tronco de uma árvore com musgo
Foto: Wilder/arquivo

Reforçada fiscalização à apanha mecânica nocturna em olivais superintensivos

Na véspera do início de mais uma campanha nacional da apanha da azeitona, as autoridades anunciaram que vão reforçar a fiscalização à apanha mecânica nocturna em olivais superintensivos no Alentejo. Esta prática tem causado a morte a milhares de aves como os pintassilgos, os tordos e as toutinegras.

Pelo segundo ano consecutivo, o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), através da Direcção Regional da Conservação da Natureza e Florestas do Alentejo, vai intensificar as acções de fiscalização ao longo da campanha de colheita de azeitona, de Outubro de 2021 a Março de 2022.

O objectivo é “assegurar que não ocorre qualquer prática que possa promover a mortalidade de aves, designadamente a apanha noturna de azeitona, i.e., no intervalo de tempo entre o ocaso e o nascer do sol”, explica o ICNF num comunicado enviado esta tarde à Wilder.

Isto porque “prática de colheita mecânica noturna de azeitonas nos olivais superintensivos conduz à perturbação e mortalidade de aves”, situação confirmada no ano passado por um Estudo sobre os impactos das culturas intensivas e superintensivas de olival em áreas de regadio, feito pelo Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV).

“Este estudo indica que a apanha mecânica noturna em olivais superintensivos provoca de forma significativa a mortalidade de aves e que as medidas de mitigação testadas, concretamente os processos de espantamento ensaiadas, se revelaram ineficazes.”

O ICNF alerta que a prática da apanha mecânica noturna em olival é alvo de ação sancionatória nos termos da lei e relembra que “a perturbação e mortalidade de aves constituem uma infração contraordenacional e penal à legislação em vigor, nomeadamente ao Código Penal, Dec.-Lei no 140/99, de 24 de abril, na sua atual redação e Dec.-Lei no 316/89, de 22 de setembro.”

O alerta para este problema chegou em 2018. No final desse ano, um relatório da Junta da Andaluzia, em Espanha, denunciou que pelo menos mais de dois milhões e meio de aves morreram, em 2017/18, no decurso da apanha nocturna de azeitona em províncias como Sevilha, Córdoba e Jaén.

Como consequência, em Dezembro de 2018, a Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza solicitou ao Governo informações mais detalhadas sobre a situação em Portugal. Segundo os dados a que a Quercus teve acesso, relativos a duas acções de fiscalização efectuadas pelo SEPNA/GNR à noite no Alentejo, foram detectadas 375 aves mortas, fruto da apanha nocturna de azeitona, 140 aves numa das acções de fiscalização (27/12/18) e 235 aves em outra (2/1/19). Algumas das espécies de aves atingidas por esta mortalidade foram o tordo-comum, a milheirinha, o lugre, o pintassilgo-comum, o verdilhão, o tentilhão-comum e a toutinegra.

A nível nacional, o problema “deve atingir, e segundo uma estimativa conservadora da Quercus, entre 70.000 e 100.000 aves em território nacional”.

Em Julho de 2020, e com base no novo estudo do INIAV, a entidade reguladora passou a sancionar a apanha mecânica nocturna em olivais, uma vez que “a perturbação e mortalidade de aves constituem uma infração contraordenacional e penal à legislação em vigor”.

No ano passado, quatro entidades – a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), a Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas e do Crédito Agrícola de Portugal (Confragri), a Casa do Azeite e a Associação de Olivicultores do Sul (Olivum) – decidiram suspender a colheita noturna mecanizada da azeitona na próxima campanha, a iniciar em Outubro.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.