Apanha mecânica de azeitonas à noite passa a ser ilegal por matar as aves

A colheita mecânica nocturna de azeitonas nos olivais superintensivos “provoca de forma significativa a mortalidade de aves”, concluiu um estudo do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV).

 

O “Estudo técnico para a avaliação de impacto na avifauna resultante da colheita mecânica noturna” foi ordenado pelo Despacho nº 18/2019, de 19 de setembro, ao INIAV, e realizou-se durante a campanha de apanha de azeitona de 2019/2020, recorda um comunicado divulgado esta segunda-feira pelo Ministério do Ambiente.

Este estudo teve a colaboração do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas e da Direção Regional de Agricultura e Pescas do Alentejo. Objectivo? Analisar os impactos das culturas intensivas e superintensivas de olival em áreas de regadio, uma prática que se tem vindo a espalhar em Portugal, especialmente no Alentejo.

As conclusões, que foram entregues ao ICNF, indicam que a apanha mecânica nocturna em olivais superintensivos “provoca de forma significativa a mortalidade de aves”, adianta o mesmo comunicado. Já as medidas de mitigação testadas, concretamente os processos de espantamento ensaiados, mostraram ser “ineficazes”.

Os efeitos desta prática em olivais intensivos e superintendidos já tinham sido por várias vezes questionados por várias associações ambientais, como aconteceu com a Quercus em Outubro passado, mas até agora não tinham produzido uma decisão conclusiva da parte do ICNF.

Na altura, dados a que a Quercus tinha tido acesso davam conta, em apenas duas acções de fiscalização do SEPNA/GNR no Alentejo, de terem sido detectadas 375 aves mortas, fruto da apanha nocturna de azeitona – 140 aves numa das acções de fiscalização (27/12/18) e 235 aves em outra (2/1/19). Algumas das espécies de aves atingidas por esta mortalidade foram o tordo-comum, a milheirinha, o lugre, o pintassilgo-comum, o verdilhão, o tentilhão-comum e a toutinegra.

 

Pintassilgo. Foto: Tony Hisgett/Wiki Commons

 

A associação ambientalista estimava ainda que o problema deve atingir, “numa perspectiva conservadora, pelo menos entre 70.000 e 100.000 aves em território nacional”.

Com base nos dados agora conhecidos através do novo estudo do INIAV, a entidade reguladora vai passar a sancionar a apanha mecânica nocturna em olivais, uma vez que “a perturbação e mortalidade de aves constituem uma infração contraordenacional e penal à legislação em vigor”.

Em causa estão as normas estabelecidas pelo Decreto-Lei nº 140/99 – que transpõe as directivas comunitárias Aves e Habitats, ligadas à conservação da biodiversidade – e ainda o Decreto-Lei nº 316/89, que na lei portuguesa regula a Convenção de Berna (Convenção Relativa à Conservação da Vida Selvagem e dos Habitats Naturais da Europa).

 

Quatro associações suspendem trabalhos à noite

Assim, indica o gabinete do ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, o ICNF vai “intensificar as acções de fiscalização” durante a próxima campanha de apanha de azeitona, que começa no próximo mês de Outubro de 2020 e se estende até Março de 2021. Isto para  “assegurar que não ocorre qualquer prática que possa promover a mortalidade de aves, designadamente a apanha nocturna de azeitona.”

“Cientes da gravidade desta prática nefasta às aves, a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), a Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas e do Crédito Agrícola de Portugal (Confragri), a Casa do Azeite e a Associação de Olivicultores do Sul (Olivum) decidiram suspender a colheita noturna mecanizada da azeitona na próxima campanha, a iniciar em Outubro”, adianta ainda o Ministério.

 

 

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.