Garça-branca-grande. Foto: Dori/Wiki Commons

Outrora rara, a garça-branca-grande já faz parte do Inverno em Portugal

Portugal tem mais de 350 garças-brancas-grandes invernantes, descobriu o primeiro censo à população invernante desta espécie outrora raríssima no nosso país, feito por 168 voluntários.

 

Tempos houve em que para ver uma garça-branca-grande (Ardea alba ou Casmerodius albus) era preciso sair do país e entrar Europa adentro. Mas nos últimos 40 anos, esta ave tem vindo a aproximar-se, tornando-se mais frequente e adensando o batalhão de aves que escolhem Portugal para passar o Inverno, em busca de alimento.

 

Garça-branca-grande. Foto: Dori/Wiki Commons

 

A 20 e 21 de Janeiro, 168 voluntários contaram entre 347 e 374 garças-brancas-grandes nos sapais, valas, salinas, barragens e açudes de Norte a Sul do país, preenchendo uma lacuna de conhecimento sobre a distribuição das espécies.

“Esperava encontrar algumas centenas de aves, por isso estes números estão dentro dessa ordem de grandeza”, conta à Wilder Gonçalo Elias, um dos promotores deste Censo e responsável pelo portal Aves de Portugal.

Os distritos onde foram encontradas mais aves foram Setúbal (89 a 98 aves), Coimbra (68 a 69) e Lisboa (40 a 44). A seguir surge Aveiro (com 37 a 41), Évora (29 a 30), Beja (25 a 28) e Santarém (25 a 27).

“Já sabíamos que o Mondego tinha muitas (garças); Aveiro e a Lezíria do Tejo também não foram surpresa”, acrescenta o responsável.

Com um máximo de 10 garças surgem os distritos de Portalegre (8 a 10), Faro (9), Castelo Branco (7), Leiria (6 a 7), Viana do Castelo (3) e Guarda (1). Os distritos de Vila Real, Porto, Bragança e Braga não registaram nenhuma ave desta espécie.

 

Foto: Skeeze/Pixabay

 

O Alentejo foi a região com pior cobertura por este censo, especialmente Beja e Portalegre. Isto porque, se no Litoral as garças escolhem lagoas costeiras, valas com algum caniço ou campos de restolho de arroz, no Interior procuram as milhares de pequenas barragens e açudes, ocorrendo uma ou duas aves em cada local.  “Com esta situação e dispersão é impossível prospectar tudo”, nota Gonçalo Elias, acrescentando que os voluntários conseguiram visitar cerca de 50 açudes e barragens. “Fizemos um grande esforço para conseguir uma boa amostragem mas no Alentejo a cobertura pode estar muito incompleta. Os números podem, na realidade, ser muito superiores.”

Ainda assim, estes números “espelham a abundância da espécie em Portugal” que ocorre, especialmente, no Litoral Centro, entre Aveiro e Setúbal. “Foi interessante termos conseguido dados sobre uma coisa para a qual apenas tínhamos palpites.”

Para Gonçalo Elias, o objectivo deste esforço de registo de espécies foi “ter uma primeira noção da dimensão da população invernante destas garças”. Cumprido o objectivo, ainda é cedo para saber se o censo se vai repetir. “Ainda não falámos sobre isso, ainda não tomámos nenhuma decisão. Mas se se repetir, gostávamos de melhorar a cobertura no Alentejo, uma vez que podem ter ficado de fora 50, 100 garças.”

Até aos anos 1990, as garças-brancas-grandes, que viajam da Europa Central para aqui passar o Inverno, eram uma raridade em Portugal. “A partir dessa década começaram a aparecer uma ou duas e hoje são bastante frequentes”, recorda Gonçalo Elias. Este é resultado da expansão que a espécie regista na Europa, com nidificação já confirmada em Espanha. “Lembro-me que tive de ir à Hungria para ver garça-branca-grande. Hoje, a espécie já nidifica em Espanha e na França”, acrescenta. “É de prever que comecem a criar regularmente em Portugal, mais ano menos ano.”

A garça-branca-grande tem um estatuto de Pouco Preocupante na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). A população europeia está estimada em entre 20.700 e 34.900 casais, segundo dados da BirdLife International de 2015.

 

[divider type=”thick”]Agora é a sua vez.

Aqui ficam algumas características da garça-branca-grande, disponibilizadas por Gonçalo Elias, que o podem ajudar a reconhecer esta ave:

Nome científico: Ardea alba ou Casmerodius albus (a espécie tem estes dois nomes científicos, utilizados consoante a autoridade em questão)

Comprimento: 85 – 100 centímetros

Envergadura da asa: 145 – 170 centímetros

Principais características da garça-branca-grande:
– tamanho muito grande, semelhante ao de uma garça-real (Ardea cinerea)
– plumagem totalmente branca
– bico longo e amarelo

Locais onde é mais fácil de a observar: A garça-branca-grande ocorre quase sempre perto de água. Procure este tipo de locais e poderá ter “sorte”: zonas húmidas costeiras (estuários, rias e lagoas); campos agrícolas inundados, como restolhos de arroz; e zonas húmidas interiores, como pauis e albufeiras.

As outras garças que podem causar confusão na identificação:

– garça-branca-pequena (Egretta garzetta): mas esta espécie apresenta bico preto e não amarelo

– garça-boieira (Bubulcus ibis): porém esta espécie é muito mais pequena, a plumagem apresenta frequentemente tons alaranjados e o seu bico é muito mais curto, além de que ocorre frequentemente longe de água.

Consulte aqui as descrições mais detalhadas de cada uma das espécies para compreender melhor as diferenças: Garça-branca-grandeGarça-branca-pequenaGarça-boieira.

Como procurar: Uma das melhores formas é procurar os seus locais de alimentação, onde as garças passam uma grande parte do dia.

A que soa uma garça-branca-grande: descubra aqui as vocalizações desta grande ave.

Onde inserir os seus registos: plataforma Biodiversity4all e eBirds Portugal.

 

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.