Foto: Helena Geraldes/Wilder

Cinco medidas que pode tomar em Portugal para combater as alterações climáticas

O relatório especial sobre o clima, do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas, foi um mega-grito de alerta lançado na passada segunda-feira. A Wilder pediu a Francisco Ferreira, presidente da associação ZERO-Associação Sistema Terrestre Sustentável, cinco medidas com as quais cada um de nós pode contribuir, em Portugal, para ajudar a evitar uma catástrofe.

 

No novo relatório agora divulgado, os cientistas avisam que é urgente tomarem-se medidas para evitar o aquecimento global acima dos 1,5ºC e que a humanidade tem apenas cerca de 12 anos para meter mãos ao trabalho, até 2030, antes que a situação se torne irreversível e os impactos sejam bem piores – incluindo para a biodiversidade.

Assim, avisa o documento, se o aumento global das temperaturas chegar aos 2ºC, em 2100 praticamente todos os recifes de corais terão deixado de existir. Com uma subida de 1,5ºC, ainda se podem salvar entre 10 e 30 por cento.

Os efeitos negativos para a biodiversidade não se ficam por aqui, mas com uma subida de 2ºC serão bem piores. Nesse caso, calcula-se que 8% das espécies de vertebrados, 18% das de insectos e 16% das espécies de plantas vão perder metade da área de distribuição onde conseguem habitar. Se o aumento for de 1,5ºC, estamos a falar de 4% nos vertebrados, 6% nos insectos e 8% nas plantas.

 

Foto: Joana Bourgard/Wilder

 

Ciclones tropicais mais fortes, secas mais severas e a subida mais rápida dos níveis do mar são outras diferenças que dependem de um intervalo de 0,5ºC, que por sua vez terão também impacto no mundo natural.

E embora a maior quota do esforço necessário esteja dependente dos governos e das empresas, há várias acções que cada pessoa pode empreender para fazer a sua parte. Francisco Ferreira, da associação ZERO, diz quais considera serem as cinco medidas mais importantes nas mãos de cada um, ligadas à realidade portuguesa:

 

1. Reduzir o consumo de electricidade gasta no aquecimento (e arrefecimento) das casas:  Estima-se que a produção de electricidade em Portugal é responsável por um quarto (25%) das emissões de carbono para a atmosfera, ligadas ao efeito de estufa e ao aquecimento global, indica Francisco Ferreira. Isto porque uma parte importante vem de fontes não renováveis: entre Janeiro e Junho, cerca de 40% da electricidade portuguesa foi produzida em duas centrais que queimam carvão (em Pego e em Sines) e em centrais a gás natural.

 

Unidade de exploração de carvão
Foto: Pixabay

 

Ao mesmo tempo, de ano para ano, aumenta o consumo de energia eléctrica. “Uma das áreas em que estamos a crescer de forma insustentável é o conforto térmico em casa”, critica o presidente da ZERO, que aponta o dedo especialmente aos aquecedores a óleo. “Quase que deveríamos fazer uma auditoria casa a casa, para vermos o que podemos mudar para reduzir o consumo, melhorando o conforto.”

Em causa estão mudanças estruturais, como o uso dos materiais certos – “é importante usar materiais de isolamento e sabemos que há materiais baratos”, afirma – e também alterações de comportamento. “Correr os estores no Verão, por exemplo.”

 

2. Investir em painéis fotovoltaicos: Da mesma forma que importa reduzir o consumo de electricidade, há que apostar em fontes renováveis, como é o caso da energia solar. Feitas as contas, diz Francisco Ferreira, um investimento de 300 ou 400 euros num painel fotovoltaico virado a sul, que depois é ligado à instalação eléctrica, “está pago ao final de sete anos e dura um total de 25 anos”.

Ainda assim, reconhece que há melhorias “muito importantes” a fazer na legislação, como por exemplo o estabelecimento de regras para estas situações em regime de condomínio.

 

3. Evitar o carro sempre que possível: O tráfego automóvel representa, tal como a produção de electricidade, 25% das emissões de carbono em Portugal. E por isso é importante apostar nos transportes públicos, andar ou pé ou de bicicleta, partilhar as viagens de carro, aconselha o ambientalista. Francisco Ferreira admite que pode ser mais difícil fora de grandes cidades. Mas por exemplo, “o próximo carro a comprar pode ser um carro eléctrico.”

 

um homem a andar de bicicleta na cidade
Foto: Pixabay

 

4. Reduzir o consumo de carne de vaca e de produtos lácteos: O impacto da pecuária nas emissões de carbono, em especial do gado bovino, não é tão forte em Portugal como noutros países, pois é ultrapassado pela electricidade e pelo tráfego automóvel. Ainda assim, numa primeira análise dos dados disponíveis, o responsável da ZERO estima que a fermentação entérica, proveniente do gado bovino, representa o equivalente a cerca de quatro por cento das emissões anuais de carbono.

Em causa está o processo digestivo dos herbívoros ruminantes, que acontece também em ovelhas e cabras, por exemplo, e que leva à produção e libertação de metano. Este gaz é considerado um dos grandes responsáveis pelo efeito de estufa.

Além da redução do consumo, até porque “segundo a Organização Mundial de Saúde comemos carne a mais”, podemos também “escolher raças autóctones ou gado que é criado através de regimes de produção mais extensiva”, afirma.

 

5. Aplicar os 3 Rs: Reduzir, reutilizar, reciclar. “Colocar estes ‘três Rs’ na prioridade certa é absolutamente crucial”, sublinha Francisco Ferreira. A associação a que preside defende que deveria haver recolha de lixo porta-a-porta e que quem produz mais lixo e recicla menos deveria pagar mais por isso. Actualmente, estima-se que a taxa de reciclagem em Portugal se situa apenas em cerca de 30%.

“Se eu reciclar e o meu vizinho não reciclar, deveríamos ter tratamento diferenciado, o que hoje não acontece. Além disso, as empresas também deveriam ser incentivadas a fabricar produtos mais sustentáveis.”

A fruta da época e outros produtos locais deveriam ser também uma aposta dos consumidores, uma vez que “muitas das emissões [de carbono] estão associadas à compra de produtos que não são de cá.” É importante ter em atenção os materiais usados no fabrico e a viagem que estes bens fazem.

[divider type=”thin”]Saiba mais.

A reflorestação é outra das medidas que tanto cientistas como ambientalistas consideram prioritária, uma vez que as florestas têm um papel muito importante na absorção do carbono que é libertado na atmosfera. Consulte a Wilder e recorde alguns dos projectos e estudos ligados a este tema.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.