Foto: Marcello Consolo/Wiki Commons

Abra os ouvidos e ajude os cientistas a encontrar as cigarras de Portugal

O projecto Cigarras de Portugal apela aos portugueses que gravem o som ou façam vídeos quando ouvirem o canto de uma cigarra e partilhem o resultado com esta equipa de investigadores.

O objectivo é saberem qual a situação das 13 espécies de cigarras conhecidas em Portugal. Basta gravar o som de uma cigarra e registar qual é a sua localização GPS, recorrendo de preferência à plataforma Biodiversity4All.

Mais do que as cores ou o formato de cada cigarra, uma vez que há várias espécies muito semelhantes, é a forma como cantam que ajuda a diferenciá-las. Estes registos sonoros permitem aos cientistas desenharem o mapa de distribuição de cada espécie e fazerem comparações com anos anteriores.

Cigarra-comum (Cicada orni). Foto: Marcello Consolo/Wiki Commons

Logo a partir de Maio, mas com mais intensidade nos meses de Verão, as cigarras emergem do solo onde se desenvolveram durante vários anos como ninfas, enquanto se alimentavam da seiva das árvores através das raízes. Em Portugal estes insectos ficam debaixo de terra cerca de três anos, mas nos Estados Unidos, por exemplo, existem espécies que chegam a permanecer como ninfas durante 17 anos ao todo.

Depois de emergirem do solo, os machos procuram um local mais alto – pode ser o caule de uma planta ou o topo de uma árvore, dependendo das espécies – e cantam sem parar ao longo de várias semanas. O objectivo é atrair as fêmeas para o acasalamento.

Esta campanha de ciência cidadã, em que os cientistas contam com a ajuda dos cidadãos comuns pois não conseguem chegar a todo o lado, começou há dois anos. “Em 2019 recebemos centenas de observações, mas poucas das espécies menos conhecidas”, explica Paula Simões, responsável pelo projecto e investigadora do cE3c – Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c, ligado à Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

No ano seguinte, apesar da pandemia e do confinamento, o número de registos aumentou substancialmente, em especial na plataforma Biodiversity4All. Das 64 contribuições recebidas desta forma na campanha de 2019, subiram para 313 no ano passado – incluindo já espécies mais difíceis de observar, adianta por seu turno Vera Nunes, que também faz parte do projeto e é investigadora do cE3c.

Ainda assim, a equipa precisa de mais dados sobre algumas das espécies mais raras no país, e por isso mais difíceis de ouvir. É o caso da cigarra-verde-do-Alentejo (Euriphara contentei), considerada a mais ameaçada de Portugal. Com apenas 17 milímetros de comprimento – ou seja, pouco mais de 1,5 centímetros – este pequeno insecto tem apenas umas poucas populações conhecidas na região que lhe dá o nome.

Cegarrão-abelhudo (à esq.) (Hilaphura varipes) e cigarra-verde-do-Alentejo (Euriphara contentei). Foto: Vera Nunes

“Quando em 2019 visitámos os poucos locais onde existe esta cigarra, percebemos que os números eram extremamente reduzidos. Em 2020 não houve registos desta espécie por conta da pandemia, mas em Junho de 2021 regressámos aos locais e registámos uma melhoria importante. Agora queremos perceber se estas flutuações são cíclicas e se estão ou não associadas a variações climáticas ou mudanças no habitat”, afirma Vera Nunes.

Outro exemplo é o cegarregão-abelhudo (Hilaphura varipes): também uma espécie rara em Portugal, da qual existem alguns registos no Alentejo, Lisboa e Algarve, e que os cientistas procuram localizar através desta campanha.

De olhos no futuro

É normalmente em Outubro que em Portugal se ouvem as últimas cigarras da estação, mas é possível ir enviando registos para o projecto, mesmo que captados anteriormente, ao longo do ano todo. A equipa está também a fazer parcerias com diferentes associações, que a nível local ajudam com a recolha de sons. Toda esta informação recebida ajuda não só a fazer o retrato da situação actual das 13 espécies de cigarras, mas também a saber como estão a evoluir e a prever o futuro. Até porque esta campanha de ciência cidadã está apenas no início.

“Para conseguirmos respostas a nível científico, é importante mantermos esta monitorização durante vários anos para conseguirmos respostas. Para avaliarmos os impactos das alterações climáticas, por exemplo, vamos precisar de dados recolhidos ao longo de 10 a 20 anos”, avisam as duas investigadoras.


Saiba mais.

Descubra como se chamam e identificam as 13 cigarras de Portugal, a começar pelas seis espécies para as quais este projecto de ciência cidadã precisa de mais registos.

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Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.