Lince-ibérico, cria. Foto: Programa Ex-situ (arquivo)

Três anos de conservação trouxeram para o Alentejo mais de 40 linces

O lince-ibérico, espécie que esteve virtualmente extinta em Portugal, tem hoje uma população com mais de 40 animais. Hoje celebram-se três anos desde a primeira reintrodução na natureza, no Parque Natural do Vale do Guadiana.

 

O território do lince-ibérico (Lynx pardinus) em Portugal tem hoje cerca de 125 quilómetros quadrados, que abrangem os concelhos de Mértola, Serpa e Castro Verde. Aqui vivem mais de 40 linces. Destes, 27 vieram da rede ibérica de centros de reprodução em cativeiro e 16 já nasceram no Vale do Guadiana. Dois vieram por iniciativa própria das suas populações selvagens em Espanha.

Mas nesta conta de somar há subtrações a fazer. Uma fêmea morreu em Março de 2015, envenenada, e outra não resistiu a uma doença infecciosa de felinos, em 2016. Em 2017 morreu um macho atropelado e uma fêmea está desaparecida, tendo sido encontrada a sua coleira emissora, cortada, a Sul da área de reintrodução.

Em 2018, a “família” de linces do Vale do Guadiana poderá ultrapassar os 50 animais. Além das crias que se espera que nasçam na população selvagem no Alentejo, são aguardados seis linces, vindos dos centros de reprodução em cativeiro, revelou ontem o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) em comunicado.

 

Lince-ibérico. Foto: Programa de Conservação Ex-Situ

 

O primeiro destes seis animais já foi libertado a 23 de Janeiro, vindo do Centro Nacional de Reprodução do Lince-ibérico (CNRLI), em Silves. Chama-se Oregão e inaugurou a temporada de reintroduções de 2018 em Portugal. Os outros cinco linces vão chegar até Março vindos dos centros de reprodução de La Olivilla e de Granadilla, em Espanha, e também do CNRLI, “potenciando a variabilidade genética nas populações selvagens futuras”.

Este esforço de reintrodução da espécie no nosso país começou a 16 de Dezembro de 2014, quando uma fêmea e um macho, Jacarandá e Katmandú, foram transportados para um cercado de adaptação em Mértola. “Este cercado permitiu aos dois animais aclimatarem-se e estabelecerem uma relação entre si, em plena época de cio da fêmea”, lembra o ICNF. “No entanto, foi apenas no dia 2 de Fevereiro de 2015, que as portas do cercado foram abertas e os animais puderam sair para o meio natural, vindo a estabilizar territórios nas imediações.”

Passados três anos, o ICNF faz um “balanço positivo” da reintrodução deste felino em Portugal. Mas uma população viável e estável de lince-ibérico é uma meta a “médio prazo” e que precisa, por exemplo, de “sucessivas libertações que reforcem a presença em Portugal de um dos carnívoros mais ameaçados da Europa”.

Margarida Fernandes, do ICNF, contou hoje à Wilder que antes da reintrodução do lince, houve alguma tensão social entre as populações na região de Mértola. “Havia medo de que o lince causasse prejuízos nos animais domésticos, semelhante aos causados por raposas e sacarrabos”, por exemplo. Outra questão era o lince ser visto como um competidor para os caçadores e motivo de restrições às actividades cinegéticas. “Mas foram feitos acordos com zonas de caça e o lince não implicou nenhuma restrição adicional às actividades cinegética e agrícola. Isso sossegou as pessoas”.

Uma das maiores vantagens do lince, na opinião das populações, é o turismo de natureza. “Hoje já há biscoitos de lince, t-shirts, joalharia”, feitos por locais. Mas, recorda Margarida Fernandes, também há quem aceite este projecto de reintrodução “porque é para ajudar a salvar uma espécie, pelo balanço ecológico e por valores conservacionistas”.

 

Tendência regressiva da espécie está a inverter-se

Para já, a “evolução do número de exemplares na natureza em Portugal e noutros locais da Península ibérica está a inverter a tendência regressiva da espécie que se acentuou nas últimas décadas do século XX”, acrescenta o ICNF. Os mais recentes resultados do censo ao lince-ibérico, divulgados em meados de Janeiro, estimam a população mundial desta espécie Em Perigo de extinção em 547 animais.

 

Jacarandá e a cria. Foto: ICNF/arquivo

 

Os linces do Vale do Guadiana são acompanhados, à distância, por técnicos e vigilantes da natureza determinando localizações por um sistema de GSM ou por um sistema rádio com antenas portáteis. Assim, é possível saber que as 16 crias que já nasceram no Vale do Guadiana estão “saudáveis e, a maioria, já independentes dos progenitores”.

Ao longo destes três anos, os parceiros do projecto LIFE Iberlince (Recuperação da Distribuição Histórica do Lince Ibérico (Lynx pardinus) em Espanha e Portugal) têm unido esforços para receber o lince e melhorar o seu habitat. Segundo o ICNF, tem sido “fundamental a colaboração de proprietários e zonas de caça” e as acções de gestão do habitat feitas pelos parceiros do projecto.

De momento está a ser preparada “uma nova candidatura conjunta ao programa LIFE que dará seguimento ao atual projeto Iberlince que terminará em Junho de 2018″, adianta o ICNF.

 

[divider type=”thick”]Agora é a sua vez.

Participe na votação dos nomes para os 11 linces nascidos no meio natural na última Primavera, dinamizada pelo ICNF. Ao ano de 2017 corresponde a letra “O”. Todos os nomes são baseados em localidades em áreas de lince ou em elementos naturais ou simbólicos.

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Saiba como se liberta um lince na natureza.

Saiba como é cuidar dos linces no Vale do Guadiana.

Leia a nossa série “Como nasce um lince-ibérico” e conheça os veterinários, video-vigilantes, tratadores e restante equipa do CNRLI em Silves.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.