Misterioso gliptodonte extinto é afinal um tatu gigante

Os gliptodontes, mamíferos gigantes com carapaças e caudas espinhosas que se extinguiram no continente americano no final da última Idade do Gelo, pertencem à mesma família dos tatus, segundo uma nova investigação genética.

 

O trabalho de uma equipa internacional de cientistas, publicado esta semana na revista Current Biology, confirma que os gliptodontes terão surgido há menos de 35 milhões de anos. Os seus antecessores pertencem a uma linhagem que evoluiu directamente para uma das famílias modernas de tatus.

Os cientistas consideram ainda mais surpreendente o facto de que os familiares mais próximos dos gliptodontes incluem não só o tatu-gigante (Priodontes maximus) – que pode pesar até 11 quilos – mas também o pichiciego-menor (Chlamyphorus truncatus), o tatu mais pequeno do mundo, que pesa menos de 50 gramas.

Os fósseis de gliptodontes começaram a ser descobertos no início do século XIX. Por exemplo, Charles Darwin colectou partes de fósseis na expedição do Beagle à América do Sul ente 1832 e 1833.

Mas ninguém sabia a que mamífero pertenciam. Mais tarde foi aceite que os gliptodontes deviam estar relacionados de alguma forma aos tatus, o único outro animal do Novo Mundo com uma carapaça protetora. Ainda assim, devido às muitas diferenças físicas entre estes dois grupos, a maioria dos paleontólogos acreditou que estes se deviam ter separado muito cedo na sua história evolutiva.

E tudo poderia ter ficado assim se dois cientistas de filogenética molecular não tivessem começado a investigar. Frédéric Delsuc do Centro Nacional francês para a Investigação Científica (CNRS) na Universidade de Montpellier e Hendrik Poinar da Universidade McMaster (Canadá) contactaram Ross MacPhee, curador do Departamento de Mamalogia do Museu de História Natural Americano para lhe pedir material genético.

Conseguiram trabalhar apenas numa amostra, um fragmento de carapaça de uma espécie indeterminada de Doedicurus, um gliptodonte que viveu há 10.000 anos.

 

Fóssil de gliptodonte em exposição no Museu de História Natural Americano. Foto: D. Finnin/AMNH
Fóssil de gliptodonte em exposição no Museu de História Natural Americano. Foto: D. Finnin/AMNH

 

“O ADN antigo tem o potencial para ajudar a resolver várias questões evolutivas, mas muitas vezes é extremamente difícil obter ADN endógeno, ou seja, ADN que pertence mesmo ao animal e não a nenhum contaminante”, explicou Poinar, em comunicado.

A equipa de investigadores concluiu que os gliptodontes tiveram origem há apenas 35 milhões de anos. “Taxonomicamente, eles deveriam ser considerados não mais do que outra sub-família de tatus, à qual chamamos Gliptodontinae”, acrescentou.

Os investigadores salientam ainda que os gliptodontes foram um grupo com muito sucesso na maior parte da sua história e a causa do seu desaparecimento continua em aberto. “Viviam em habitats tão distintos como os prados ou as florestas densas, desde a Patagónia ao Sul dos Estados Unidos”, disse MacPhee. “Algumas espécies persistiram ao desaparecimento dos mamutes e dos tigres-dentes-de-sabre”, acrescentou, lembrando que a causa das extinções da megafauna do Novo Mundo continua por descobrir.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.