Águia-de-Bonelli adulta. Foto: José Jambas

Redes de protecção usadas em pisciculturas estão a matar aves ameaçadas

Uma águia-de-Bonelli foi encontrada morta a 7 Fevereiro numa rede de protecção numa piscicultura, na Figueira da Foz, juntamente com mais de uma dezena de outros cadáveres de aves, mas não é caso único. Foi agora formado um grupo de trabalho na busca de soluções.

 

A águia-de-Bonelli, também conhecida por águia-perdigueira, é em Portugal uma espécie Em Perigo de extinção.

 

Foto: José Jambas

 

Neste caso, a águia encontrada morta tinha sido marcada com um emissor GPS e estava a ser seguida no âmbito de um projecto de conservação, o que permitiu a um técnico português dessa equipa, José Jambas, encontrá-la e recolher o cadáver, apercebendo-se assim das causas da morte. A acompanhá-lo, estavam agentes da GNR/SEPNA (Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente) de Montemor-o-Velho.

A águia morreu presa numa rede aérea de nylon de uma piscicultura no concelho de Figueira da Foz, indica uma nota enviada à Wilder pela equipa luso-espanhola deste projecto de conservação, que aponta o dedo à ameaça representada por estas redes.

 

Águia-de-Bonelli morta, presa na rede da piscicultura de Figueira da Foz. Foto: José Jambas

 

“Utilizadas para proteger os tanques das pisciculturas da predação por aves, principalmente aves marinhas, estas redes são a causa de mortalidade de numerosas espécies que se alimentam de peixe, tais como corvos-marinhos, garças e gaivotas – espécies observadas mortas e presas nas redes no momento em que se recolheu o cadáver da águia – e mesmo outras aves, como o caso da águia-de-Bonelli, que terá ido tentar caçar um dos corvos-marinhos que se encontrava já preso na rede.”

O problema colocado pela utilização destas redes aéreas é de “extrema gravidade”, consideram, não só “pela mortalidade causada”, mas também pela “negligência dos proprietários das pisciculturas que não retiram as aves quando estas ficam presas nas redes, deixando-as morrer lentamente à fome, à chuva ou ao sol.”

 

Outras aves encontradas mortas no mesmo local, na Figueira da Foz. Foto: José Jambas

 

Em Portugal, não há hoje qualquer legislação que proíba o uso destas redes aéreas de nylon, o que deveria ser uma prioridade, defendem também os responsáveis do projecto.

“É importante que se criem leis que proíbam a utilização deste tipo de redes, e que se encontrem soluções que permitam por um lado minimizar os prejuízos causados pelas aves marinhas aos piscicultores, e por outro lado eliminar a mortalidade de aves nestes locais”, sublinham.

O que acontece, nas explorações de piscicultura, é que os proprietários requerem uma licença de espantamento de aves ao Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). Ao passar a licença, esta entidade reguladora pode aconselhar a utilização de redes com malhas estreitas – que neste caso não foram utilizadas – e também a colocação de fitas de cor e outros objectos que afastem as aves.

 

Equipa de trabalho criada 

A utilização de redes aéreas de nylon como a que matou a águia-de-Bonelli é uma “prática comum” em Portugal, mas existem alternativas menos perigosas: “Bastaria colocar redes visíveis e com malha mais reduzida, com 50 a 60 milímetros, embora estas possivelmente sejam mais dispendiosas”, afirmou à Wilder um dos técnicos ligados ao projecto, José Jambas.

 

Águia-de-Bonelli, depois de retirada da água. Foto: José Jambas

 

Por outro lado, os piscicultores deveriam ser obrigados a “retirar todas as aves que fiquem presas nas redes e a libertá-las, enviando as feridas para centros de recuperação.”

Para já, foi criada uma equipa de trabalho para procurar soluções para este problema, com a participação do ICNF, da Direcção-Geral de Recursos Marinhos, da Associação Portuguesa de Aquacultores, de várias ONG e ainda empresas ligadas ao sector.

Quanto ao projecto de conservação que detectou esta águia-de-Bonelli, foi responsável pela marcação com emissores GPS desta e de outras seis aves da mesma espécie, ainda no ninho, na região espanhola do Parque Natural de Arribes Del Duero.

Destas sete aves, seis têm estado em território português. Duas dessas já morreram, incluindo a águia encontrada presa nas redes da piscicultura na Figueira da Foz e outra que foi encontrada morta em Dezembro no concelho de Alcácer do Sal, por causas ainda desconhecidas.

Este projecto está relacionado com uma exploração mineira de volfrâmio em Barruecopardo, na província espanhola de Salamanca, da responsabilidade da empresa Saloro. É coordenado pela Junta de Castela e Leão. A equipa que permitiu seguir estas aves e detectar a sua morte é constituída pelos técnicos José Jambas (Portugal), Javier García (Espanha) e Isidoro Carbonell (Espanha, em representação da empresa Saloro).

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.