Jovens portugueses e estrangeiros recuperam a natureza em Estarreja

Está a decorrer em Estarreja até 5 de Agosto o sexto campo internacional de voluntariado ambiental da associação BioLiving. Até agora, esta iniciativa já recebeu mais de 140 jovens.

 

Vinte jovens dos 18 aos 30 anos – 12 dos quais estrangeiros, vindos de Espanha, França, Itália, Hungria, Alemanha e Grécia – estão a recuperar a natureza em duas zonas do concelho de Estarreja.

De 25 de Julho a 5 de Agosto, os trabalhos decorrem em dois locais: na freguesia de Canelas, onde estão a ser recuperados ecossistemas ribeirinhos e património cultural na “micro-reserva natural” gerida pela BioLiving, e nos percursos do BioRia.

 

 

Estes 20 jovens estão a remover espécies exóticas invasoras, a instalar abrigos para a fauna, a promover habitat favorável para anfíbios, insetos saproxílicos e micromamíferos, a construir um charco para a vida selvagem e a instalar “cercas” em madeira morta para retenção da humidade e prevenção da erosão das margens dos cursos de água.

Os trabalhos na “micro-reserva natural” gerida pela BioLiving – coletividade de defesa do ambiente sediada em Albergaria-a-Velha – vão beneficiar espécies como a salamandra-lusitânica, o tritão-de-ventre-laranja, o lagarto-de-água, a rã-de-focinho-pontiagudo, a gineta, o texugo e a raposa e ainda o rato-do-campo, o musaranho-de-dentes-brancos e muitas aves.

 

Micro-reserva natural gerida pela BioLiving

 

Estas espécies vivem naquela micro-reserva de cerca de dois hectares, onde existe um núcleo de carvalhos de grande importância para a reprodução da vaca-loura (onde anualmente se vêem dezenas de indivíduos), um bosquete autóctone plantado pela BioLinving em 2016, flora ribeirinha nativa e onde abunda a gilbardeira, espécie protegida.

Mas este campo internacional de voluntariado não é só trabalho. Entre as actividades há, por exemplo, oficinas de observação de fauna.

“Temos voluntários com muitos backgrounds diferentes. Neste campo temos jovens de química, matemática, medicina, ciências políticas, design, comunicação, ciências ambientais e ecotoxicologia, muitos desconhecem os fundamentos da conservação da natureza, ou a nossa biodiversidade”, explicou Milene Matos, da BioLiving, à Wilder.

 

 

Nestas oficinas, os voluntários vão ver as espécies e os métodos adotados na sua observação, monitorização ou investigação. “Vamos para campo e ensinamos a observar aves ou insetos, capturamos e mostramos anfíbios, detetamos morcegos por ultrassons e ajudamo-los a interpretar o que estão a ouvir, demonstramos métodos de seguimento de mamíferos carnívoros (por exemplo, identificação de pegadas e colocação de armadilhas fotográficas) ou de captura de micromamíferos com armadilhas específicas”, exemplificou Milene Matos.

“São atividades que revelam a fauna habitualmente ‘escondida’ e que resultam no ‘maravilhamento’ dos participantes e numa melhor perceção dos desafios e necessidades da conservação.”

Os voluntários são liderados por cinco biólogos da associação que também lhes mostram “um pouco do melhor que o nosso país tem para oferecer. Da gastronomia às paisagens, da cidade anfitriã às praias e à ria de Aveiro”.

 

Gilbardeira (Ruscus aculeatus). Foto: John Redmond/WikiCommons

 

Por causa da Covid-19, a BioLiving e o município de Estarreja “aceitaram o desafio de adaptar todos os trabalhos e dinâmicas a uma situação de distanciamento, higiene e segurança máximas, respeitando criteriosamente todas as normas recomendadas pelo IPDJ e Direcção-Geral de Saúde”.

Este é o sexto campo organizado pela BioLiving, depois de campos de voluntariado organizados no concelho-sede, na Mealhada e em Lousada.

“O nosso primeiro campo foi realizado em 2017, em Lousada” e centrou-se na recuperação ecológica da Mata de Vilar, um carvalhal com 14 hectares, explicou Milene Matos. “Ainda hoje é uma referência para nós, porque foi onde aprendemos a coordenar, gerir e ter melhor noção das implicações logísticas e humanas desde tipo de campos.”

Em 2018, o campo de voluntariado decorreu na Pampilhosa (Mealhada) e em Lousada. E em 2019 foi realizado em Albergaria-a-Velha e, mais uma vez, em Lousada.

Este ano está previsto mais um, em Setembro, em Lousada.

 

Chapim-azul. Foto: Ann/Pixabay

 

“Estes campos são fundamentais como contributo para a resolução de um determinado problema ambiental de escala local, mas, principalmente, como forma de materializarmos a nossa missão educativa”, comentou a responsável. “Por estarmos 12 dias, 24 horas/dia com estes jovens, temos um enorme impacto na sua formação individual (…) Já são vários os jovens que, não sendo da área da ecologia, mudaram as suas carreiras e o “propósito da sua vida”, direcionando-os para a conservação da natureza.”

“No total já recebemos mais de 140 jovens, alguns vindos de muito longe, como da China, México e Rússia.” “Estes jovens têm a nossa admiração, por dedicarem as suas férias ao trabalho ambiental”.

Este campo de voluntariado conta com o apoio da autarquia estarrejense e do Instituto Português do Desporto e Juventude, I.P. (IPDJ).

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.