Jorge Nunes escreveu um livro para nos ajudar a descobrir o Portugal Natural

Jorge Nunes é professor, fotojornalista e escritor de natureza. Palmilha o país há 26 anos à procura de preciosidades biológicas. Agora publicou o livro “Descobrir Portugal Natural – Da selva urbana à natureza selvagem” que nos vai ajudar a fazer o mesmo.

WILDER: Para quem é este livro?

Jorge Nunes: O livro Descobrir Portugal Natural – Da selva urbana à natureza selvagem destina-se a qualquer pessoa, dos oito aos oitenta, que goste da natureza e que pretenda saber mais sobre o nosso vastíssimo património natural, que está recheado de preciosidades biológicas e de curiosidades que vale a pena descobrir.

W: O que o motivou a publicar esta obra?

Jorge Nunes: Desde há 26 anos que escrevo artigos e livros dedicados à divulgação do património natural português. Este livro é apenas mais um contributo para atingir esse objetivo pois, como sabemos, apenas valorizamos e conservamos o que conhecemos. Embora vivamos hoje num mundo onde o acesso à informação está banalizado – o Google sabe tudo –, possuímos ainda uma incipiente literacia científica e ambiental e um fraco (e deturpado!) conhecimento do nosso património natural. Testemunhos encontrados nos capítulos sobre o lobo‑ibérico e os cogumelos são bons exemplos disso.

W: O livro está organizado em 10 capítulos, cada um dedicado a um tema. Qual o critério das suas escolhas?

Jorge Nunes: Os temas foram cuidadosamente selecionados de modo a abrangerem um vasto leque de ambientes e seres vivos, o que permite dar a conhecer inúmeras curiosidades e segredos da natureza à nossa volta.

W: Qual acredita ser a maior utilidade deste livro para os leitores?

Jorge Nunes: A maior utilidade desta obra é possibilitar a descoberta da fauna e da flora que existe em Portugal desde a porta de casa (por exemplo, nos capítulos “A selva urbana” e os “Vigilantes do Ambiente”) até aos locais mais recônditos do país (nomeadamente, nos capítulos “Últimos uivos”, “Esculturas da Natureza” e “Majestosos herbívoros”), não esquecendo os animais e plantas exóticos (alguns deles invasores), que têm vindo a conquistar o território luso, pondo em causa a sobrevivência das espécies autóctones. Além disso, faz uma simbiose perfeita entre o texto e a imagem, permitindo um aprofundamento dos conhecimentos biológicos ao mesmo tempo que proporciona deleite visual com as sedutoras formas e cores da natureza. Por último, mas não menos importante, é um livro que pode ser lido no conforto do lar ou transportado para as atividades ao ar livre, servindo de mote para inúmeras e inesquecíveis descobertas.

W: Que “preciosidades biológicas”, como refere no livro, mais o fascinam em Portugal?

Jorge Nunes: Desde criança que me deixei enfeitiçar pelas cores e formas extraordinariamente belas que se escondem no mundo natural. Assim, consegui descobrir encanto e maravilha em todas as espécies animais e vegetais com que já me cruzei ao longo da vida, desde as mais abundantes às mais raras e preciosas. Todos os seres vivos, dos minúsculos insetos até aos imponentes mamíferos ou majestosas aves de rapina, passando pelo deslumbrante mundo vegetal, têm coisas interessantes para nos ensinar. Fui percebendo, com o passar do tempo, que todas as espécies têm o seu valor e que desempenham papeis essenciais na teia da Vida. Assim, é para mim impossível privilegiar apenas algumas. De certa forma, é desse enamoramento pessoal pelos animais e pelas plantas e da necessidade da sua conservação e implementação de modelos civilizacionais mais racionais, saudáveis e sustentáveis que trata este livro. Esta obra fala-nos de inúmeras preciosidades biológicas, onde se incluem espécies marcantes e emblemáticas, como o lobo-ibérico, mas também humildes organismos, como os cogumelos, os líquenes, os insetos, os aracnídeos, os anfíbios, os répteis, os peixes ou as orquídeas silvestres, que vale a pena conhecer e preservar.

W: Qual a melhor forma para as pessoas descobrirem este Portugal natural?

Jorge Nunes: A melhor forma é as pessoas porem pés ao caminho e irem para as áreas naturais, autonomamente ou inseridas em atividades organizadas pelo turismo de natureza, ver com os seus próprios olhos o vastíssimo espólio natural que possuímos. Apesar de sermos um país relativamente pequeno, temos uma enorme diversidade de habitats naturais que albergam uma notável riqueza fauno-florística que merece ser observada, investigada e preservada. Obviamente, para que isso aconteça, as pessoas precisam de estar sensibilizadas para a preciosidade dos nossos valores naturais e é exatamente aí que este livro constitui uma mais-valia: alerta-nos para ambientes e seres vivos quase desconhecidos pela generalidade das pessoas.

W: O que tem mudado, para melhor e para pior, neste Portugal natural desde que começou a fotografar e a escrever sobre natureza, há cerca de 20 anos?

Jorge Nunes: Nestes últimos vinte e seis anos, assisti a grandes mudanças no nosso Portugal natural, tanto ao nível do (des)ordenamento do território como do acesso ao conhecimento e à mudança de mentalidades. Não tenho dúvidas que, hoje, conhecemos melhor do que nunca os nossos valores naturais, sobretudo no seio da Academia, em virtude dos inúmeros estudos e investigações que se têm realizado por todo o país, nas últimas décadas. Como seria de esperar, o aumento do conhecimento tem contribuído progressivamente para uma alteração de mentalidades. No entanto, face ao acentuar de problemas ambientais, como o aquecimento global ou a extinção de espécies, essa mudança tem-se revelado demasiado lenta face ao perigo que enfrentamos. No que respeita ao ordenamento do território, os maiores problemas terão sido a urbanização desregulada e de costas voltadas para a natureza e a destruição das nossas florestas autóctones e de muitos dos nossos habitats naturais, que foram progressivamente substituídos por monoculturas de pinheiro-bravo e de eucalipto, assistindo-se a uma imparável eucaliptização do país. Este fenómeno transformou Portugal (infelizmente) no campeão mundial do eucalipto. Além de terem contribuído para a delapidação da nossa biodiversidade, as mudanças ao nível da floresta acabaram por resultar em graves problemas ambientais, sociais e económicos, que ficaram à vista de todos nos fatídicos incêndios de 2017. Como se não bastasse, quase sem darmos conta, centenas de outras espécies vegetais estrangeiras, como as mimosas e as acácias, têm vindo a conquistar o país, com efeitos muito nefastos para a biodiversidade e a economia. Na atualidade, é quase impossível olhar para uma paisagem portuguesa sem lobrigar uma espécie exótica ou, pior ainda, um resíduo de plástico. Assim, por muito que já tenhamos feito, ainda temos um longo caminho a percorrer.


Saiba mais sobre o autor

W: O que faz?

Jorge Nunes: Durante estes últimos anos, tenho conjugado a minha profissão de professor com a de fotojornalista/articulista, produzindo centenas de artigos e diversas obras, publicadas com a chancela de diferentes editoras, dedicadas à divulgação do património natural português.

W: Onde e quando começou?

Jorge Nunes: A paixão pela natureza começou numa pequena aldeia da Beira Baixa, onde desfrutei uma meninice campestre, que me permitiu um contacto muito próximo com animais e plantas que muitas das nossas crianças urbanas só conhecem através dos documentários de vida selvagem. Logo que me tornei mais autónomo, comecei a palmilhar o território português, de máquina fotográfica ao pescoço e bloco de notas na mão, para observar e registar novos ambientes e organismos. Nos primeiros anos da licenciatura em Biologia, constatei que existia uma escassa literacia científica e ambiental da generalidade da população, por isso, decidi arregaçar as mangas e dar um contributo enérgico para a divulgação do património natural português. Foi assim que os meus registos, tanto escritos como visuais, começaram a sair das gavetas e das pastas do computador e a converterem‑se, progressivamente, em reportagens, artigos e livros.

W: Como aprendeu a fazer o seu trabalho?

Jorge Nunes: A formação na área da biologia dotou-me dos conhecimentos científicos e do rigor linguístico que se exigem a quem pretende comunicar ciência. A experiência de campo e o autodidatismo, com inúmeras horas de estudo e investigação sobre os vários temas que trabalhei, foram igualmente importantes, nomeadamente no que respeita à fotografia de natureza, onde fui exclusivamente autodidata. 

W: Quando começou, o que pensava que queria fazer?

Jorge Nunes: Exatamente aquilo que fiz: converter as minhas vivências, registos e imagens em reportagens, artigos e livros.

W: O que ainda lhe falta descobrir?

Jorge Nunes: Muita coisa. Todos os dias, me surpreendo com lugares e organismos que desconheço. Este jardim à beira-mar plantado tem inúmeros recantos encantados que vale a pena descobrir.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.