Um ano de campanha tirou do Sado mais de 21 toneladas de lixo

Há um ano que, todos os meses, dezenas de voluntários cuidam do Estuário do Sado. Ao todo, hoje há menos 21,5 toneladas de lixo naquela importante área natural. Na passada Sexta-feira Santa, a acção que celebrou um ano de “Mariscar Sem Lixo” juntou 67 voluntários. Mais de mil mariscadores foram alertados para os perigos de deixar plásticos na areia.

 

 

Para muitos é tradição apanhar lingueirão ou peixe-navalha (Solen marginatus) no Sado na Sexta-feira Santa. Este ano, pelo menos 1.020 pessoas estiveram a mariscar em nove locais do estuário, segundo a Ocean Alive, entidade que organiza a campanha “Mariscar Sem Lixo”.

“Um dos problemas desta actividade são as milhares de embalagens de sal que, ao longo de décadas, foram deixadas na maré”, explica em comunicado a Ocean Alive. “A actividade da mariscagem é uma importante fonte de contaminação por plástico do estuário.”

Ao longo do último ano, através de acções mensais, a Ocean Alive tem promovido a visão “de um estuário do Sado limpo e mantido por todos”. No total já participaram 939 voluntários que recolheram 21,5 toneladas de lixo e quase 29.000 embalagens de sal. Mais de 1.300 mariscadores já foram sensibilizados.

Na Sexta-feira Santa passada, a 14ª acção da campanha, 67 voluntários estiveram a sensibilizar os mariscadores, oferecendo um saco para que estes colocarem as embalagens de sal vazias, e a apanhar o lixo que se encontrava nas margens do estuário.

Foram recolhidas 2.078 embalagens de sal e 73 sacos de lixo, acumulado ao longo de décadas nas margens do Sado. Destes, 32 são resíduos para reciclagem, sobretudo garrafas e embalagens de plástico.

A campanha “Mariscar Sem Lixo” faz parte do projecto “Guardiãs do mar”, que venceu o prémio Ideias de Origem Portuguesa 2016 da Fundação Calouste Gulbenkian e o prémio Terre de Femmes da Fundação Yves Rocher. Tem o apoio dos quatro municípios do estuário (Setúbal, Palmela, Grândola e Alcácer do Sal).

As próximas acções da campanha serão a 17 de Maio, com 300 estudantes, e a 21 de Maio, aberta à participação do público.

Entre 50 e 80% do lixo nas zonas costeiras do planeta é lixo plástico, segundo um relatório sobre plásticos nos oceanos publicado em 2014 pela União Internacional de Conservação da Natureza (UICN), através do seu Programa Global Marinho e Polar. “A sua presença foi detectada desde as profundezas dos oceanos às zonas costeiras de todos os continentes.” Os tipos de lixo mais encontrados são tampas de garrafas, garrafas, sacos, embalagens, copos, pratos e talheres e palhinhas.

No caso do Estuário do Sado, um dos grandes problemas é o das embalagens de sal usadas para apanhar o lingueirão e que são deixadas nas areias. Com o tempo, as embalagens vão-se deteriorar e transformar-se em pequenas partículas de plástico que acumulam poluentes tóxicos e que acabam por ser ingeridas por peixes, mariscos e golfinhos. Estas partículas – que vão persistir durante décadas ou séculos – “poderão ferir, asfixiar, causar úlceras ou a morte de animais marinhos”, salienta a organização Ocean Alive. Além disso, “parte das embalagens vem dar às praias de Setúbal, Tróia e Arrábida, constituindo também um risco para a saúde pública”.

A Ocean Alive é uma organização sem fins lucrativos que pretende “transformar comportamentos para a protecção do oceano, nomeadamente das pradarias marinhas do estuário, através da educação marinha e do envolvimento das comunidades costeiras locais”.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Raquel Gaspar, da Ocean Alive, ganhou este ano o prémio nacional Terre de Femmes, atribuído pela Fundação Yves Rocher. Leia a entrevista que esta bióloga deu à Wilder e conheça o projecto que quer transformar pescadoras em guardiãs do Estuário do Sado.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.