Milhafre-real. Foto: Hansueli Krapf/Wiki Commons

Milhafre-real voou mais de 1.500 km para passar Inverno em Portugal

Um milhafre-real com anilha e marcas alares foi observado no mês passado no distrito de Bragança, a uma distância de mais de 1500 quilómetros da cidade francesa onde nasceu em 2017.

 

Segundo a associação Palombar – Conservação da Natureza e do Património Rural, a presença deste milhafre foi registada por uma câmara de armadilhagem fotográfica na aldeia de Uva, concelho de Vimioso, a 17 de Fevereiro. A ave foi ainda observada a sobrevoar a aldeia noutros dias do último mês.

Os responsáveis desta ONG (organização não governamental) com sede em Vimioso acreditam que o milhafre-real percorreu uma tão grande distância porque no Nordeste Transmontano “encontra condições mais favoráveis de alimentação e clima durante esta estação do ano”, avançam em comunicado.

Foi através dos códigos da anilha e das marcas alares que descobriram que o milhafre tinha sido marcado há quase três anos, a 10 de Junho de 2017, em Foug, Nordeste de França, perto da fronteira com a Alemanha. Sabe-se também que faz ninho em Villeroy-sur-Méholle, a cerca de 17 quilómetros do local onde nasceu.

 

Milhafre-real, com as marcas alares visíveis, registado pela câmara de armadilhagem fotográfica na aldeia de Uva. Foto: Palombar

 

Os milhafres-reais (Milvus milvus) são aves de rapina pouco abundantes em Portugal. Aqueles que permanecem no país todo o ano e aqui se reproduzem podem ser vistos sobretudo junto à fronteira com Espanha, nos distritos de Bragança, Guarda, Castelo Branco, Portalegre, Évora e Beja, explica a Palombar. Esta população é considerada Criticamente em Perigo, segundo o Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal (2005).

Já a população invernante de milhafres reais, que passam apenas os meses mais frios em território nacional, “ocorre nestas mesmas áreas mas também de uma forma dispersa por todo o sul do país.” Estes têm um estatuto Vulnerável, mais favorável do que os primeiros, mas estão também em risco.

“Todos os anos, grande parte dos milhafres-reais originários da Europa Central migram até à Península Ibérica para passar o Inverno, visto que é nesse território que encontra melhores condições de disponibilidade de alimento e climáticas”, nota a ONG. “A invernada da espécie na Península Ibérica é considerada importante para a sua conservação”, sublinha.

O último censo europeu do milhafre-real, que se realizou entre 1 de Janeiro e 2 de Fevereiro, teve como resultado cerca de 108 milhafres-reais contabilizados no distrito de Bragança, indica também a Palombar. Foram ainda identificados três dormitórios da espécie.

 

No ninho, cuidados partilhados 

Esta é uma espécie-alvo do projecto ConnectNatura, coordenado pela Palombar, e é também beneficiada pelos projectos Sentinelas e Life Rupis.

Os milhafres-reais são monogâmicos, pois mantêm sempre o mesmo parceiro, e nidificam em árvores, sobretudo as de grande porte. São aves que preferem viver em zonas florestais associadas a terrenos agrícolas ou com plantações de árvores, ou ainda ligados à pastorícia.

Normalmente colocam um a três ovos por ninho e os dois membros do casal cuidam das crias. Podem ocupar ninhos de outras aves de rapina ou reutilizar ninhos de anos anteriores, indica a associação.

Por outro lado, alimentam-se tanto de cadáveres de animais como das presas vivas que caçam, em especial pequenos animais silvestres como ratinhos, aves, peixes e também invertebrados. Restos e desperdícios urbanos são também aproveitados.

Já as ameaças em território português são várias, “como o abate a tiro, o uso de veneno e a redução da disponibilidade alimentar, entre outras.”

 

 

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.