Lontra gigante terá sido predador de topo há 6 milhões de anos

Uma lontra gigante já extinta, que viveu na China há seis milhões de anos, tinha uma mandíbula surpreendentemente forte. Um estudo científico sugere que esta espécie, do tamanho de um lobo, seria um predador de topo.

 

O estudo, publicado a 9 de Novembro na revista Scientific Reports, analisou as mandíbulas da lontra com mais de 50 quilos de peso, da espécie Siamogale melilutra. Os investigadores acreditam que a investigação permitirá conhecer melhor o nicho ecológico ocupado por esta criatura nas zonas húmidas do Sudoeste da China há seis milhões de anos.

 

Ilustração: Mauricio Anton

 

“Começámos o nosso estudo com a ideia de que esta lontra era apenas uma versão maior da lontra marinha e que apenas seria capaz de mastigar coisas maiores”, disse, em comunicado,  Z. Jack Tseng, coordenador do estudo e investigador associado do Museu Americano de História Natural e do Museu de História Natural de Los Angeles. “Mas não foi isso que descobrimos.”

Quando os cientistas usaram computadores para simular a força de uma dentada desta lontra, concluíram que o animal tinha mandíbulas muito mais fortes do que esperavam. As dentadas desta lontra eram surpreendentemente fortes, mesmo para o seu tamanho.

“Não sabemos ao certo, mas pensamos que esta lontra era mais como um predador de topo do que as lontras que existem hoje”, acrescentou Tseng. “As nossas conclusões sugerem que a Siamogale poderia esmagar presas muito mais duras e maiores do que qualquer lontra viva.”

As lontras dos nossos dias têm uma dieta variada. De acordo com a espécie, há lontras que se alimentam de plantas, roedores, peixes, caranguejos e moluscos. Com base neste novo estudo, as mandíbulas da Siamogale melilutra seriam fortes o suficiente para esmagar as conchas de grandes moluscos ou os ossos de aves e pequenos mamíferos. Ainda assim, não se sabe ao certo o que comia esta lontra.

Para conhecer melhor a espécie, Tseng e os seus colegas compararam esta criatura pré-história às lontras que existem hoje. Para isso, criaram modelos 3D que testam a resistência das mandíbulas de 10 das 13 espécies de lontras conhecidas dos nossos dias. Uma das lontras foi deixada fora do estudo porque, sendo muito rara, os investigadores não conseguiram encontrar ossos para os modelos e as outras duas foram excluídas porque eram muito similares às outras espécies.

Depois, criaram um modelo para a Siamogale melilutra, usando como guia os fósseis de um crânio esmagado, reconstruído digitalmente.

 

Modelos dos crânios da lontra-comum (Lutra lutra), à esquerda, e da lontra gigante. Imagem: Z. Jack Tseng

 

Segundo esta experiência, as lontras mais pequenas têm mandíbulas mais fortes. Mas a lontra gigante era uma excepção. As suas mandíbulas eram seis vezes mais fortes do que o esperado. Esta força, a par da dimensão do animal, teria feito dele um formidável caçador.

“Na altura em que a lontra viveu, a área onde foram encontrados os seus fósseis era um lago pouco profundo, rodeado de floresta sempre verde”, disse Denise F. Su, do Museu de História Natural de Cleveland e uma das líderes do projecto Shuitangba que descobriu os fósseis da lontra. Esta descoberta foi anunciada em Janeiro deste ano. “Havia uma diversa fauna aquática em Shuitangba, incluindo peixes, caranguejos, moluscos, tartarugas e sapos, bem como muitas espécies diferentes de aves aquáticas, todos presas potenciais para a Siamogale melilutra.”

Neste ambiente húmido e florestal, a força das mandíbulas da lontra teria sido uma mais-valia em relação aos predadores que não conseguiam caçar em água ou esmagar as conchas de presas aquáticas.

“Nos pântanos pouco profundos do Sul da China é possível que a abundância de grandes moluscos tenha levado estas lontras gigantes a adquirir raras características, incluindo os seus dentes e mandíbulas robustas”, comentou Xiaoming Wang, curador de paleontologia de vertebrados no Museu de História Natural de Los Angeles.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.