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Foto: Danilo Cedrone/Wiki Commons

Registados pela primeira vez sons produzidos por peixes nos Açores

Uma equipa de cientistas registou pela primeira vez sons produzidos por peixes a grande profundidade, no monte submarino Condor, nos Açores. Estes sons podem ajudar a conhecer melhor a biodiversidade marinha.

 

O estudo agora publicado na revista Deep-Sea Research descreve a ocorrência de sons de peixes ao longo de três anos – 2008, 2010 e 2012 -, a 190 metros de profundidade no monte submarino Condor, 17 quilómetros a sudoeste da ilha do Faial, nos Açores.

“Muitos peixes produzem sons para comunicar, principalmente durante a época de reprodução”, explica o MARE (Centro de Ciências do Mar e do Ambiente) em comunicado. Embora se pense que muitas espécies que vivem em águas mais profundas sejam vocais, a verdade é que “ainda existem muito poucos registos de sons de peixes a grandes profundidades”.

“Os registos acústicos foram detetados a cerca de 190 metros de profundidade, tratando-se do primeiro estudo na Europa a detetar sons de peixes a esta profundidade.”

Os sons – analisados por investigadores da Universidade dos Açores, da Universidade de Lisboa e do MARE-ISPA – foram identificados como pertencendo a peixes através da comparação com registos de outras espécies descritas na literatura.

“Os sons que detetámos exibem padrões temporais de abundância e diversidade muito interessantes”, explica Rita Carriço, primeira autora do estudo, investigadora do Centro de Investigação em Ciências do Mar – Okeanos e MARE.

“Há uma maior incidência de sons no período noturno e crepuscular, em que a comunicação visual está mais limitada”.

Algumas das espécies vocais que existem nos Açores e que podem ser encontradas a esta profundidade incluem o Mero (E. marginatus), peixe piloto (N. ductor), peixe galo (Z. faber), peixe lua (M. mola), Ruivo (C. cuculus), Lírio (S. dumerilli), Prombeta (T. ovatus) e Anchova (P. saltatrix)”, acrescenta.

Os investigadores validaram a informação acústica comparando os padrões anuais que registaram de abundância e diversidade de sons com os observados através de amostragem pelas pescas para um período temporal similar. A abundância e diversidade de espécies de peixes capturadas com palangre na mesma zona ao longo dos anos amostrados apresentou tendências semelhantes às observações acústicas.

 

Menos sons entre 2008 e 2012

O monte submarino Condor foi classificado como área protegida em 2010, pelo que os registos acústicos obtidos permitem avaliar os efeitos de protecção inicial desta classificação. Ao contrário do que os investigadores esperavam, os resultados indicam uma diminuição na abundância e diversidade de sons de 2008 a 2012.

“A diminuição dos registos acústicos assim como das espécies capturadas após o estabelecimento do estatuto de proteção do Condor, poderá dever-se aos impactos negativos da sobre-pesca e poluição de anos anteriores, tendo em conta que o ecossistema irá precisar de vários anos para recuperar”, explica Rita Carriço.

Segundo os investigadores, os resultados do estudo reforçam a importância deste método de monitorização acústica para avaliar e monitorizar a biodiversidade em águas profundas e de difícil acesso.

“Nesse sentido seria bastante útil identificar quais as espécies que produzem os sons registados e novas espécies produtoras de sons, comparando a sua distribuição geográfica e identificar os principais parâmetros que poderão influenciar a sua ocorrência, tirando partido de novas ferramentas como a utilização de diversos índices acústicos e de sistemas de reconhecimento automático para caracterizar as paisagens acústicas ”, diz Manuel Vieira, co-autor neste estudo e aluno de doutoramento do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c da Universidade de Lisboa e MARE-ISPA.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.