Abutre-preto volta a nidificar no Alentejo 40 anos depois

Dois casais de abutre-preto, a maior ave rapina da Europa, estão a nidificar numa herdade em Moura. Há 40 anos que não se reproduziam no Sul do país. A Liga para a Protecção da Natureza acredita que este pode ser o início do terceiro núcleo reprodutor em Portugal para esta espécie Criticamente em Perigo.

Os dois casais reprodutores de abutre-preto (Aegypius monachus) foram detectados recentemente durante uma visita à Herdade da Contenda para monitorizar os 12 ninhos lá instalados há cerca de três anos, informou nesta sexta-feira a Liga para a Protecção da Natureza (LPN), com comunicado.

Os ninhos são estruturas pesadas compostas por varas metálicas e um cesto na ponta. “Foi possível confirmar a presença de um exemplar desta espécie em incubação num destes ninhos e a deposição de material de revestimento noutro, correspondendo assim ao início do desejado restabelecimento de uma colónia reprodutora no Alentejo”, informa a organização.

Este esforço de conservação para que a ave volte a reproduzir-se na região está a acontecer na Herdade da Contenda, com 5300 hectares e propriedade do município de Moura, onde foram instalados em 2012 doze ninhos artificiais para o abutre, no âmbito do projecto LIFE “Habitat Lince Abutre”.

Durante mais de 40 anos, o abutre-preto, ave com três metros de envergadura de asa e 12 quilos, não fez ninho em Portugal. Em 2010 e 2011 regressou ao Tejo Internacional, onde nidificaram três dos 7200 a 10.000 casais que a Birdlife International estima existirem no mundo.

Neste momento está a nidificar no Tejo Internacional (12 casais) e no Douro Internacional (um casal), segundo a LPN.

O declínio em Portugal deveu-se à perda de habitat, envenenamento, colisão e electrocussão em linhas eléctricas e diminuição de alimento disponível. Na verdade, o abutre-preto tem um papel crucial na sanidade do ecossistema mediterrânico, ao actuar como agente de limpeza natural, removendo cadáveres.

Além da instalação de 30 ninhos artificiais nas regiões de Moura, Mourão e Barrancos e do Vale do Guadiana, o projecto LIFE-Natureza “Habitat Lince Abutre” (2010-2014) criou ainda uma rede de campos de alimentação para aves necrófagas, dirigida ao abutre-preto.

Durante os próximos meses a LPN continuará a fazer a monitorização dos ninhos ocupados pelo abutre-preto, em colaboração com a Herdade da Contenda, “tendo permanentemente em atenção a necessária compatibilização com as restantes actividades em curso na propriedade, como sejam a caça, a silvicultura, o ecoturismo ou o usufruto pelas comunidades locais”, acrescenta.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.