Projecto internacional vai trabalhar para a recuperação do maior abutre da Europa em Portugal

Abutre-preto. Foto: Juan Lacruz/Wiki Commons

Uma das metas é duplicar a população reprodutora do abutre-preto em território nacional até 2027, para um total de 80 casais.

Aumentar de quatro para cinco o número de colónias portuguesas desta espécie de ave necrófaga, considerada essencial para a manutenção de ecossistemas saudáveis, é outro dos objectivos do novo “LIFE Aegypius return – consolidação e expansão da população de abutre-preto em Portugal e no oeste de Espanha”, explica uma informação da associação Palombar, um dos parceiros desta iniciativa.

Durante cerca de 40 anos não houve reprodução de abutres-pretos (Aegypius monachus) em território português, onde só em 2010 a espécie voltou a nidificar, no Parque Natural do Tejo Internacional. É esta área protegida no distrito de Castelo Branco que alberga a maior colónia nacional desta espécie, com 31 casais.

São conhecidas hoje outras três colónias de abutre-preto, todas elas próximas da fronteira com Espanha: uma no Alentejo, onde vive a segunda maior colónia e onde recentemente foram marcadas três crias, na Herdade da Contenda; outra colónia mais recente, na Serra da Malcata; uma terceira no Parque Natural do Douro Internacional.

Populações muito frágeis

O problema é que, tanto em Portugal como do outro lado da fronteira, as populações desta grande ave “apresentam-se hoje muito frágeis, com baixa produtividade e ameaçadas por vários factores”, acrescenta a LPN – Liga para a Protecção da Natureza, outro dos parceiros do projecto. Entre as muitas ameaças estão os fogos florestais, o uso ilegal de venenos, pouca disponibilidade de alimentos, uso de fármacos veterinários como o diclofenaco, perturbação humana na época de reprodução e electrocussão em linhas eléctricas.

Abutre-preto. Foto: Francesco Veronesi / Wiki Commons

Estes problemas são ainda mais preocupantes porque cada casal de abutre-preto tem apenas uma cria por ano. E muitas das pequenas aves não chegam a sobreviver para além dos primeiros meses, devido precisamente a ameaças como a falta de alimento, a perturbação humana e a predação.

Outra das metas do LIFE Aegypius return é assim aumentar o sucesso reprodutor em Portugal, que mede o número de crias voadoras por cada ovo posto. Hoje, este indicador é considerado “muito baixo para uma população viável” – é de apenas 0,38 – e a meta é aumentá-lo para 0,5 – ou seja, uma cria de abutre-preto sobrevivente por cada dois ovos que forem postos.

Se forem alcançadas até ao fim do projecto, todas estas metas vão ajudar a que seja alcançado um dos grandes objectivos: o abutre-preto deixar de ser considerado como Criticamente em Perigo em Portugal – como foi classificado em 2005 pelo Livro Vermelho dos Vertebrados – descendo um degrau no risco de extinção, para o estatuto Em Perigo.

Mais áreas de alimentação sem vedações e munições sem chumbo

Tendo em vista a recolonização natural da espécie, segundo a LPN, estão previstas acções de gestão do habitat “para prevenir os incêndios florestais nas actuais colónias e a melhoria da disponibilidade de alimento através do estabelecimento e integração de novas áreas de alimentação não vedadas em Portugal”.

A transição para munições sem chumbo em várias propriedades de caça é outra das medidas, de forma a reduzir os episódios de intoxicação quando estas aves se alimentam de presas que foram caçadas. Planeada está também a “redução significativa da perturbação ao redor das colónias”, acrescenta esta organização não governamental (ONG).

O novo projecto é coordenado pela Vulture Conservation Foundation, uma organização europeia dedicada à conservação dos abutres, e vai ter um custo total de mais de 3,6 milhões de euros, financiados por Bruxelas em 75%, através do programa LIFE.

Entre os vários parceiros, além da Palombar e da LPN, contam-se outras cinco organizações portuguesas: a Herdade da Contenda, empresa municipal gerida pela autarquia de Moura; SPEA – Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves; Associação Transumância e Natureza; GNR; Associação Nacional de Proprietários Rurais, Gestão Cinegética e Biodiversidade. Do lado espanhol, o projecto integra a ONG Fundación Naturaleza y Hombre.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.