Rela-comum. Foto: Bernard Dupont/Wiki Commons

Rela-comum, um caso raro de sobrevivência depois das glaciações

Ao contrário do que aconteceu com outros anfíbios, as pequenas relas-comuns conseguiram sobreviver às glaciações do Quaternário e hoje continuam a manter elevados níveis de diversidade genética, descobriu um novo estudo científico.

 

A rela-comum (Hyla molleri) é uma espécie amplamente distribuída na Península Ibérica e é uma das 19 espécies de anfíbios que vivem em Portugal.

Apesar do seu pequeno tamanho (raramente ultrapassa os cinco centímetros), tem maior tolerância ao frio do que outros anfíbios. Na verdade, há populações que vivem ao nível do mar, nas costas atlântica e cantábrica, e outras a mais de 2.000 metros de altitude no Sistema Central.

Ao contrário do que aconteceu com outros anfíbios, as relas-comuns conseguiram sobreviver às glaciações do Quaternário e hoje continuam a manter elevados níveis de diversidade genética, descobriram investigadores da Universidade de Évora e do Museu Nacional de Ciências Naturais de Madrid (MNCN-CSIC), segundo um estudo publicado no final de Janeiro na revista Journal of Biogeography.

 

Rela-comum. Foto: David Perez/Wiki Commons

 

As extinções causadas pelas glaciações não ocorreram apenas no Norte da Europa, mas afectaram também populações do Norte de Espanha. Houve períodos especialmente desfavoráveis durante o último período glaciar, há uns 20.000 anos, que afectaram espécies como a salamandra-de-costelas-salientes  (Pleurodeles waltl) ou o sapo-de-unha-negra (Pelobates cultripes).

“Com o passar do tempo, ambas as espécies conseguiram recolonizar estas zonas, mas isso foi feito às custas de uma forte perda de diversidade genética nas novas populações”, explica, em comunicado, Martínez-Solano, um dos autores do artigo científico. “De facto, comprovámos que as populações do Sul de Espanha mostram, geralmente, uma diversidade genética muito mais elevada do que as que habitam no Norte.”

Pelo contrário, a rela-comum mantém elevados níveis de diversidade genética em zonas tanto a Norte como a Sul da sua área de distribuição e não parece que as alterações climáticas dos últimos 140.000 anos na Península Ibérica tenham afectado a espécie, dizem os investigadores.

Aparentemente, a sua maior tolerância a condições frias e a sua capacidade de dispersão, em comparação com outras espécies de anfíbios, ajudaram a rela-comum a sobreviver com êxito nas últimas glaciações no seu refúgio glaciar ibérico.

“Esta pequena rela evitou grandes extinções, assim como perdas de diversidade genética, que pioraram a situação actual de outros anfíbios de ambientes mediterrânicos”, conclui Martínez-Solano.

 

Rela-comum. Foto: Bernard Dupont/Wiki Commons

 

Um dos factores que condiciona a resposta das espécies às alterações climáticas é a sua capacidade de dispersão. Assim, grupos como os anfíbios – que têm os seus ciclos vitais completos em áreas de poucos quilómetros quadrados – são mais sensíveis a estas alterações, já que, por regra, não são capazes de migrar para outras áreas com climas mais favoráveis à velocidade necessária.

De facto, a sua resposta como espécie depende em grande medida da capacidade de dispersar e de colonizar novas áreas durante períodos de clima favorável.

A escassa mobilidade de algumas espécies, entre outros factores, está por detrás de muitos dos episódios generalizados de extinções que ocorreram durante os períodos mais frios na maior parte da Europa Central.

 

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Estas são as 10 espécies de anfíbios e répteis em Portugal que são mais vulneráveis às alterações climáticas.

 

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Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.