Começou a época de 2017 de libertações de linces em Portugal

O macho Noudar e a fêmea Niassa foram libertados nesta manhã nos campos do Vale do Guadiana e dão, assim, início à terceira época de reintroduções de lince-ibérico em Portugal. Vão juntar-se e reforçar o núcleo de 12 linces que já têm território naquela região do Alentejo.

 

Noudar e Niassa fazem parte do esforço conservacionista que quer recuperar a distribuição histórica de uma espécie que se estima viver na Península Ibérica há, pelo menos, 27.000 anos. Nasceram os dois no ano passado nas instalações do Centro Nacional de Reprodução em Cativeiro em Silves, estrutura onde nasceram e sobreviveram 10 linces em 2016, e não tiveram contacto directo com humanos. Têm um comportamento selvagem.

 

Sala de video-vigilância do Centro Nacional de Reprodução de Lince-ibérico, em Silves. Foto: Joana Bourgard/Wilder

 

“A equipa de técnicos e tratadores em Silves acompanhou o seu nascimento e evolução indiretamente, através de um sistema de câmaras de videovigilância, avaliando as suas capacidades com base numa experiência de mais de cinco anos de observação contínua de linces e crias”, segundo um comunicado do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

Os linces nascidos em cativeiro que são considerados aptos para viverem na natureza são preparados para isso desde o início, seguindo um protocolo estabelecido no Programa Ex-situ ibérico. Por exemplo, “são fornecidos coelhos-bravos a estes animais para que as suas aprendizagens de caça fiquem consolidadas”.

Antes de serem libertados, os animais são vacinados e alvo de análises à sua condição sanitária.

Até Março de 2017 serão libertados oito linces no concelho de Mértola, todos nascidos em cativeiro há quase um ano atrás, na rede de cinco centros de reprodução em cativeiro na Península Ibérica. Ao todo,a época de 2017 de reintroduções prevê libertar 40 linces em Portugal e Espanha (Vale de Matachel, Badajoz; Montes de Toledo, Toledo; Sierra Morena Oriental, Ciudad Real e Guadalmellato, e Guarrizas, Jaén).

As libertações em Portugal, mais concretamente no Vale do Guadiana, começaram a 16 de Dezembro de 2014, com Katmandú e Jacarandá. Em Maio de 2016, soubemos que esta fêmea deu à luz as primeiras crias de lince confirmadas na natureza nos últimos 40 anos.

 

Foto: ICNF

 

Até hoje foram reintroduzidos 19 animais no Vale do Guadiana. Destes, 12 já têm territórios estabilizados na área do Sítio Rede Natura 2000 Guadiana. São eles Macela, Jacarandá, Mel, Luso, Katmandu, Mesquita, Lagunilla, Mistral, Malva, Liberdade, Mirandilla e Moreira. Estes indivíduos são monitorizados por uma equipa no terreno através de seguimento rádio e GSM ou de foto-armadilhagem.

Noudar e Niassa foram libertados através de solta dura e não num cercado de adaptação, como foi feito com os linces que iniciaram o processo de reintrodução em 2014 e 2015. Segundo o ICNF, isto acontece porque “já existem linces residentes que vão estimular os novos indivíduos recém-chegados a estabelecer o seu território independente”.

“A dinâmica espacial da espécie é um fator importante para a sua sobrevivência, sabendo-se que os machos sobrepõem o seu território ao de uma ou mais fêmeas, podendo também realizar movimentos dispersivos e exploratórios de longa distância antes de se estabelecerem.”

Os linces que hoje vivem no Alentejo estão, preferencialmente, numa zona que tem entre 15.000 e 20.000 hectares, dentro dos 70.000 da área do Parque Natural do Vale do Guadiana. “É essa a área de maior qualidade para o lince. Há boas densidades de coelho-bravo, há bastante vegetação arbustiva que proporciona abrigos, como estevas, zambujeiros, aroeiras e algumas azinheiras”, descreveu anteriormente à Wilder Pedro Rocha, director do Parque Natural do Vale do Guadiana.

 

Jacarandá e a cria. Foto: ICNF

 

Os locais de solta no vale do Guadiana são também escolhidos de acordo com a colaboração de proprietários e com base nos resultados dos censos sazonais de coelho-bravo, a principal presa do lince, realizados por técnicos, vigilantes da natureza e pessoal afecto às zonas de caça.

Estas ações estão integradas no Projeto “Recuperação da Distribuição Histórica do Lince Ibérico (Lynx pardinus) em Espanha e Portugal (LIFE+10/NAT/ES/000570 – Iberlince) co-financiado pela Comissão Europeia e que reúne 22 parceiros dos quais cinco são portugueses – ICNF, Associação Iberlinx, EDIA, Infra-estruturas de Portugal e Câmara Municipal de Moura. O projecto decorrerá até 2018.

 

[divider type=”thick”]Agora é a sua vez. Saiba o que fazer quando vir um lince.

Ver linces-ibéricos em Portugal já não é assim tão impossível. É preciso estar preparado. Pedro Rocha deixa algumas sugestões que podem ajudar à conservação da espécie.

Se vir um lince deve ter atenção à cor da coleira, já que cada animal reintroduzido traz uma coleira emissora de cor diferente. Por exemplo, a Jacarandá tem uma coleira vermelha. Depois, o Parque Natural do Vale do Guadiana agradece o seu contacto para:

Telefone: 286.612.016

Email: [email protected]

E há que ter muita atenção aos sinais da estrada entre Mértola e Beja. “Os linces estão nessa zona. A sério. Aqueles sinais não são só folclore. Há linces a passar”, salienta Pedro Rocha. Existem mais hipóteses de os encontrar durante os períodos crepusculares (ao amanhecer e ao anoitecer), já que é quando os animais estão mais activos.

Saiba mais aqui sobre o que está a ser feito para preparar as estradas na região do Vale do Guadiana para o lince-ibérico.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Siga a nossa série “Como nasce um lince-ibérico” e conheça os veterinários, video-vigilantes, tratadores e restante equipa do Centro Nacional de Reprodução (CNRLI) em Silves.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.