Guarda-rios. Foto: Lukas Bieri/Pixabay

Se não deixarmos de destruir a natureza iremos sofrer pandemias piores, alertam cientistas

Apenas uma espécie é responsável pelo coronavírus: os humanos, dizem quatro cientistas de renome mundial na área da Biodiversidade, numa carta divulgada a 27 de Abril.

 

É provável que a pandemia do coronavírus seja seguida por pandemias ainda mais mortíferas, a menos que a sua origem – a destruição do mundo natural – seja travada rapidamente. Esta é a grande mensagem que querem passar os investigadores Josef Settele, Sandra Díaz, Eduardo Brondizio e Peter Daszak.

Os primeiros três cientistas lideraram a mais completa avaliação à saúde do planeta alguma vez realizada, publicada em Maio de 2019 pelo Painel Intergovernamental sobre a Biodiversidade e Serviços dos Ecossistemas (IPBES). Concluiu que a sociedade humana está em perigo por causa do acelerar do declínio dos sistemas naturais que suportam a vida da Terra. E que cerca de um milhão de espécies de plantas e de animais estão em risco de extinção nas próximas décadas.

“Existe uma única espécie responsável pela pandemia do Covid-19 – nós”, dizem agora os cientistas nesta carta. “As recentes pandemias são uma consequência directa da actividade humana, em particular dos nossos sistemas financeiros e económicos, baseados num paradigma limitado que valoriza o crescimento económico a qualquer custo. Temos uma pequena janela de oportunidade para ultrapassar os desafios da crise actual, para evitar plantar as sementes de crises futuras.”

Num artigo publicado nesta segunda-feira, com Peter Daszak, que está a preparar a próxima avaliação do IPBES, Josef Settele, Sandra Díaz e Eduardo Brondizio escrevem: “A desflorestação, a expansão descontrolada da agricultura, a agricultura intensiva, a actividade mineira e o desenvolvimento de infraestruturas, bem como a exploração de espécies selvagens criaram a ‘tempestade perfeita’ para a propagação de doenças.”

Segundo estes peritos, “as nossas acções afectaram significativamente mais de três quartos da superfície terrestre do planeta, destruíram mais de 85% das zonas húmidas e dedicaram mais de um terço de todo o solo e quase 75% da água doce disponível para culturas agrícolas e produção de gado”.

Combinado com a urbanização e o crescimento explosivo das viagens aéreas globais, é fácil de compreender como um “vírus que circulava, de forma inofensiva, entre uma espécie de morcegos no Sudeste Asiático, tenha agora infectado quase três milhões de pessoas. Isto é a mão humana no surgimento de pandemia”.

E a Covid-19 pode ser só o início.

“Pandemias futuras deverão acontecer mais frequentemente, espalhar-se mais rapidamente, ter um maior impacto económico e matar mais pessoas se não formos extremamente cuidadosos sobre os possíveis impactos das escolhas que fazemos hoje”, escrevem ainda.

Neste artigo, os especialistas dizem acreditar que “podemos sair da crise actual mais fortes e resilientes do que nunca, se escolhermos acções que protegem a natureza, para que a natureza nos proteja.”

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.