Portugal, no Vale do Guadiana (Mértola e Serpa).

Onze linces nascidos em 2020 aguardam reintrodução no início de 2021.

Outras crias, que não estão aptas para viverem em liberdade, permanecem no Programa de reprodução para substituição de reprodutores, mantendo assim a população em cativeiro saudável e viável.

CNRLI em Silves. Foto: Joana Bourgard/Wilder

Este ano, uma cria será integrada no Programa de Conservação Ex Situ. “Esta cria junta-se assim aos oito linces anteriormente nascidos no CNRLI e integrados no programa de reprodução em cativeiro como reprodutores e os restantes, não podendo ser libertados por problemas genéticos (epiléticos ou criptorquídicos), nem incluídos no programa de reprodução, encontram-se à espera de serem colocados em Zoos ou em Parques Zoológicos de visitação, tendo em vista promover a sensibilização do público para esta causa”.

Uma história de conservação

No início deste século, o lince-ibérico atingiu em Portugal uma fase de pré-extinção.

“Os últimos vestígios de lince em território nacional foram detetados em 2001, em zona de fronteira, provavelmente de um lince dispersante de populações de Espanha. Antes disso, o último vestígio de lince comprovado em Portugal foi registado no início da década de 90 do século XX. É provável que Portugal tenha perdido as suas populações autossustentáveis durante a década de 80.”

No final do século XX, as últimas populações viáveis de lince ibérico limitavam-se à Andaluzia em Espanha, divididas por dois núcleos contendo cerca de 100 indivíduos no total. “Estas, devido à sua reduzida área geográfica e efetivos reduzidos, estavam em situação muito vulnerável a processos estocásticos (epidemias, fogos, etc.) que poderiam facilmente conduzir a espécie à extinção, a qual sofrera um declínio muito acentuado e se encontrava num vórtex de extinção.”

Lince-ibérico. Foto: Programa de Conservação Ex-Situ

Foi então estabelecido, em 1998, o arranque de um programa de reprodução em cativeiro como ferramenta prioritária para viabilizar a conservação da espécie, para que constituísse um seguro de vida face à possibilidade real da sua extinção no estado selvagem.

Este Programa de Conservação Ex Situ começou em Doñana, na Andaluzia, após o que se estendeu a Portugal e Extremadura.

O programa quer preparar linces – adequados do ponto de vista etológico, sanitário e genético – para a reintrodução em áreas de distribuição histórica da espécie.

O ICNF sublinha que, com a ajuda do Programa de Conservação Ex Situ, que forneceu já 278 animais para reintrodução desde 2011, foram criadas seis novas populações de lince ibérico na Península Ibérica.

Este feito ajudou a recuperar a espécie e permitiu que esta atingisse, em meados de 2020, a cifra de 894 animais na natureza na Península Ibérica, 140 dos quais em Portugal.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.