abelha europeia em cima de uma flor
Abelha-do-mel. Foto: Arturo Mann / Wiki Commons

Os cérebros são minúsculos, mas as abelhas afinal reconhecem o “zero”

Até agora pensava-se que apenas os humanos e outros animais de maior porte compreendiam o conceito de “zero” ou de “nada”, mas uma equipa internacional de cientistas provou esta semana que há abelhas que também o fazem.

 

“Investigadores australianos e franceses testaram se as abelhas-europeias (Apis mellifera) conseguem ordenar quantidades numéricas e perceber que o zero pertence ao extremo inferior de uma sequência de números”, explica um comunicado da RMIT University, na Austrália.

Estes cientistas conseguiram demonstrar que as abelhas-europeias, conhecidas também por abelhas melíferas, compreendem conceitos complexos e abstractos como o “zero”, apesar dos seus minúsculos cérebros. Os resultados do estudo foram publicados esta sexta-feira na revista Science.

“O zero é um conceito difícil de compreender e uma habilidade matemática que não se adquire facilmente. Para o aprenderem, as crianças precisam de vários anos”, nota Adrian Dyer, professor associado da RMIT University.

O número zero é também hoje a base das matemáticas modernas e dos avanços tecnológicos. Até há pouco tempo, acreditava-se aliás que apenas os humanos conseguiam entender esse conceito, mas pesquisas recentes mostraram que os macacos e algumas aves têm inteligência para isso.

“O que ainda não sabíamos, até agora, era se também os insectos conseguem compreender o zero”, destaca o professor, citado no comunicado.

Para chegarem a uma conclusão, Scarlett Howard, autor principal do estudo e investigador da universidade australiana, marcou algumas abelhas para as identificar. Depois, treinou-as para voarem para a imagem que tivesse menos elementos. Quando uma abelha acertava, recebia uma solução açucarada como recompensa.

 

Abelha envolvida na experiência laboratorial
Foto: RMIT University

 

Quando lhes apresentava uma folha com dois desenhos e outra com três, por exemplo, as abelhas aprenderam a escolher a primeira. Mas quando Howard as testou para escolherem entre uma folha em branco e outra com um desenho, os insectos optaram pela folha sem nada – isto apesar de nunca antes lhes ter sido mostrada.

A pesquisa foi conduzida tanto na Austrália como em França e envolveu numerosas experiências para validar esta descoberta.

 

Menos de um milhão de neurónios

Estudos científicos com abelhas-europeias já tinham concluído que estes insectos têm a capacidade de aprender uns com os outros e que compreendem conceitos como a semelhança e a diferença. No entanto, o cérebro destas abelhas tem menos do que um milhão de neurónios – muito abaixo do cérebro humano, com os seus 86.000 milhões de neurónios.

“A descoberta de que as abelhas conseguem mostrar uma compreensão elaborada dos números foi realmente surpreendente, devido aos seus cérebros minúsculos”, disse uma co-autora do estudo, Aurore Avasguès-Weber, da Universidade de Toulouse. “Isto mostra que não são precisos cérebros grandes para lidar com números. Esta capacidade é provavelmente partilhada por muitos outros animais.”

 

Descoberta pode influenciar inteligência artificial

Os cientistas esperam também que a nova descoberta abra caminhos para o desenvolvimento da inteligência artificial.

“Este é um problema de neurociência complicado”, reconhece Adrian Dyer, que é investigador no Bio Inspired Digital Sensing-Lab da RMIT University. “Como é que o cérebro representa o nada? Será que as abelhas e outros animais que coleccionam imensa comida desenvolveram mecanismos neuronais especiais que permitem a percepção do zero?”

“Se as abelhas conseguem perceber o zero com um cérebro que tem menos do que um milhão de neurónios, parece que há caminhos mais simples e eficazes para ensinarmos novos truques à inteligência artificial”, concluiu.

 

[divider type=”thin”]Saiba mais.

Recorde o que os cientistas descobriram sobre como é que as abelhas escolhem as flores.

 

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.