Lince-ibérico Niassa atropelada na A22 perto de Olhão

Niassa, com dois anos de idade, estava desaparecida desde o Verão passado. Esta fêmea, que tinha sido reintroduzida no Alentejo em Fevereiro de 2017, acabou por ser encontrada morta atropelada na A22, a auto-estrada que atravessa o Algarve, revelou o ICNF.

 

O cadáver deste lince foi encontrado por um técnico do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) a 14 de Abril, “com sinais de atropelamento”, segundo um comunicado divulgado ontem à noite pelo instituto. Niassa estava no separador central da A22 no sentido Tavira – Olhão, junto a uma área de matos.

Tinha “boa condição corporal, com um peso de 11kg” e sem vestígios de gestação. Agora serão realizadas uma necrópsia e análises complementares para dar mais informações sobre as circunstâncias em que sucedeu esta baixa na população de lince.

Actualmente estima-se que vivam em Portugal 41 linces. Destes, 27 foram reintroduzidos ao longo dos últimos quatro anos. Niassa foi um destes linces.

Nasceu no Centro Nacional de Reprodução do Lince-Ibérico (CNRLI) em Silves e, a 17 de Fevereiro de 2017, inaugurou a época de libertações desse ano em Portugal, mais concretamente no Vale do Guadiana, juntamente com o macho Noudar.

Nesse dia, Niassa foi libertada para ajudar a reforçar a única população conhecida de lince-ibérico em Portugal, então com 12 animais.

Desde a sua reintrodução, esta fêmea percorreu uma área alargada de território, “como é habitual na fase exploratória a seguir à libertação e antes de estabilizar um território”, explica o ICNF. O fim da dispersão de cada indivíduo depende de vários factores, como encontrar uma boa abundância de coelho-bravo, áreas tranquilas de refúgio e indícios de presença de outros linces.

A partir do final do Verão de 2017, Niassa deixou de ser detetada na área de reintrodução, “quer por emissão de sinal, quer por foto-armadilhagem, sendo dada como desaparecida”.

Segundo o ICNF, “a jovem lince terá atravessado áreas de habitat desfavorável, sendo impelida a transpor estradas que acabam por ser uma das principais causas de mortalidade da espécie, em particular as redes viárias de grande velocidade, no caso, as auto-estradas”.

 

Um atropelamento por ano nas estradas portuguesas

Este foi o quarto atropelamento de lince-ibérico em território nacional desde o início das reintroduções, sendo que apenas dois dos animais tinham sido libertados no Guadiana.

Um foi o lince Hongo, um macho de quatro anos, encontrado morto, por atropelamento, na A23 perto de Vila Nova da Barquinha (Santarém) a 22 de Outubro de 2015.

Cerca de um ano depois, o ICNF dava conta da morte de Kentaro, lince com três anos, atropelado a 15 de Outubro  de 2016 numa estrada do concelho da Maia.

A 17 de Maio de 2017, o macho de apenas um ano de idade, Neco, morreu atropelado na estrada municipal entre Mértola e Corte Gafo de Cima, apenas horas depois de ter sido libertado no Vale do Guadiana.

Apesar destas quatro mortes, “a mortalidade verificada encontra-se abaixo dos valores esperados”, comentou o ICNF.

A desfragmentação do habitat através da permeabilização de infra-estruturas tem sido uma prioridade do projecto LIFE+ Iberlince “Recuperação da área de distribuição histórica de lince ibérico em Espanha e Portugal” co-financiado pela Comissão Europeia.

“O seu efeito negativo pode ser atenuado por viadutos, passagens inferiores, vedações ou sinalização específica, em particular nos locais identificados como pontos negros.”

O lince-ibérico (Lynx pardinus) é uma espécie classificada desde 22 de Junho de 2015 como Em Perigo de extinção, depois de anos na categoria mais elevada atribuída pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), Criticamente em Perigo.

A viabilidade da espécie a longo prazo depende em grande medida da dispersão a longas distâncias feira por estes animais, pois permite a conexão genética entre diferentes populações naturais, sublinhou o ICNF.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Saiba o que está a ser feito para melhorar as estradas da área de reintrodução de linces, no Alentejo.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.