Foto: Diogo Oliveira

Como é que as aves resistem à chuva e ao frio?

Com a chegada do Inverno muitas aves migram para África, mas outras permanecem nos locais onde nasceram, incluindo os pequenos passeriformes. João Eduardo Rabaça, da Universidade de Évora, explica como estas espécies fazem frente às temperaturas mais baixas.

O Inverno chegou e os dias ficam mais frios e chuvosos. Para os passeriformes, esta é uma altura “exigente”: “Noites longas e temperaturas baixas obrigam estas aves a encontrarem energia extra”, nota João Eduardo Rabaça, que é professor da Universidade de Évora e coordenador do LabOr – Laboratório de Ornitologia.

Estas pequenas aves dedicam-se a acumular “as reservas de gordura suficientes que lhes permitam sobreviver”, pelo que passam a maior parte do dia a comer. De acordo com o British Trust for Ornithology, os chapins-azuis (Cyanistes caeruleus) – que podemos observar em muitos espaços verdes, incluindo o Jardim Gulbenkian, em Lisboa – podem gastar cerca de 85% das horas de luz disponíveis num dia de Inverno em busca de alimento, refere este investigador.

Chapim-azul (Cyanistes caeruleus). Foto: Diogo Oliveira

Ao mesmo tempo, para os passeriformes em geral, o “revestimento plumoso permite a existência de bolsas de ar debaixo das penas, conferindo-lhes uma ajuda adicional para manterem o corpo quente.”  

Algumas espécies começam a preparar-se para a estação mais rigorosa do ano logo no Outono, como acontece com o pardal-comum (Passer domesticus), exemplifica. “Cresce-lhes uma penugem por baixo da plumagem principal aumentando o peso do revestimento do corpo em 70%! E assim asseguram uma melhor proteção térmica.”

Pardal-comum (Passer domesticus). Foto: Diogo Oliveira

Mas há ainda outras estratégias pouco conhecidas. Quando estão em actividade, a temperatura corporal das aves é superior à dos humanos, pois “ronda os 41ºC, embora haja variações.” No entanto, para enfrentarem noites mais frias, em algumas espécies a temperatura corporal chega a baixar 10ºC ou mais ainda – um processo designado por torpor ou heterotermia diária, adianta o investigador. “Desta forma, as aves conseguem economizar energia. O caso mais impressionante é de uma espécie de beija-flor que ocorre nos Andes e que durante a noite pode atingir uma temperatura corporal de 3,26ºC!”, revela o coordenador do LabOr. “É um exemplo extremo, mas é também um extraordinário exemplo da capacidade de adaptação destes animais.”   

Mais comum é a hipotermia regulada, que se traduz “numa redução da temperatura corporal mais modesta, normalmente à volta dos 5 a 6ºC.” Com este método, as aves precisam de muito menos energia para que o corpo regresse à temperatura “normal” quando chega a manhã.

Tordo-comum (Turdus philomelos). Foto: Diogo Oliveira

Mas apesar de estar mais frio por estes dias, a verdade é que “o Inverno no sul da Europa e em particular no nosso país é bastante ameno quando comparado com a realidade do centro e norte da Europa, por exemplo”. Por essa razão – lembra o investigador, que é também autor do livro “As aves do Jardim Gulbenkian” – são inúmeras as aves que no final do Verão deixam as regiões setentrionais para migrarem rumo a sul, onde vão permanecer durante a estação fria. É o caso por exemplo do lugre (Spinus spinus) e do tordo-comum (Turdus philomelos).


Um naturalista no Jardim Gulbenkian

Ao longo do ano, a cada mês, desvendamos alguns dos fenómenos que estão a acontecer no Jardim Gulbenkian e no mundo natural.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.