Veado. Foto: Pixabay

Massacre da Torre Bela: ONG pedem revisão da Lei da Caça

O abate de 540 veados, gamos e javalis na Herdade da Torre Bela, na Azambuja, há 10 dias, foi um “episódio perturbador” que, na opinião de quatro organizações de conservação da natureza, justifica a revisão da Lei da Caça.

O abate de 540 animais por apenas 16 caçadores numa montaria a 17 e 18 de Dezembro chocou o país.

O Ministério do Ambiente criticou o massacre e pediu a responsabilização e penalização e o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) já apresentou uma queixa ao Ministério Público.

As organizações de conservação da natureza Liga para a Protecção da Natureza (LPN), Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza, Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (Spea) e Associação Natureza Portugal em associação com WWF (ANP/WWF) pediram, a 26 de Dezembro, uma melhoria da Lei da Caça. Tudo para “travar novos crimes contra a Natureza”, segundo um comunicado enviado à Wilder.

Para estas três organizações, a actual Lei da Caça “contém insuficiências graves”. Por exemplo, notam, “não explicita sequer quantos animais podem ser mortos por cada caçador numa montaria”.

Outros problemas graves da legislação incluem “a permissão de caçar espécies ameaçadas, como a rola, e a utilização de munições de chumbo, metal altamente tóxico para o Homem e outros animais e que é assim disseminado pelo ambiente”.

“Estes e outros problemas precisam de ser corrigidos na lei e as penalizações previstas têm de ser suficientemente pesadas para funcionarem como dissuasores.”

Falta de meios e de fiscalização

As organizações alertam que o que aconteceu na Azambuja ilustra “um grave problema já há muito conhecido – a incapacidade de fazer respeitar a lei por falta de recursos humanos e materiais para o seu acompanhamento e fiscalização”.

Tanto o ICNF como o Serviço de Proteção da Natureza e Ambiente (SEPNA-GNR) “têm recursos ridiculamente pequenos para a tarefa a seu cargo. É urgente capacitar estas instituições”.

“Se a montaria na Torre Bela tivesse sido acompanhada, como deveria ter acontecido independentemente de isso ser ou não obrigatório por lei, o incidente não teria ocorrido. E com uma fiscalização eficaz haveria, por exemplo, muito menos casos de envenenamentos e abate intencional de espécies protegidas.”

Estas quatro organizações entendem que, “independentemente do debate ético sobre a caça, é um facto que esta atividade pode ter um impacto positivo na conservação dos ecossistemas e das espécies”. E dão como exemplo a conservação do lince-ibérico em Portugal.

“Mas para que os bons exemplos, e não os maus, prevaleçam, é fundamental resolver os problemas. A sua solução é do maior interesse tanto para a conservação da Natureza, como para a atividade cinegética.”

Apesar de reconhecerem avanços nas últimas décadas, as ONG defendem ser necessário admitir que “existem ainda graves problemas no comportamento e formação de muitos caçadores e agentes da indústria cinegética. Embora neste caso os caçadores não fossem portugueses, mas sim espanhóis, é impossível empurrar toda a culpa para o outro lado da fronteira quando continuam a ser cometidos graves crimes contra a Natureza no nosso território”.

As organizações apelam ao ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, “para que concretize rapidamente não só a sua decisão de rever a Lei da Caça, mas também de solucionar todos os problemas paralelos, como a quase inexistência de fiscalização”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.