UE aprova legislação para combater a desflorestação

Floresta. Foto: Aymanjed Jdidi/Pixabay
Foto: Aymanjed Jdidi/Pixabay

A legislação agora aprovada quer garantir que vários produtos essenciais à venda no mercado europeu deixem de contribuir para a desflorestação na União Europeia (UE) e no resto do mundo.

Em causa está o acordo político provisório entre o Parlamento Europeu e o Conselho sobre um regulamento da UE relativo às cadeias de abastecimento de produtos não associados à desflorestação.

“Uma vez adotada e aplicada, a nova legislação garantirá que uma série de produtos essenciais colocados no mercado da UE deixarão de contribuir para a desflorestação e a degradação florestal, tanto na UE como no resto do mundo”, segundo um comunicado da Comissão Europeia.

Uma vez que a UE é uma grande consumidora destes produtos de base, este passo contribuirá para travar significativamente a desflorestação e a degradação florestal à escala mundial e reduzirá as emissões de gases com efeitos de estufa e a perda da biodiversidade.

Este acordo foi alcançado em vésperas do início da Conferência sobre a Biodiversidade (COP15), que deverá definir objetivos para a proteção da natureza ao longo das próximas décadas.

Após a entrada em vigor das novas normas, todas as empresas pertinentes deverão exercer a diligência devida se colocarem no mercado da UE, ou exportarem a partir deste último, os seguintes produtos: óleo de palma, gado, soja, café, cacau, madeira e borracha, bem como os seus produtos derivados (como a carne bovina, móveis ou chocolate). Estes produtos de base foram selecionados com base numa avaliação de impacto aprofundada que resultou na sua identificação como constituindo o principal vetor na origem da desflorestação devido à expansão agrícola a eles associada.  

O novo regulamento prevê normas de natureza estrita e vinculativa.

Os operadores e comerciantes deverão demonstrar que os produtos não estão associados à desflorestação (ou seja, que são produzidos em terras que não foram objeto de desflorestação após 31 de Dezembro de 2020) , bem como a respetiva legalidade (em conformidade com toda a legislação correspondente aplicável e em vigor no país de produção).

As empresas serão igualmente obrigadas a recolher informações geográficas precisas sobre as terras agrícolas em que foram cultivados os produtos de base que fornecem, para permitir verificar a conformidade desses produtos. Os Estados-Membros devem velar pela imposição de sanções eficazes e dissuasoras em caso de não observância dessas normas.

A lista dos produtos de base abrangidos será periodicamente revista e atualizada, atendendo aos novos dados disponíveis, como eventuais alterações no ritmo de desflorestação.

“Por meio deste acordo alcançado em vésperas da importante conferência mundial para a proteção da biodiversidade, a realizar em Montreal (COP15), a UE atesta claramente perante o resto do mundo a sua firme determinação de combater a desflorestação à escala mundial, que contribui de forma inexorável para a crise climática e a perda do nosso ambiente natural”, comentou Virginijus Sinkevičius, comissário do Ambiente, Oceanos e Pescas. “Para assegurar o êxito desta iniciativa, teremos de criar uma colaboração estreita e eficiente quer com os consumidores, quer com os países produtores.” 

O Parlamento Europeu e o Conselho terão agora de adoptar formalmente o novo regulamento antes de este poder entrar em vigor. Após a sua entrada em vigor, os operadores e os comerciantes disporão de 18 meses para proceder à aplicação das novas normas. As micro e pequenas empresas beneficiarão de um período de adaptação mais alargado.

A ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável e a DECO congratulam-se por este “passo ambicioso por parte das instituições europeias”. “Este diploma é um marco no combate à destruição e degradação de florestas ligadas à produção de mercadorias globais, garantindo que produtos como óleo de palma, bovinos, soja, café, cacau, madeira e borracha, e seus derivados (como por exemplo mobiliário e chocolate), diariamente adquiridos por milhões de consumidores da União Europeia, deixam de contribuir para a desflorestação e degradação das florestas, sem esquecer a redução das emissões e perda de biodiversidade.”

No entanto, salientam, “deixa no imediato de fora ecossistemas em grande risco – como o Cerrado -, não responsabiliza o setor financeiro e não assume uma aplicação robusta dos Direitos Humanos e das garantias de acesso à justiça”.

A desflorestação e a degradação florestal estão entre os principais fatores na origem do aquecimento global e da perda de biodiversidade, que constituem os dois maiores desafios ambientais da nossa era. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) estima que, entre 1990 e 2020, se perderam 420 milhões de hectares de zonas florestais, uma superfície superior à da UE. Em termos de perda líquida de superfície (que corresponde à diferença entre a superfície de floresta abatida e a nova superfície de floresta plantada ou regenerada), a FAO estima que o planeta perdeu cerca de 178 milhões de hectares de cobertura florestal durante o mesmo período, ou seja, o equivalente ao triplo da superfície da França.

O Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (IPCC, sigla em inglês) estima que, no período 2007-2016, 23 % das emissões antropogénicas de gases com efeito de estufa provieram da agricultura, da silvicultura e de outros usos do solo. Cerca de 11 % das emissões globais provêm da silvicultura e de outros usos do solo, ou seja, resultam principalmente da desflorestação, ao passo que os restantes 12 % são emissões diretas decorrentes da produção agrícola, incluindo a pecuária e os fertilizantes.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.