Cinzentinha (Leptotes pirithous). Foto: Renata Santos

De que se alimentam as borboletas?

Patrícia Garcia-Pereira, investigadora do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), explica o que comem afinal estes insectos tão especiais.

Em Portugal, são conhecidas 135 espécies de borboletas diurnas e cerca de 2.600 espécies de borboletas noturnas, também conhecidas por mariposas.

Todos estes insectos, que pertencem à ordem dos Lepidópteros, comem alimentos diferentes ao longo da vida. “Depende do estádio de desenvolvimento em que se encontram”, explica Patrícia Garcia-Pereira.

Assim, no estádio imaturo, quando ainda são lagartas, “as borboletas têm mandíbulas: cortam, mastigam e alimentam-se de plantas”. Algumas espécies comem de todas as plantas em geral; outras têm preferências, como acontece com a lagarta da borboleta-cauda-de-andorinha (Papilio machaon), que gosta de folhas de arruda, funcho e salsa, embora coma muitas outras. Já a lagarta da borboleta atalanta (Vanessa atalanta) prefere urtigas e parietária. Ambas podem ser encontradas em muitos locais, incluindo parques e jardins urbanos.

Lagarta da borboleta atalanta (Vanessa atalanta). Foto: Albano Soares
Borboleta atalanta (Vanessa atalanta). Foto: Rui Félix
Lagarta da borboleta-cauda-de-andorinha (Papilio machaon). Foto: Rui Félix

Mas há também borboletas, chamadas de monófagas, que nesta fase da vida dependem de uma única espécie botânica para sobreviver. Por exemplo, a borboleta-do-medronheiro (Charaxes jasius) alimenta-se apenas de medronheiros e por isso só é encontrada onde se vêem estas plantas.

Todavia, nem só de plantas vivem estes insectos. Algumas borboletas recorrem a outros alimentos, como é o caso das traças – um dos grupos dentro do conjunto mais vasto das borboletas noturnas – que quando ainda lagartas podem comer roupas para matar a fome. “A roupa é constituída por fibras vegetais, ou seja, as nossas roupas são para os outros animais mais um recurso orgânico, que pode ser aproveitado como alimento”, indica a investigadora.

Borboleta nocturna Autographa gamma. Foto: Rui Félix
Borboleta nocturna Rhodometria sacraria. Foto: Albano Soares

Mais tarde, quando atingem o estádio adulto após a fase de crisálida ou pupa, as borboletas têm “uma transformação completa da fisiologia e anatomia”, incluindo “uma armadura bucal totalmente diferente.” É nesta altura que ganham uma espirotromba ou probóscide: “Uma espécie de palhinha capaz de enrolar e desenrolar, que utilizam para sugar líquidos, especialmente néctar das flores.”

Mas nem sempre é assim, ressalva Patrícia Garcia-Pereira. “Existe um pequeno grupo de borboletas nocturnas muito antigas que conservam mandíbulas no estado adulto, alimentando-se de musgos e líquenes”.

É também quando já adultas que as borboletas desempenham um papel importante como polinizadores: “São uma importante ordem de insectos, entre outras, responsável por transportar o pólen dos órgãos masculinos das flores para os femininos, permitindo assim a fertilização dos ovários e a consequente produção de frutos.”

Cinzentinha (Leptotes pirithous). Foto: Renata Santos
Azul-comum (Polyommatus icarus). Foto: Albano Soares

Uma espécie interessante que pode ser encontrada em cidades – incluindo no Jardim Gulbenkian – é a borboleta-esfinge-colibri (Macroglossum stellatarum). Apesar de pertencer ao grupo das mariposas, costuma voar durante o dia. Com a sua probóscide muito comprida, alimenta-se do néctar das flores enquanto voa batendo rapidamente as asas, fazendo lembrar um pequeno colibri, ave típica das Américas.

Borboleta-esfinge-colibri (Macroglossum stellatarum). Foto: IronChris Wiki Commons

Sendo no geral tão diferentes dos humanos, seriam de esperar diferenças grandes entre o nosso sistema digestivo e o das borboletas. Mas na verdade, embora com estrutura e formas diferentes, cumpre as mesmas funções nos dois casos. “Numa borboleta adulta, após a ingestão do alimento pela espirotromba, este já sofre a ação de enzimas libertadas por glândulas salivares ou labiais, passa posteriormente pela faringe, esófago, papo, ventrículos até chegar ao intestino.” O que é aproveitado transforma-se em nutrientes, o resto é eliminado como excreções.


Um Naturalista no Jardim Gulbenkian

Ao longo do ano, a cada mês, a revista Wilder desvenda-lhe alguns dos fenómenos que estão a acontecer no Jardim Gulbenkian e no mundo natural.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.