Cientistas usam saquinhos de chá para estudar decomposição das folhas no solo

A Ria de Aveiro e a Companhia das Lezírias (Benavente), em Portugal, fazem parte dos mais de 300 locais no planeta onde está a decorrer este projecto internacional. Os cientistas revelam agora os primeiros resultados.

 

Mais de 250 investigadores de 190 instituições científicas de todo o mundo estão a trabalhar no projecto TeaComposition para descobrirem como é que as condições do ambiente influenciam a decomposição das folhas mortas de plantas caídas no solo, feita com a ajuda de microorganismos, fungos e bactérias.

Este é um processo muito importante já que é ele que permite a reposição dos nutrientes no solo, fundamentais para as plantas.

O projecto, no qual Portugal participa no âmbito da rede LTSER (Long-Term socio-ecological research), é o primeiro a aplicar a mesma metodologia nos quatro cantos do planeta.

Milhares de saquinhos de chá foram enterrados no Verão de 2016 em 336 regiões do planeta em todos os continentes, menos na Antártida, representando ambientes com diferentes condições de temperatura, humidade e tipo de solo. Em Portugal, os locais experimentais são na Companhia das Lezírias (Benavente) e na Ria de Aveiro.

 

Local experimental na Austrália. Foto: Simon Peter Fox.

 

“Colocando os mesmos dois tipos de chá – verde e rooibos – em diferentes regiões do globo, os investigadores podem analisar como é que diferentes folhas se degradam comparativamente e qual a influência do ambiente”, explica o cE3c – Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa) num comunicado divulgado hoje.

Os primeiros resultados, com a avaliação dos fatores que influenciam a decomposição nos primeiros três meses, foram agora publicados na revista científica Science of the Total Environment.

Uma das conclusões é que o factor mais importante que explica a taxa de decomposição é a composição da folhada, ou seja, da fina camada de folhas mortas que caem no solo, que explica 65% da variabilidade dos resultados a nível mundial.

 

Um dos locais experimentais em Portugal, após a instação dos saquinhos de chá. Foto: cE3c

 

“O efeito do clima é mais ténue, só tem efeito significativo em condições muito desfavoráveis, por exemplo pouca humidade. E o tipo de uso dado ao solo também não mostrou efeitos significativos nesta primeira apreciação dos resultados”, acrescentou Helena Serrano, investigadora do cE3c e coordenadora dos trabalhos de campo desta iniciativa em Portugal.

“No entanto, os próximos resultados, com os dados para a decomposição ao longo de um, dois e três anos, podem revelar que outros fatores se tornam mais prevalentes para explicar a decomposição desta folhada”, salientou a investigadora.

O projeto TeaComposition é coordenado por Ika Djukic (Agência do Ambiente, Áustria) e é patrocinado pela UNILEVER, a empresa que produz o chá Lipton, que fornece os lotes de chá utilizados nas experiências feitas por todo o mundo.

Em colaboração com a equipa internacional, os investigadores estão agora a tratar os dados relativos às medições que realizaram em Junho de 2017, quando a experiência completou um ano. As medições seguintes estão previstas para Junho de 2018 e Junho de 2019, momento em que se prevê o final da fase experimental do projeto.

“Fatores como as alterações climáticas, ou o excesso de fertilização, podem contribuir para alterar as taxas de decomposição, por isso é muito importante estudarmos este processo não só à escala local como também à escala global”, explicou Cristina Branquinho, investigadora do cE3c.

“Ao utilizarmos saquinhos de chá iguais em todo o mundo garantimos que o que estamos a ver depende apenas do solo e do clima, numa escala global.”

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.