Registado novo mecanismo de defesa nos arrebenta-bois

Estes escaravelhos desenvolveram estratégias curiosas para se defenderem de predadores, como o fingirem-se de mortos, defecarem ou permanecerem imóveis. Agora, investigadores espanhóis descobriram mais uma “arma”.

Num artigo publicado na revista The Science of Nature, investigadores do Museu Nacional espanhol de Ciências Naturais (MNCN-CSIC) registaram um novo mecanismo de defesa nos escaravelhos da família Meloidae chamado extrusão. 

Exemplar de Physomeloe corallifer em atitude alerta. Foto: Mario García París

Através deste mecanismo, os escaravelhos conseguem fazer a expulsão anal das membranas da parte final do seu tubo digestivo. “Dado que através destas membranas se pode ver a hemolinfa, esta estratégia faz com que estes animais apresentem uma coloração alaranjada ou avermelhada na parte final do corpo, o que simula uma auto-hemorragia sem a perda de líquidos associada a este mecanismo”, explicou o MNCN-CSIC em comunicado divulgado a 7 de Julho.

Este grupo de escaravelhos, amplamente distribuído pela Península Ibérica, caracteriza-se pela produção da cantaridina, um veneno com interesse farmacológico que dissuade os predadores graças à sua capacidade para degradar os tecidos.

“Quando estávamos a recolher exemplares da espécie Physomeloe corallifer, um escaravelho endémico da Península Ibérica, para outro estudo, observámos um comportamento muito estranho”, contou Paula Rodríguez-Flores, investigadora daquele Museu.

“Os escaravelhos expulsavam as membranas internas do proctodeo, mostrando uma cor alaranjada ou avermelhada na zona posterior do corpo. Foi o primeiro registo deste comportamento nestas espécies, que têm outros mecanismos de resposta a ameaças como permanecer imóveis, mostrar as antenas em atitude defensiva, defecar, induzir uma auto-hemorragia ou fingirem-se de mortos”, acrescentou a investigadora.

Estratégia de extrusão num escaravelho Physomeloe corallifer. Foto: Mario García París

No âmbito desta observação, a equipa de investigadores estudou a frequência dos vários mecanismos de defesa e o surgimento da extrusão do proctodeo em diferentes linhagens do grupo. “Escolhemos populações de três espécies: Berberomeloe majalis, Berberomeleo comunero e Physomeloe corallifer, procedentes de zonas do centro da Península Ibérica como Guadalajara, Sierra del Rincón ou Sierra de Gredos”, explicou Mario García-París, investigador do MNCN-CSIC. “Para o estudo visitámos o habitat natural destes animais e realizámos as experiências in-situ, expondo os indivíduos a diferentes tipos de ameaças como a observação directa, toques com o dedo e manipulação, para comprovar o aparecimento deste comportamento defensivo”, acrescentou.

Segundo Mario García-París, os resultados deste estudo mostram “diferenças entre espécies, tanto na frequência do aparecimento da extrusão como no grau de stress necessário para a desencadear”.

“A resposta a ameaças mediante extrusão foi bastante habitual nos escaravelhos da espécie Physomeloe corallifer, enquanto que as outras duas espécies estudadas precisaram de estímulos mais intensos para gerar esta resposta”, explicou a investigadora da Universidade de Salamanca Natalia Rosas-Ramos.

Isto indica que “este tipo de mecanismos poderá não ser usado em todas as linhagens”. Os investigadores acreditam que o mecanismo mais usado pelos arrebenta-bois será a auto-hemorragia e a morte finginda.

Os escaravelhos dos géneros Physomeloe e Berberomeloe são endémicos de zonas áridas e semi-áridas do Mediterrâneo. Por isso, o aparecimento da extrusão poderá explicar-se como uma alternativa à estratégia de auto-hemorragia, já que tem um efeito semelhante mas evitando a perda de líquidos.

Este estudo “é o ponto de partida para novas investigações que vão analisar a complexidade dos comportamentos de defesa destes escaravelhos”, adianta Natalia Rosas-Ramos.


Saiba mais sobre os arrebenta bois:

Descobertas seis novas espécies de arrebenta-bois (Maio de 2021).

Recorde um dos escaravelhos arrebenta-bois enviado pelos leitores da Wilder para identificação no “Que Espécie é Esta”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.