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Britango. Foto: Bruno Berthemy / VCF

Faia já regressou ao vale do Douro. E foi uma boa surpresa

Desaparecida em África sem dar notícias há meio ano, Faia, uma fêmea de abutre-do-Egipto seguida por um emissor GSM, regressou agora à zona do Douro. Para já, esta é uma história com final feliz.

 

Os abutres-do-Egipto (Neophron percnopterus), também conhecidos por britangos, são a espécie mais pequena de abutres na Europa. As faces são amareladas e as caudas longas. Têm uma envergadura de asas que vai dos 1,55 aos 1,70 metros e podem medir até 65 centímetros de comprimento.

Das cinco aves seguidas através de emissores GSM que tinham partido para as zonas de invernada em África no ano passado, todas regressaram agora em segurança.

Rupis, Faia e Douro tinham sido marcados em 2016 e 2017 com minúsculos aparelhos no Parque Natural do Douro Internacional, no lado português, e também Batuecas e Huebra, a quem tinham feito o mesmo do outro lado da fronteira.

 

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Marcação de um abutre-do-egipto com emissor GSM. Foto: Life Rupis

 

Em causa está o projecto luso-espanhol Life Rupis – Conservação do britango e da águia-perdigueira no vale do rio Douro (2015-2019), financiado por fundos comunitários e pela fundação MAVA, que decorre nas áreas protegidas do Douro Internacional e Vale do Rio Águeda e dos Arribes Del Duero.

O emissor transportado por Faia deixou de transmitir logo no início de Setembro passado, pouco depois de ter chegado ao continente africano, no norte da Argélia, recorda a Vulture Conservation Foundation (VCF). Esta fundação é um dos parceiros do Life Rupis, coordenado pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA).

“Felizmente, todas as aves estão agora a transmitir dados regularmente e parecem estar com um comportamento normal”, avança uma nota publicada no site da VCF.

Porque não havia informações de Faia? Sabe-se agora que “passou o período de Inverno em áreas muito remotas no sul da Mauritânia, onde não havia o sinal necessário pra transmitir os dados [de localização] até à unidade de ‘tracking’.”

 

Um novo ano, as mesmas datas

Os abutres-do-Egipto que nidificam na Península Ibérica costumam passar os meses mais frios do ano a sul do deserto do Saara, numa região onde a segurança é escassa e as comunicações muito difíceis. Na verdade, ainda ninguém sabe o que acontece a estes abutres em África.

Mas o regresso de Faia não foi o único sinal de alívio. Rupis, seguido desde 2016, tinha estado desta vez desaparecido dos mapas “durante um longo período”, também por falta de sinal. Foi aliás quem tomou a rota mais longa, perfazendo um total de 4.032 quilómetros.

 

mapa com as rotas dos 5 britangos
Imagem: VCF

 

No ano passado, outros dois abutres-do-Egipto que estavam a ser seguidos no âmbito do Life Rupis nunca chegaram a regressar ao Douro – Bruçó e a fêmea Poiares – e ninguém sabe o que lhes aconteceu.

Já as datas de chegada foram muito semelhantes a 2018, com apenas um ou dois dias de diferença e passagem obrigatória pelo Estreito de Gibraltar – como acontece com todos os abutres-do-Egipto que nidificam na Península Ibérica. Douro passou o estreito, por exemplo, a 22 de Fevereiro.

Faia foi mais uma vez a excepção, com um calendário diferente: partiu do sul da Mauritânia uma semana mais tarde que em 2018, mas fez a viagem mais depressa. Chegou ao Douro três dias antes do que na vez anterior.

 

É agora, Rupis?

Os cinco abutres, tal como os cerca de 135 casais reprodutores desta espécie nos dois lados da fronteira do Douro Internacional, estão agora em época de nidificação. Esta região da Península Ibérica tem uma das maiores populações de abutres-do-Egipto de toda a Europa.

 

britango frente a um buraco numa arriba
Abutre-do-Egipto nas arribas do Douro. Foto: LIFE Rupis

 

“A época de reprodução de 2019 será particularmente interessante porque o sub-adulto Rupis está agora a entrar no sexto ano do calendário e poderá ter atingido a maturidade e tentar reproduzir-se”, recorda a VCF.

A confirmar-se a maturidade sexual, Rupis terá de encontrar uma companheira – ou um companheiro, pois ainda não se sabe qual é o sexo desta ave. Provavelmente, farão ninho numa reentrância das altas arribas que acompanham o Douro junto à fronteira, reunindo raminhos e pedaços de lã de ovelha, e terão aí as suas crias.

E se tudo correr bem, durante os próximos anos voltarão a encontrar-se no mesmo local no início de cada Primavera, como acontece com a maioria dos abutres do Egipto.

 

[divider type=”thin”]Saiba mais.

Recorde aqui o que se sabe da viagem destes abutres entre África e a Península Ibérica realizada em 2018.

 

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.