Nova espécie de macaco descoberta no “arco da desflorestação” na Amazónia

Uma nova espécie de macaco foi descoberta para a Ciência no estado do Pará, Brasil. Apesar de entusiasmados, os investigadores estão preocupados com o futuro desta espécie.

Ao contrário da maioria das espécies de saguis da Amazónia, o Sagui-dos-Munduruku (Mico munduruku, como referência aos ameríndios Munduruku que vivem na região) tem a cauda branca. Foi isto que fez Rodrigo Costa Araújo, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazónia (Inpa), suspeitar estar perante uma nova espécie.

Sagui-Dos-Munduruku. Ilustração de Stephen Nash

Actualmente são conhecidas 22 espécies de saguis, macacos nativos da América do Sul com cerca de 20 centímetros de comprimento. A maioria tem a cauda preta ou anelada.

O primeiro encontro com estes pequenos macacos aconteceu em 2015 numa floresta entre os rios Tapajós e Jamanxim, no Sul do estado do Pará. 

“Depois de sete dias a navegar no rio Tapajós chegámos ao local onde registei a nova espécie”, disse Rodrigo Costa Araújo num comunicado da organização Fauna & Flora International. “A primeira vez que vi os saguis, usando binóculos, fiquei muito, muito entusiasmado porque vi a cauda branca, o que é uma característica muito pouco comum nos primatas neotropicais.”

Desde então, Rodrigo Costa Araújo fez mais nove expedições à floresta – entre Maio de 2015 e Abril de 2018 – e visitas a museus de História Natural para comparar a pelagem de vários primatas. Além disso foram feitas análises genéticas e estudos sobre a distribuição geográfica da espécie. Tudo para descobrir se estes saguis eram, ou não, uma espécie nova. 

Depois de análises genéticas foi confirmado que estes animais pertencem a uma espécie nova. Esta foi descrita num artigo científico publicado no final de Julho na revista PeerJ

Até ao momento não havia registos de saguis na região, uma área estimada em cerca de 55.000 quilómetros quadrados. “Era um buraco enorme na distribuição do género” Mico (do qual se conheciam até agora 14 espécies), disse Rodrigo Costa Araújo.

A região onde o Mico murunduku foi descoberto é “uma das principais frentes de destruição da floresta dentro do arco da desflorestação, uma região caracterizada pela intensa e desordenada conversão da floresta em zonas de pastagens para gado, terrenos agrícolas ou povoações”, escrevem os autores no artigo científico.

Os investigadores alertam que as ameaças ao habitat do Mico munduruku estão a aumentar, nomeadamente por causa da construção de estradas e centrais hidroeléctricas.

Na semana passada foi anunciado que em Julho deste ano, a desflorestação na Amazónia registou um aumento de 278% em comparação com Julho de 2018, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

“É preocupante que, assim que descobrimos uma espécie nova, já precisamos de nos preocupar com a sua sobrevivência”, comentou o biólogo ao jornal O Globo.

O trabalho de Rodrigo Costa Araújo foi apoiado pelo Conservation Leadership Programme, uma parceria entre a organização Fauna & Flora International, a Birdlife e a Wildlife Conservation Society (WCS).

“Esta descoberta demonstra o quanto ainda há para aprender sobre os primatas da Amazónia e chama a atenção para as ameaças à floresta tropical num momento crucial para o seu futuro”, comentou Stuart Paterson, da Fauna & Flora International, em comunicado.

Mas ainda há muito trabalho pela frente para saber mais sobre o Sagui-dos-Munduruku. “Os próximos passos são descobrir quantos saguis-dos-Munduruku existem, avaliar o seu estatuto de conservação e recolher dados sobre comportamentos e dieta da espécie”, adiantou Rodrigo Costa Araújo ao O Globo.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.