Projecto Polinizadores de Portugal já tem mais de 3.000 espécies identificadas

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O projecto lançado há um ano para saber quais os insectos polinizadores de Portugal já tem 3.012 espécies identificadas, graças a quase 2.500 observadores. Só registos são mais de 50.000, revelou à Wilder Sónia Ferreira, a coordenadora da iniciativa de Ciência Cidadã.

Borboletas, abelhas, escaravelhos, aranhas, abelhões, joaninhas, percevejos, moscas, vespas, formigas e cigarrinhas são apenas uma amostra dos animais polinizadores de Portugal. Todos têm um papel crucial, silencioso e longe dos holofotes, que desempenham diariamente.

uma borboleta malhadinha pousada numa folha
Borboleta malhadinha (Pararge aegeria). Foto: Charlesjsharp/Wiki Commons

Em todo o mundo, os polinizadores enfrentam cada vez maiores desafios. Por isso, precisam da nossa ajuda. Mas primeiro é imperativo saber quais são, onde estão e quantos são.

Para resolver esta lacuna, foi lançado há um ano o Polinizadores de Portugal, projecto que pede a todas as pessoas para procurarem polinizadores, para os fotografarem e submeterem as suas observações na plataforma portuguesa de Ciência Cidadã Biodiversity4All.

E tem sido um sucesso, apesar, ou por causa, da pandemia.

“Alcançámos um número muito elevado de registos”, disse à Wilder Sónia Ferreira, investigadora do CIBIO-InBIO e coordenadora do projecto. “Desde Janeiro de 2020 reunimos mais de 50.000 registos de polinizadores de Portugal, mais do que em todos os anos anteriores da existência da plataforma que à data de 31 de Dezembro de 2019 contava com pouco menos de 46.500 registos.”

Syritta pipiens. Foto: Rui Andrade

Sónia Ferreira suspeita que “a pandemia teve alguma influência em criar um contexto de procura de actividades de contacto com a natureza de forma isolada ou em pequenos grupos”. Outro factor que ajuda é a “simplicidade com que cada registo é feito e a identificação é atribuída e validada”.

Até 19 de Maio, a lista de polinizadores tinha 3.015 espécies diferentes, observadas por 2.434 observadores, espalhados um pouco por todo o país e incluindo ambos os arquipélagos.

A borboleta malhadinha (Pararge aegeria) é a espécie mais observada, com 1.171 observações. É seguida pela abelha-do-mel (Apis mellifera), com 780 observações e pelo jaquetão-das-flores-mediterrânico, também conhecido como escaravelho-das-flores (Oxythyrea funesta). A lista das cinco espécies mais observadas fica completa com a borboleta-da-couve (Pieris brassicae), com 505 observações, e com a borboleta almirante-vermelho (Vanessa atalanta), com 494 observações.

“Há um conjunto de fatores que fazem com que estas espécies estejam no Top 5”, explica Sónia Ferreira. “As três borboletas podem ser observadas praticamente em qualquer altura do ano, o que aumenta muito a sua probabilidade de registo, seja por ocorrerem durante mais tempo, seja por ocorrerem durante alturas do ano em que existem muito menos espécies para registar. A abelha-do-mel é uma espécie domesticada e amplamente distribuída no nosso país, onde produz entre 10.000 a 15.000 toneladas de mel por ano. É, sem dúvida, dos polinizadores mais abundantes e que pode ser observado (também) todo o ano. Finalmente o jaquetão-das-flores-mediterrânico, é o unico do ranking cujos adultos não estão presentes durante todo o ano, sendo quase inexistentes de Agosto a Janeiro. No entanto é uma espécie bastante comum, cuja presença em flores é fácil de detectar dado o seu tamanho e particularmente pouco ativa, tornando-se assim muito fácil de fotografar.”

Curiosamente, salienta a investigadora, “ainda existem vastas áreas de Portugal sem um único registo de qualquer de uma destas espécies, o que significa que ainda há margem para muito crescimento da utilização desta plataforma!”

Episyrphus balteatus. Foto: Rui Andrade

Por enquanto, ainda não se sabe bem quais as zonas do país mais ricas em polinizadores. Sónia Ferreira suspeita que as essas zonas podem (ainda) não ser as que têm atualmente mais registos na plataforma. “A grande maioria dos registos são feitos em áreas urbanas e especialmente ao longo da faixa litoral do país. Os distritos de Lisboa (9.050), Faro (7.100), Setúbal (6.390) e do Porto (4.950), são assim, sem grande surpresa os que mais registos possuem atualmente.”

Estes dados revelam um dado muito importante. “Este resultado salienta a elevada importância das áreas urbanas para a conservação da natureza e em particular da sua importância para os polinizadores.”

As alturas do ano em que os polinizadores estão mais activos são, sem grande surpresa, os meses da Primavera. “Os meses de Inverno são os meses com menos actividade registada”.

Para o futuro, a coordenadora do projecto explica que a grande prioridade será conseguir mais registos na plataforma Biodiversity4All. “Apenas com a participação de mais cidadãos podemos aumentar a cobertura nacional e temporal dos registos e obter informação mais detalhada sobre as espécies com presença em Portugal”, explica.

Joaninha-das-sete-pintas. Foto: PollyDot/Pixabay

Outra meta a alcançar será ajudar as pessoas a compreender que “os animais prejudiciais são efectivamente uma pequena porção da biodiversidade destes organismos” e que é muito importante “garantir a conservação da grande maioria das espécies, quer em meio urbano, quer em meio rural e especialmente em contextos agroflorestais”.

Uma das mais-valias desta plataforma é ajudar a dar nomes aos “bichos” que as pessoas encontram e não conhecem. “A plataforma é também particularmente expedita e útil para informar quem regista a identidade dos animais, plantas ou fungos registados. Assim, os chamados “bichos” passam a “escaravelhos”, “formigas”, “percevejos” entre outros, muitos dos quais com direito a nome da espécie, permitindo que os cidadãos compreendam melhor os seres que os rodeiam e possam procurar informação detalhada sobre a sua biologia e papel ecológico.”

Quanto a Sónia Ferreira, há uns polinizadores preferidos. “Os meus polinizadores favoritos são as moscas das flores (moscas da família Syrphidae). Muitas vezes confundidas com abelhas, estas moscas têm mimetismos extraordinários, assemelhando-se com abelhas e vespas. Desempenham não só o papel de polinizadores super relevantes, como são predadoras e/ou detritívoras na sua forma larvar, regulando os ecossistemas e auxiliando os ciclos dos nutrientes. Pena é que a sua importância seja tantas vezes ignorada.”

Talvez com este projecto haja mais pessoas a reparar nestes fantásticos animais.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.