Plataforma Água Sustentável pede mais microrewilding urbano e reflorestação e menos barragens e transvases

Telhado verde. Foto: wasi1370/Pixabay

O problema da falta de água do país poderá ser resolvido com 14 medidas, entre elas o microrewilding urbano – fileiras de jardins e vegetação em telhados e paredes – e a reflorestação com espécies autóctones, avançou hoje a Plataforma Água Sustentável. As ONGA criticam barragens, transvases e a dessalinização.

A escassez hídrica no país, em especial no Algarve, tem estado no centro das preocupações da Plataforma Água Sustentável, iniciativa criada em Novembro de 2020 e que reúne 14 organizações não governamentais.

No final de Abril, “verificou-se um aumento significativo da área em seca meteorológica, que já abrange quase todo o território, assim como da sua intensidade”, segundo o Índice PDSI (Palmer Drought Severity Index). Este índice tem em conta a precipitação, temperatura do ar e capacidade de água disponível no solo e permite detectar a ocorrência de períodos de seca classificando-os em termos de intensidade (fraca, moderada, severa e extrema).

Assim, no final de Abril Portugal tinha 33,2% do território em seca moderada, 22% em seca fraca, 19,9% em seca severa e 14,1% em seca extrema. Apenas 10,8% do território tinha situação considerada normal. Os distritos de Setúbal, Évora, Beja e Faro são os mais afectados pela seca severa a extrema.

Para enfrentar o problema, a Plataforma acredita que o país não precisa de unidades dessalinizadoras, de barragens ou de transvases, propostas oficiais.

“O Estado (…) tem sugerido a construção de novas barragens e a solução ‘Captação de Água no Guadiana”, lembra a plataforma. Mas estas medidas “têm fortes impactos, entre eles a diminuição do caudal dos rios, com impactos no local de captação e nos ecossistemas a jusante”. Recorda também que “o aumento da temperatura/evaporação e diminuição da pluviosidade tornará o volume de água a armazenar cada vez menor”.

Além disso, a plataforma discorda o estudo “Regadio 2030” que propôs “que se alargue a área de regadio no Algarve e Alentejo”. “Como se explica este alargamento perante a escassez de água? Qual é a estratégia a curto, médio e longo prazo?”.

Antes precisa de medidas que dêem “resposta à escassez hídrica” e que nos ajudem a “caminhar no sentido da sustentabilidade dos nossos recursos hídricos”, defende em comunicado enviado hoje à Wilder.

Entre as propostas que considera “cruciais “prioritárias e estruturantes” estão a conservação do solo – para optimizar a retenção da água da chuva -; a reflorestação com espécies autóctones, diversificadas e resilientes; o restauro de linhas de água; a captação e armazenamento de águas pluviais nos edifícios e a reutilização de águas cinzentas.

As suas propostas incluem também a substituição dos relvados nas cidades por prados de sequeiro, a plantação de árvores ou arbustos da flora local, menos exigentes em água, e a promoção do microrewilding urbano. Ou seja, “pensar cada superfície como potencial hospedeiro de vegetação e formar corredores de habitat (colocar vegetação nos telhados, em paredes, fileiras de jardins)”.

A utilização de águas residuais tratadas em campos de golfe ou rega de espaços verdes; a reabilitação das redes coletoras de águas residuais urbanas e pluviais para evitar perdas; o licenciamento e fiscalização de captações de água subterrâneas e superficiais; e a adequação das culturas agrícolas à água disponível (regulamentando a proliferação de monoculturas) são outras das propostas desta Plataforma.

“A resolução da situação actual não é simples, pois serão necessárias medidas de curto prazo de cariz urgente e medidas de longo prazo mas não será encontrada com grandes obras de construção civil que aumentam a pegada ecológica agravando, consequentemente, o consumo de água, a desflorestação e a poluição do mar o que, por sua vez, desequilibra ainda mais o clima”, conclui a Plataforma.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.