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Ribeira. Foto: Helena Geraldes (arquivo)

Europa removeu 487 barreiras fluviais em 2023, um número recorde

Um relatório publicado nesta terça-feira pela coligação Dam Removal Europe revela que em 2023 foram removidas 487 barreiras dos rios europeus, o que corresponde a mais de 4.300 quilómetros de rios reconectados. Portugal removeu duas.

As 487 barreiras removidas em 2023 em 15 países europeus representam um aumento de 50% em relação ao número recorde registado no ano anterior.

França e Espanha foram os países que mais barreiras removeram, 156 e 95 respetivamente, enquanto Portugal removeu duas barreiras, entre elas o açude de Galaxes, rio Odeleite, resultado de uma parceria entre a Associação Natureza Portugal/Fundo Mundial para a Natureza (ANP/WWF) e a Câmara Municipal de Alcoutim.

“É espantoso assistir a mais um ano recorde de remoção de barreiras em rios europeus”, comentou, em comunicado, Herman Wanningen, diretor da World Fish Migration Foundation, parceiro fundador da Dam Removal Europe. “As quase 500 barreiras removidas realçam o apoio crescente à recuperação dos rios para inverter a perda da sua biodiversidade, promover a sua resiliência face aos impactos das alterações climáticas e assegurar água em qualidade e quantidade para as pessoas.”  

Mas nem tudo são boas notícias, como refere Ângela Morgado, diretora-executiva da ANP/WWF. “A Lei do Restauro da Natureza está atualmente no limbo depois de não ter conseguido obter votos suficientes no Conselho Europeu, o que é um enorme retrocesso pois a proposta de lei inclui um objetivo crítico para a recuperação de 25.000 quilómetros de rios através da remoção de barreiras. Em Portugal, continuaremos o nosso trabalho para um efetivo restauro fluvial, pois só isso poderá garantir rios saudáveis para as pessoas e para a biodiversidade.”

O relatório alerta também para os riscos de segurança das barreiras fluviais obsoletas. Os rios europeus estão fragmentados por mais de 1,2 milhões de barreiras, incluindo mais de 150.000 barreiras obsoletas – muitas das quais representam riscos significativos para as pessoas e vida selvagem. Algumas barreiras foram identificadas como potenciais “máquinas de afogamento”, devido à formação de correntes subterrâneas fortes e imprevisíveis. Neste relatório fez-se a primeira tentativa de recolher informações sobre os riscos das barreiras para nadadores, canoístas e outros utilizadores recreativos dos rios. Verificou-se que ocorreram 82 incidentes em 16 países, que resultaram em 129 vítimas mortais. 

Por outro lado, também os fenómenos climáticos extremos devido às alterações climáticas estão a aumentar o risco de colapso de barreiras, em particular das mais antigas e obsoletas, colocando vidas e propriedades em risco e causando prejuízos económicos. Com dezenas de milhares de barreiras obsoletas espalhadas pela Europa, o potencial de falhas catastróficas é um risco crescente para as comunidades a jusante. A título de exemplo, no ano passado, pelo menos três barreiras fluviais desmoronaram devido a chuvas fortes na Noruega, Irlanda do Norte e Eslovénia.

Ângela Morgado alertou para a necessidade de eliminar estas barreiras obsoletas e evitar futuras catástrofes. “As barreiras obsoletas prejudicam o rio, aumentam a perda de biodiversidade e representam um risco crescente, uma vez que foram construídas para fazer face a condições climáticas muito diferentes das atuais. É altura de repensar a forma como gerimos os nossos rios, eliminando todas as barreiras obsoletas e deixando correr livremente o maior número possível de rios. Um rio que não corre livremente é um rio que morre lentamente”.

Portugal surgiu pela primeira vez nestes relatórios em 2022 por ter removido em Outubro de 2021 uma barreira fluvial no rio Vascão, um afluente da margem direita do Guadiana.

O Dam Removal Europe (DRE) é uma coligação de sete organizações: World Wildlife Fund (WWF), The Rivers Trust, The Nature Conservancy, European Rivers Network, Rewilding Europe, Wetlands International e World Fish Migration Foundation. A sua ambição é restaurar o estado de fluxo livre dos rios e ribeiros na Europa.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.