Erva-das-Pampas (Cortaderia selloana). Foto: Forest & Kim Starr/Wiki Commons

Combate às exóticas: conheça quem está a pôr um país inteiro a conter o avanço da erva-das-pampas

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Um pouco por todo o país, cerca de 50 entidades já trabalham para reduzir a área de distribuição da erva-das-pampas, uma das plantas exóticas invasoras mais relevantes em Portugal. A equipa do LIFE Stop Cortaderia quer colocar um país inteiro a remar para o mesmo lado.

A protagonista desta história é a erva-das-pampas (Cortaderia selloana), espécie da América do Sul que se tornou numa invasora muito preocupante em Portugal.

Erva-das-Pampas (Cortaderia selloana). Foto: Forest & Kim Starr/Wiki Commons

Será rara a pessoa que ainda nunca viu nenhuma, independentemente de a saber reconhecer ou não. Está na berma de estradas, dentro das cidades e mesmo em jardins. Apesar de se estender de Norte a Sul do país, as zonas mais invadidas são o Litoral Norte e Centro.

“Esta é uma planta nativa da América do Sul, mais concretamente da Argentina e do Chile, que foi introduzida em Portugal como planta ornamental” há muitas décadas, explicou à Wilder Hélia Marchante, investigadora na Universidade de Coimbra e no Instituto Politécnico de Coimbra e uma das responsáveis pelo Invasoras.pt. “Durante anos esteve limitada aos jardins onde era plantada mas, a pouco e pouco, começou a ultrapassar barreiras e a espalhar-se de forma descontrolada. Hoje é uma das plantas exóticas invasoras que mais tem aumentado a sua distribuição em Portugal.”

A espécie foi declarada invasora através da sua inclusão no Anexo II do Decreto-Lei n.o 92/2019, de 10 de Julho.

Foi para combater a expansão desta invasora nos países do sul do Arco Atlântico – Portugal, Espanha e França – que nasceu o projecto luso-espanhol LIFE Stop Cortaderia (2018-2022). A Câmara Municipal de Gaia e a Escola Superior Agrária de Coimbra são os parceiros do lado português.

Depois de cinco anos de trabalho, o projecto LIFE está a chegar ao fim. Mas o que foi conseguido até agora?

Em Portugal, este esforço concentrou-se, não tanto em remover as plantas – como em Espanha -, mas sim em mapear a erva-das-pampas a nível nacional, sensibilizar as pessoas para os problemas que causa e perceber qual a melhor forma de gerir esta ameaça à botânica autóctone.

Por exemplo, investigadoras do Centro de Ecologia Funcional (CFE) da ESAC/IPC e da Universidade de Coimbra, com colaboração de parceiros espanhóis, têm feito estudos para identificar quais as melhores épocas para fazer o controlo da erva-das-pampas, para saber como ajustar os tempos de continuidade após as primeiras intervenções de controlo e qual a melhor forma de gerir os restos vegetais e as sementes férteis.

Hélia Marchante e Mónica Almeida, da Escola Superior Agrária – Instituto Politécnico de Coimbra, explicaram à Wilder que tanto a formação e sensibilização das entidades que gerem o território e do público em geral como a dinamização da Estratégia Transnacional de luta contra Cortaderia selloana têm trabalhado para “colocar Portugal inteiro (e a Península, se consideramos também os parceiros espanhóis) a trabalhar para o mesmo objetivo: reduzir a área de distribuição de Cortaderia selloana, cada um no âmbito das suas atividades, capacidade e competências”.

Portugal conta já com 50 entidades aderentes (145 no total da Península Ibérica), entre municípios, associações, empresas, academia e o próprio Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). Dessas 50 entidades, 30 são câmaras municipais, entre elas Mealhada, Loulé, Lousada, Guimarães, Cantanhede, Matosinhos, Braga e Oeiras. Estas entidades estão distribuídas essencialmente no litoral do território do Continente.

Foto: Hélia Marchante

As entidades que aderem à Estratégia e que se comprometem a ajudar a lutar em rede contra a espécie recebem apoio técnico por parte da equipa do projecto, informação actualizada do que se tem feito no âmbito do LIFE Stop Cortaderia, informação técnica e científica e têm acesso ao Manual de Boas Práticas para controlo de Cortaderia selloana.

“Apesar da espécie ter distribuição por todo país, incluindo ilhas, em muitos destes locais (ainda) está presente como ornamental, plantada esporadicamente em jardins. A maior parte da invasão localiza-se precisamente no norte, centro e Lisboa, regiões de onde são a maior parte das entidades aderentes e que têm estado mais ativas na luta contra a erva-das-pampas”, acrescentaram Hélia Marchante e Mónica Almeida.

Além disso, várias destas entidades obtiveram financiamento do Fundo Ambiental, dedicada à gestão desta espécie, e têm estado no terreno a controlar a espécie, como por exemplo a Junta de Freguesia do Parque das Nações, Universidade de Aveiro, os Municípios de: Oliveira do Bairro, Lousada, Vila Nova de Poiares, Oliveira de Azeméis, Braga, Vagos, Oeiras, Cantanhede, Arganil e Aveiro, num total de 34 entidades financiadas e 200.000 euros de financiamento.

Algumas das entidades, mesmo sem financiamento do Fundo Ambiental, têm desenvolvido ações de remoção da espécie.

E este trabalho já está a dar frutos.

“Ainda que várias áreas do Norte e o Centro litoral tenham uma situação bastante problemática em termos de invasão por erva-das-pampas, acreditamos que é possível conter a espécie onde a invasão ainda não é tão notória e onde se pode mesmo falar em erradicação de populações, como nas zonas mais interiores e sul do continente e ilhas, e mesmo determinadas áreas nas regiões mais afetadas”, sublinharam as duas responsáveis.

Tanto mais que, além das entidades que já aderiram à Estratégia, muitas outras passaram a colaborar activamente no esforço comum para controlar a espécie.

“A aposta na dinamização da Estratégia Transnacional de luta contra Cortaderia selloana no Arco Atlântico, à qual têm aderido várias entidades na área de implementação do projeto, é um contributo valioso na gestão da espécie e que se pode prolongar para além do fim do projeto.”

E quando este projecto terminar?

Entretanto, no final de 2021 foi submetida uma candidatura ao projeto LIFE Stop Cortaderia+ para dar continuidade aos trabalhos. Esta proposta é desenvolvida em diferentes territórios desde Portugal até La Rochelle em França, passando pela Cantábria espanhola. O projeto, coordenado pela Associação Amica (ES), inclui entre os seus sócios: associações dedicadas a pessoas com deficiência, AMPROS e SERCA (ES); associações dedicadas à conservação da natureza, SEO/BirdLife (ES), Galiza Ambiental (ES) e Conservatório d’Espaces Naturels de Nouvelle Aquitaine (FR); entidades locais, Governo do Principado das Astúrias (ES), Conselho Provincial de Gipuzkoa (ES) e Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia (PT); e um centro de investigação, o Instituto Politécnico de Coimbra (PT).

Em caso de aprovação, este projeto vai começar no quarto trimestre de 2023 e terá a duração de cinco anos.

“Pretende dar continuidade aos trabalhos já em desenvolvimento, com as seguintes novidades: incorporação de outras espécies exóticas invasoras, para além de Cortaderia selloana, nas recomendações técnicas para a modificação das políticas públicas, nas certificações de sustentabilidade ambiental de diferentes sectores profissionais; a remoção das plantas de Cortaderia irá incidir nos espaços e habitats naturais de grande interesse, não só na Cantábria, Espanha, como se faz atualmente, mas também Galiza, Gipuzkoa e Astúrias, em Espanha, Nouvelle Aquitaine em França e Vila Nova de Gaia, em Portugal.”

“Mas mesmo que a candidatura submetida não seja aprovada, esperamos que o compromisso assumido pelas diferentes entidades ao aderir à Estratégia seja mantido e dê continuidade à gestão ativa da espécie”, acrescentaram.

Paisagem invadida por erva-das-pampas. Foto: LIFE Stop Cortaderia

Por seu lado, o ICNF, que aderiu à Estratégia Transnacional, comprometeu-se a elaborar um plano nacional de acção para o controlo da espécie, adiantou à Wilder Paulo Carmo, do Departamento de Conservação da Natureza e da Biodiversidade do ICNF. Este plano cria o enquadramento institucional necessário para o alargamento das boas práticas a todos os municípios afetados pela Cortaderia selloana.

Neste âmbito foi publicado a 14 de março o Despacho n.o 3143-B/2022, que aprova o orçamento do Fundo Ambiental para o ano de 2022 e inclui uma verba de 100.000 euros para a elaboração do plano de ação nacional para o controlo de Cortaderia selloana (erva-das-pampas), a concretizar através de um contrato com o Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra / Escola Superior Agrária de Coimbra.

“A publicação, por Resolução do Conselho de Ministros, do plano de ação nacional irá estabelecer um enquadramento legal para o desenvolvimento mais generalizado das ações de controlo desta espécie”, explicou.

Além disso está prevista a constituição de uma rede de alerta precoce e resposta rápida para detetar focos de invasão e reportar o seu controlo em termos nacionais. “Esta rede de alerta não é exclusiva desta espécie invasora, estando a plataforma eletrónica que lhe serve de ferramenta de base em fase final de construção.”

“O ICNF assumiu ainda o compromisso de sensibilizar a tutela para a necessidade de criar linhas de apoio financeiro para dar suporte às ações previstas na estratégia, o que foi concretizado pela abertura, em 2021, de um aviso, no âmbito do Fundo Ambiental, para candidaturas a financiamento para projetos de controlo desta espécie invasora.”


Esta é a Semana das Espécies Invasoras, celebrada em Portugal e em Espanha. Saiba mais aqui.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.