um juvenil de alcatraz em voo
Juvenil de alcatraz, mais frequente em Sagres na época migratória. Foto: Carla Salvador / CMVB

Porque é que Sagres atrai tantas aves migradoras no Outono?

Pela região de Sagres, na ponta sudoeste do Algarve, passam milhares de aves entre a Europa e África, em especial durante a migração do Outono. Para saber porque é que isto sucede, a Wilder falou com André Pinheiro, da associação algarvia Almargem.

 

Durante os últimos anos, registaram-se cerca de 250 espécies de aves em Sagres durante as migrações do Outono, em que muitas deixam os territórios europeus onde procriaram e também onde algumas nasceram, durante a Primavera, para irem passar os meses mais frios em África.

“O que mais vemos em Sagres, durante as grandes migrações, são aves imaturas ou juvenis”, explicou o responsável da Almargem, associação ambientalista que está a organizar o Festival de Observação de Aves de Sagres – entre esta quinta-feira e domingo – em conjunto com a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) e com a Câmara Municipal de Vila do Bispo.

 

abutre do Egipto visto de baixo, em voo
Juvenil de abutre-do-Egipto. Foto: P. Jeganathan / Wiki Commons

 

Os cientistas sabem que existem três grandes rotas que as aves migradoras costumam seguir entre a Europa e África. A que fica mais a Oeste passa pelo centro da Península Ibérica, em território espanhol, e segue directamente pelo Estreito de Gibraltar, onde a distância por mar entre os dois continentes é menor.

No entanto, acredita-se que a ponta sudoeste do Algarve é uma alternativa preferida pelas aves mais jovens, “que ainda não conhecem o atalho do Estreito de Gibraltar”, diz André Pinheiro. “Muitas destas aves vêm do Norte da Europa, seguem a linha da costa da Galiza e depois da costa de Portugal, até chegarem à região de Sagres.”

Outra teoria afirma que Sagres é a ‘planície das aves perdidas’. Porquê? Porque alguns cientistas defendem que as aves mais jovens, durante a migração, são empurradas pelos ventos do quadrante Leste e ali vão parar, meio perdidas, desviadas da rota principal.

Seja como for, vários milhares de aves passam pela região, nesta altura do ano, e muitas aproveitam para descansar e recarregar energias para o resto da viagem.

 

Os mais pequenos são os mais afoitos 

“As aves de rapina seguem normalmente a linha da costa algarvia até chegarem ao Estreito de Gibraltar, zona em que atravessam para o lado africano.” Já as mais pequenas, os passeriformes, são mais afoitas. Muitas lançam-se directamente sobre as águas do Oceano Atlântico – a partir de Sagres, são cerca de 400 quilómetros de mar até chegarem a África.

Muitas das aves chegam ao Sudoeste do Algarve vindas do Norte da Europa, onde nidificaram. De que países? “Norte da Alemanha, Holanda, Reino Unido e ainda a Polónia, mais para Leste”, descreve o mesmo responsável. “Mas também temos algumas espécies de rapinas que não nidificam mais a norte do que França e alguns passeriformes que não passam para norte dos Pirinéus.” 

 

um abutre-preto a voar
Abutre-preto. Foto: Juan Lacruz/Wiki Commons

 

E durante a migração de Outono, que aves vale a pena tentar observar? “As grandes estrelas são as rapinas”, sublinha. “Do ponto de observação da Cabranosa [zona do Cabo de São Vicente], podemos ver com alguma facilidade todas as espécies de rapinas que podem ser encontradas em Portugal, tanto migratórias como residentes.”

André Pinheiro destaca algumas rapinas que se podem ver agora na altura do festival: “Águia-cobreira, que se deixa ver com alguma facilidade em Sagres; abutre-do-Egipto, os que vemos em Sagres muitas vezes são juvenis; falcão-abelheiro, muito difícil de ver em Portugal mas migra a baixa velocidade; abutre-preto.”

O destaque vai também para as cegonhas-pretas – “no festival do ano passado viram-se algumas dezenas em migração” -, o chasco-cinzento e também as várias espécies de petinhas e toutinegras. Tanto petinhas como toutinegras costumam ser mais fáceis de observar durante as acções de anilhagem, diz.

 

chasco cinzento no solo
Chasco-cinzento. Foto: Francesco Veronesi / Wiki Commons

 

Entre as espécies residentes, que vale a pena procurar nesta altura do ano, o responsável da Almargem aponta a gralha-de-bico-vermelho e o pombo-das-rochas, “muito parecido com o pombo das cidades mas na verdade o pombo original, e ao contrário dos primeiros muito esquivo”.

 

Atenção às aves raras

“Em 2017, durante os dias do Festival de Sagres foram registadas 169 espécies de aves observadas, entre as quais nove raridades”, recorda André Pinheiro. Aliás, todos os anos por esta altura é costume serem vistas na região algumas aves mais raras, que obrigam à homologação do registo pelo Comité Português de Raridades, da SPEA.

 

águia da pomerânia de pé no solo
Águia-da-Pomerânia. Foto: Wolbrum avner / Wiki Commons

 

No ano passado, descreve, foram estas as raridades observadas: ganso-de-faces-pretas, grifo-pedrês, águia-da-Pomerânia, tartaranhão-pálido, alfaneque ou falcão-lanário, gaivota-de-Sabine, alcatraz-pardo, felosa-listada, papa-moscas-real.

 

[divider type=”thin”]Saiba mais.

Recorde aqui cinco motivos para ir ao Festival de Sagres deste ano e algumas das actividades destacadas pela Wilder, quase todas gratuitas, nas quais vai poder participar.

 

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Este artigo faz parte de uma série de trabalhos patrocinados pelo Festival de Sagres. O conteúdo é inteiramente da responsabilidade da Wilder.

 

 

 

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.