troncos de madeira empilhados
Foto: Pixabay

Saiba como os nossos padrões de consumo estão a afectar a natureza noutros lugares

Os alimentos que comemos e os cosméticos que usamos têm impactos negativos sobre a biodiversidade de outras regiões do mundo, mas até que ponto? Uma equipa internacional de investigadores conseguiu agora calcular esses efeitos.

 

A equipa liderada por Henrique Pereira, investigador do CIBIO-InBIO, ligado à Universidade do Porto, decidiu analisar as mudanças no uso de solo e das trocas comerciais entre 2000 e 2011, por todo o mundo, estimando os impactos sobre a biodiversidade e os serviços de ecossistema. Os resultados foram publicados na última segunda-feira, na revista Nature Ecology & Evolution.

Para analisar os impactos na biodiversidade, os cientistas concentraram-se na riqueza de espécies de aves. Quanto aos impactos nos serviços de ecossistema, optaram por investigar o sequestro de carbono, “um serviço de ecossistema chave para mitigar as alterações climáticas”.

Conclusão? Durante os 11 anos analisados, o uso do solo até se tornou mais eficiente, mas esse ganho não chegou para compensar os efeitos do crescimento da população mundial e as mudanças dos padrões de consumo.

É verdade que tanto na Europa Ocidental como na América do Norte, o impacto da agricultura e da indústria florestal (produção de madeira e combustíveis) diminuiu entre 2000 e 2011, admitem os investigadores. Isso terá sido em parte devido à crise financeira de 2007 e 2008, pelo que essa melhoria poderá ser temporária.

Em contrapartida, aperceberam-se de que os produtos consumidos nessas regiões estão a ter cada vez mais efeitos negativos sobre a natureza em pontos distantes do planeta. “Os padrões de consumo de um cidadão médio na América do Norte, Europa Ocidental, Europa de Leste e Médio Oriente estão a conduzir a impactos na biodiversidade de outros lugares”, alertam. “O mesmo acontece com o sequestro de carbono, com excepção da Europa de Leste.”

América Central e do Sul, África e Ásia têm sido as regiões com maiores perdas de biodiversidade, “com uma parte importante da responsabilidade atribuída ao comércio internacional.” Por exemplo, em 2011, cerca de um terço  (33%) dos impactos na biodiversidade na América Central e do Sul e mais de um quarto (26%) desses impactos em África foram causados pelo consumo noutras regiões do mundo.

Os investigadores estimaram também que as actividades agrícola e florestal, entre 2000 e 2011, deverão ser responsáveis pela extinção de 121 espécies de aves no mundo. Em comparação, tendo em conta qualquer acção humana, desde o início do século XVI perderam-se 140 espécies de aves.

Houve ainda um aumento de 6% na perda de carbono sequestrado, para menos 3,4 giga-toneladas por ano, ao longo dos 11 anos analisados.

 

Gado, industria florestal e óleo de palma

Mas quais são os produtos com maior impacto? Por exemplo, a criação de gado, ligada ao aumento mundial no consumo de carne, foi identificada como a causa principal da extinção de espécies de aves. Já as actividades florestais causaram as maiores perdas no sequestro de carbono.

No entanto, a produção de óleos de sementes demonstrou ser a actividade que mais contribuiu para o crescimento dos impactos nas aves e a segunda que mais contribuiu para o aumento das perdas no sequestro de carbono.

Em causa está por exemplo o óleo de palma, usado hoje em dia em muitos alimentos, produtos cosméticos e também nos biocombustíveis. A produção agrícola deste produto é a principal causa da desflorestação nos trópicos.

A equipa espera que as conclusões do estudo ajudem a evitar a extinção de mais espécies e novos impactos sobre os serviços de ecossistema. “Para lidarem com a crise da biodiversidade, os governos deviam (…) reconhecer a sua responsabilidade remota e promover uma mudança no desenvolvimento económico para actividades com baixo impacto na biodiversidade”, avisam os autores do artigo.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.