Wildlife Photographer of the Year: Conheça as histórias por detrás das fotografias

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Ontem à noite foram revelados os grandes vencedores das várias categorias da 56ª edição dos Wildlife Photographer of the Year. Conheça as fantásticas histórias por detrás destas fotografias.

São várias as categorias a concurso, entre elas as mais disputadas ao longo dos anos: Comportamento Mamíferos, Comportamento Aves e Retratos de Animais, com milhares de fotografias candidatas.

O objectivo de todas elas é mostrar as espécies, os comportamentos e as paisagens que nós não conseguimos ir ver, ajudar-nos a descobrir o encantamento pelo mundo natural e dar voz à biodiversidade através das câmaras e das lentes fotográficas.

Aqui estão as fantásticas histórias por detrás das fotografias que venceram o primeiro prémio em cada categoria. O grande vencedor foi The embrace, do fotógrafo russo Sergey Gorshkov.

Retratos de Animais: “The pose“, por Mogens Trolle, Dinamarca

© Mogens Trolle, Wildlife Photographer of the Year 2020

Um jovem macho macaco-narigudo (Nasalis larvatus) inclina um pouco a cabeça e fecha os olhos. As pálpebras, de um inesperado azul pálido, complementam o seu pêlo cuidadosamente cuidado. Ele pousa por alguns segundos como que em meditação. É um visitante selvagem da estação de alimentação do Santuário para macacos-narigudos de Labuk Bay em Sabah, no Bornéu. Era a “personagem mais descontraída”, recorda Mogens Trolle, que, nos últimos cinco anos, tem fotografado primatas em todo o mundo. Em algumas espécies de primatas, a cor contrastante das pálpebras tem um papel na comunicação entre os animais. Mas a sua função nos macacos-narigudos ainda não é clara. Mas o aspecto mais distintivo deste jovem macho é, claro, o seu nariz. À medida que ele for envelhecendo, o nariz vai crescendo, de tal forma que precisará de o afastar da boca para poder comer.

Os macacos-narigudos apenas vivem na ilha do Bornéu e nas ilhas mais próximas. São uma espécie ameaçada. Alimentando-se principalmente de folhas (bem como de flores, sementes e frutos), dependem das florestas ameaçadas perto de rios ou na costa.

Mogens Trolle espera, com este retrato – e com a expressão de tranquilidade -, aproximar-nos dos primatas.

Comportamento Anfíbios e Répteis: Life in the balance”, por Jaime Culebras, Espanha

© Jaime Culebras, Wildlife Photographer of the Year 2020

Uma rã-de-vidro-de-Manduriacu (Nymphargus manduriacu) alimenta-se de uma aranha no sopé dos Andes, no Equador. São grandes consumidoras de invertebrados e por isso as rãs-de-vidro têm um papel importante para manter o equilíbrio dos ecossistemas. Naquela noite, a determinação de Jaime Culebras para partilhar a sua paixão por estes animais levou-o a caminhar durante quatro horas, debaixo de chuva torrencial, pela floresta para chegar aos riachos na Reserva Manduriacu.

Mas as rãs estavam difíceis de encontrar e a chuvada estava cada vez mais forte. Ao voltar para trás, curiosamente, encontrou uma pequena rã num ramo, os seus olhos como mosaicos brilhantes. Não só estava a alimentar-se – Jaime só tinha fotografado uma vez rãs-de-vidro a alimentar-se – mas também era uma espécie recentemente descoberta para a Ciência.

Com as suas distintivas pintas amarelas, a rã-de-vidro-de-Manduriacu apenas vive numa área pequena. Está classificada como Criticamente em Perigo. A reserva é privada e gravemente ameaçada por actividades mineiras, autorizadas pelo Governo (minas a céu aberto para extracção de ouro e cobre), e pelo abate ilegal de árvores.

Ao som do coro das rãs numa noite de chuva torrencial, Jaime Celebras segurou no seu guarda-chuva e flash com uma mão e a câmara fotográfica com a outra e captou a primeira fotografia de sempre desta espécie a alimentar-se.

Comportamento Aves: “Great crested sunrise”, por Jose Luis Ruiz Jiménez, Espanha

© Jose Luis Ruiz Jiménez, Wildlife Photographer of the Year 2020

Depois de várias horas mergulhado em água até ao peito numa lagoa perto de Brozas, em Espanha, José Luís captou este momento íntimo de uma família de mergulhão-de-crista (Podiceps cristatus).

A sua câmara flutuava numa plataforma com forma de U debaixo de um pequeno abrigo camuflado. Os mergulhões estão no seu máximo esplendor na época de reprodução. Eles constroem um ninho feito com plantas aquáticas.

Para evitar predadores, as suas crias deixam o ninho poucas horas depois de os ovos terem eclodido, apanhando boleia no conforto das costas dos pais. É aí que vão viver nas próximas duas a três semanas, sendo alimentados o mais rapidamente possível para os pais.

Naquela manhã, o pai de serviço ao pequeno-almoço – depois de perseguir peixes e invertebrados debaixo de água – emergiu com as penas molhadas e uma refeição saborosa e a cria esticou-se, de bico aberto, para reclamar o peixe. À luz suave da manhã, José Luís conseguiu revelar os detalhes destas aves graciosas e dos cuidados parentais.

Comportamento Invertebrados: “A tale of two wasps”, por Frank Deschandol, França

© Frank Deschandol, Wildlife Photographer of the Year 2020

Este é um espantoso enquadramento de uma vespa Ammophila sabulosa (à esquerda) e de uma vespa-cuco Hedychrum, prestes a entrar no ninho. A fêmea de vespa-cuco, com apenas seis milímetros, parasita os ninhos de algumas vespas, pondo os seus ovos nos ninhos dos seus hospedeiros para que as suas larvas se possam alimentar dos ovos ou larvas que lá se encontram.

A ideia original de Frank Deschandol era fotografar a vespa cuco, com as suas cores fantásticas. Numa zona perto da sua casa na Normandia, no Norte de França, ele localizou os pequenos buracos dos ninhos das vespas. Acabou por conseguir captar não só a vespa cuco mas também a vespa Ammophila sabulosa. Apesar de estas duas espécies não interagirem regularmente, Frank conseguiu uma composição equilibrada dos trajectos de voo destes insectos para os seus ninhos.

Comportamento Mamíferos: “When mother says run”, por Shanyuan Li, China

© Shanyuan Li, Wildlife Photographer of the Year 2020

Esta rara fotografia de uma família de gato-de-pallas (Otocolobus manul) nas estepes remotas do planalto do Tibete, no Nordeste da China, é o resultado de seis anos de trabalho a elevadas altitudes.

Estes pequenos felinos são normalmente solitários, difíceis de encontrar e activos principalmente ao amanhecer e ao anoitecer. Depois de uma observação de longo prazo, Shanyuan sabia que a sua melhor hipótese para os fotografar à luz do dia seria em Agosto e Setembro, quando as crias têm poucos meses e as mães estão mais afoitas para as alimentar e cuidar delas.

O fotógrafo seguiu a família quando esta desceu até aos 3.800 metros à procura do seu alimento preferido – pikas (pequenos mamíferos, do tamanho de coelhos) – e se abrigou num antigo buraco de marmota. Horas de paciência foram recompensadas quando as crias crias saíram para brincar, enquanto a sua mãe se mantinha atenta a uma raposa do Tibete que estava por perto. Shanyuan captou as suas expressões num momento em família raramente visto, quando a sua mãe deu o sinal para as suas crias baterem em retirada para a segurança do abrigo.

Mas a verdadeira ameaça a estes animais não são as raposas mas a degradação e fragmentação dos habitats, causadas pelo sobre-pastoreio, conversão para terrenos agrícolas, exploração mineira e perturbação humana, além da caça.

Plantas e fungos: “Out of the blue”, por Gabriel Eisenband, Colômbia

© Gabriel Eisenband, Wildlife Photographer of the Year 2020

Foi em Ritak’Uwa Blanco, o pico mais elevado da Cordilheira Oriental dos Andes Colombianos, que Gabriel fez esta fotografia. Instalou a sua tenda no vale e subiu à montanha para fotografar o pico coberto de neve contra o pôr-do-Sol.

Mas foram estas flores que lhe chamaram a atenção. Conhecida como arnica branca (Senecio niveoaureus), esta planta pertence à família das margaridas e só ocorre na Colômbia. Floresce em elevadas altitudes e está adaptada ao frio extremo por estar coberta por pêlos brancos que parecem lã e pelas proteínas “anti-congelamento” nas suas folhas.

A hora mágica do pôr-do-Sol deu lugar a uma hora em tons de azul, que encheu o espaço com uma luz etérea. Parecendo brilhar mais à medida que a luz ia desaparecendo, as flores amarelas começam a dominar a imagem, conduzindo o olhar para a montanha mas roubando-lhe o protagonismo.

 

Categoria sub-aquática: “The golden moment”, por Songda Cai, China

© Songda Cai, Wildlife Photographer of the Year 2020

Songda mergulha de noite em águas profundas, ao largo da costa de Anilao, nas Filipinas, para fotografar a vida selvagem que ali vive.

Ele nunca sabe o que vai encontrar neste mundo escuro e silencioso. Ao coberto da noite, todo o tipo de larvas e outros minúsculos animais – o zooplâncton – migram desde as profundezas para cima. E atrás deles vão os predadores.

A lula Thysanoteuthis rhombus vive nos oceanos tropicais e subtropicais, alimentando-se de peixes, de outras lulas e crustáceos junto à superfície.

Em Novembro, centenas reúnem-se ao largo de Anilao para a desova.

Esta lula transparente tem pigmentos que passam a discos de cor quando os músculos em seu redor se contraem. Uma investigação recente sugere que também reflectem a luz.

De cima, Songda captou o momento fugaz quando uma paralarva desta espécie de lula se transformou numa cor dourada.

Vida selvagem urbana: “Watching you watching them”, por Alex Badyaev, Russia/EUA

© Alex Badyaev, Wildlife Photographer of the Year 2020

Que regalo para um biólogo: a espécie que quer estudar escolhe fazer ninho mesmo em frente à sua janela.

O papa-moscas-de-Cordilleran (Empidonax occidentalis) está em declínio na zona ocidental da América do Norte, à medida que as alterações climáticas reduzem os seus habitats junto aos rios e outros corredores de água doce ao longo das suas rotas migratórias e nas zonas de invernada no México.

Além disso, esta espécie é muito específica quanto à escolha do lugar para fazer o ninho. Na região montanhosa do Montana, nidifica tipicamente em fendas e nas zonas planas dos desfiladeiros.

Mas um casal escolheu esta remota cabana usada para investigação, talvez para evitar predadores. O ninho foi construído pela fêmea num caixilho de uma janela. Ela construiu-o com musgo, ervas e outros materiais vegetais e deu-lhe forma com fibras finas, cabelos e penas. Ambos os pais estavam a alimentar as crias, voando para apanhar insectos em pleno voo ou em folhas.

Assim, para não perturbar as aves, ou atrair predadores para o ninho, Alex escondeu a sua câmara por detrás de um pedaço de casca de uma antiga conífera inclinada sobre a cabana. Dirigiu o flash para o tronco, para que a cena fosse iluminada pelo seu reflexo, e operou a câmara remotamente a partir da cabana. A fotografia mostra o momento em que a fêmea fez uma pausa para verificar como estavam as suas quatro crias, com 12 dias de idade. Por detrás dela, o biólogo registou as suas observações.

Ambientes da Terra: “Etna’s river of fire”, por Luciano Gaudenzio, Itália

© Luciano Gaudenzio, Wildlife Photographer of the Year 2020

Lava escorre do Monte Etna, dentro de um enorme túnel de lava, reemergindo na encosta mais abaixo enquanto rio vermelho incandescente, envolvido em gases vulcânicos.

Para testemunhar esta imagem, Luciano e os seus colegas caminharam várias horas pelo lado norte do vulcão, pelo meio de massas rochosas quentes, resíduos de erupções passadas.

Luciano descreveu o que viu à sua frente como hipnótico, a abertura parecendo uma ferida aberta na pele dura e enrugada de um dinossauro.

Foi em 2017 e Luciano tinha estado na ilha de Stromboli para fotografar erupções quando ouviu nas notícias de uma nova abertura no maior vulcão da Europa. O fotógrafo apanhou o ferry seguinte, na esperança de chegar a tempo de ver o espectáculo. O que Luciano mais queria fotografar era o drama do rio de lava a correr em direcção ao horizonte. A única forma de o conseguir para esperar até ao pôr-do-Sol, quando as sombras contrastantes cobririam aquele lado do vulcão e, com uma exposição longa, poderia fixar o fluxo incandescente contra o nevoeiro gasoso azul para captar “o momento perfeito”.

Foto-jornalismo de vida selvagem, Imagem única: “Show Business”, por Kirsten Luce, EUA

© Kirsten Luce, Wildlife Photographer of the Year 2020

Com uma mão a indicar ao urso para se manter de pé e a outra a segurar um bastão, a treinadora dirige um espectáculo sobre gelo.

Uma focinheira de arame impede o urso-polar de morder e uma rede de segurança rodeia o palco do circo.

É uma imagem chocante, não apenas porque o predador é muito maior do que a pequena mulher mas também por causa da desproporção de poder expressa na postura do urso e na consciência de que está a actuar obrigado.

Mas para os espectadores deste circo russo ambulante, aqui na cidade de Kazan, isto é entretenimento. Ignoram o treino que o urso é obrigado a ter e o que terá de aguentar nos bastidores. Quando não está a actuar passará a maior parte do seu tempo numa jaula de transporte.

O urso-polar é uma de quatro fêmeas, capturadas na região russa de Franz Josef Land quando tinham dois anos (estavam “abandonadas”, segundo a treinadora), e está a actuar há 18 anos no circo Circus on Ice, o único circo que se conhece a ter ursos-polares.

Para a fotógrafa, que passou dois anos a registar e a denunciar a exploração e abusos a animais, esta foi a cena mais chocante que alguma vez fotografou, tendo como centro um ícone da vida selvagem do Árctico.

Reportagem de foto-jornalismo de vida selvagem: “Backroom business”, por Paul Hilton, Reino Unido/Austrália

© Paul Hilton, Wildlife Photographer of the Year 2020

Um jovem macaco-de-cauda-de-porco (Macaca nemestrina) é posto em exposição numa jaula de madeira no mercado de aves de Bali, na Indonésia. A sua mãe e a mãe de outros jovens macacos em exposição terão sido mortas.

Estes macacos – enérgicos e sociais – vivem nas florestas do Sudeste Asiático. À medida que a floresta é destruída, eles vão invadindo zonas agrícolas e são abatidos por serem considerados pragas. As crias são vendidas, destinadas a uma vida de confinamento solitário como animal de estimação, para um jardim zoológico ou para investigação biomédica.

Paul convenceu o vendedor de que estava interessado em comprar o macaco e assim conseguiu fotografá-lo, numa sala escura. Muita da vida selvagem ilegal nos mercados ao ar livre é vendida nos bastidores. Os macacos podem ser vendidos de forma legal; as espécies proibidas, como os orangotangos bebés, são mantidos em caixas longe da vista.

Mercados destes facilitam o tráfico de espécies, oferecendo aquilo que não há em stock. Além disso, tantos animais juntos uns dos outros facilita a propagação de doenças.

Wildlife Photographer of the Year Portfolio Award: “The last bite”, por Ripan Biswas, Índia

© Ripan Biswas, Wildlife Photographer of the Year 2020

Estes dois predadores vorazes quase nunca se encontram. O gigante besouro-tigre persegue as suas presas no solo, enquanto as formigas fazem a sua vida, principalmente, nas árvores. Mas quando se encontram, ambos precisam de ter cuidado.

Quando uma colónia de formigas caçava pequenos insectos no leito seco de um rio na Reserva Buxa Tiger, na Índia, um besouro-tigre começou a apanhar algumas das formigas. Debaixo do Sol do meio-dia, Ripan deitou-se na areia e aproximou-se mais.

Os olhos do besouro são excelentes para detectar presas, para as quais avança tão rapidamente que tem de segurar as suas antenas da frente para evitar obstáculos.

Com mais de 12 milímetros, é um gigante em relação às formigas. Para se defender, uma mordeu uma pata de trás do besouro. Este voltou-se para trás e facilmente cortou a formiga em duas.


Saiba mais.

Recorde aqui o grande vencedor deste ano.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.