Lista Vermelha: Saiba quais são as 14 espécies de aves Criticamente Em Perigo em Portugal

A águia-pesqueira, a águia-imperial, o rolieiro e a narceja-comum são apenas quatro das 14 espécies de aves que correm um risco de extinção na Natureza extremamente elevado em Portugal. Uma em cada três populações de aves portuguesas está ameaçada de extinção, alerta a Lista Vermelha das Aves de Portugal Continental, apresentada esta tarde.

As aves mais ameaçadas de Portugal, na Categoria Criticamente Em Perigo, são a ganga (Pterocles alchata), o sisão (Tetrax tetrax), a pardela-balear (Puffinus mauretanicus), o abetouro (Botaurus stellaris), a narceja-comum (Gallinago gallinago), o perna-vermelha-comum (Tringa totanus), a gaivina-dos-pauis (Chlidonias hybrida), o airo (Uria aalge), a águia-pesqueira (Pandion haliaetus), a águia-imperial (Aquila adalberti), o tartaranhão-cinzento (Circus cyaneus), o milhafre-real (Milvus milvus), o rolieiro (Coracias garrulus) e o chasco-preto (Oenanthe leucura).

Esta lista foi feita no âmbito da Lista Vermelha das Aves de Portugal Continental e do III Atlas das Aves Nidificantes de Portugal, apresentados a 12 de dezembro em Lisboa. Mais de 400 ornitólogos voluntários e profissionais trabalharam ao longo de vários anos para conseguirmos ter um panorama do estado das aves em Portugal e, esperam os especialistas, direcionar esforços de conservação para aquelas que mais necessitam.

Nesta revisão da lista de 2005 foram abrangidas 285 espécies. Em 39 espécies foram avaliadas separadamente duas populações (a população reprodutora e a população invernante ou migradora de passagem).

No total foram avaliadas 287 populações distintas. Destas há, 173 não foram consideradas como ameaçadas (correspondendo a 60%): 142 populações (49%) foram avaliadas como Pouco Preocupante (LC) e 31 populações (11%) foram avaliadas como Quase Ameaçado (NT).

Portugal tem hoje 95 populações (33%) avaliadas nas categorias de ameaça: foram classificadas como Vulnerável (VU) 47 populações (16%), como Em Perigo (EN) 34 populações (12%) e 14 populações (5%) como Criticamente em Perigo (CR).

Entre as 34 populações Em Perigo estão o zarro-comum (Aythya ferina), o cortiçol-de-barriga-preta (Pterocles orientalis), a abetarda (Otis tarda) e a cegonha-preta (Ciconia nigra). Esta última tinha estatuto Vulnerável na Lista de 2005, tendo piorado a sua situação.

Já o abutre-preto (Aegypius monachus), que também faz parte do grupo de aves Em Perigo, viu o seu estatuto melhorar em relação a 2005, quando estava Criticamente Em Perigo.

Além disso, 11 populações estão dadas como Regionalmente Extintas (4%), como o tetraz-real (Tetrao urogallus) e o quebra-ossos (Gypaetus barbatus).

Segundo a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), a “situação é particularmente preocupante nos casos das aves de zonas agrícolas, das migradoras de longa distância e das aves marinhas: diminuiu a sua abundância e a sua área de distribuição e aumentou o seu risco de extinção no nosso país”, de acordo com um comunicado enviado à Wilder.

Aves como o sisão, a abetarda, a águia-caçadeira (ou tartaranhão-caçador) e o rolieiro, que há 20 anos eram mais abundantes nos campos alentejanos, sofreram reduções drásticas em toda a sua área de distribuição, incluindo dentro das áreas protegidas.

“As monoculturas agrícolas, a simplificação da paisagem, o aumento do regadio e do uso de agroquímicos está a arrastar para a extinção um grupo de aves único em toda a Europa, que são as aves das planícies de sequeiro do sul e centro de Portugal”, comentou Domingos Leitão, diretor executivo da SPEA. “É urgente reverter a intensificação agrícola e criar áreas de habitat agrícola com qualidade, se queremos salvar estas espécies da extinção.”

Outro grupo de aves em situação particularmente preocupante, alertam os especialistas, são as aves migradoras de longa distância que passam o inverno em Portugal. Estas aves têm visto as condições de nidificação no ártico dificultadas pelas alterações climáticas, ao mesmo tempo que as condições nas suas rotas de migração se têm deteriorado devido à pressão humana na orla costeira e nas zonas húmidas de que dependem: estuários, rias e lagoas costeiras. A drenagem de zonas húmidas para a agricultura, desenvolvimento urbano e turístico, a conversão de sapais e salinas em pisciculturas e outras alterações drásticas dos locais de paragem e descanso destas aves está a provocar uma redução acentuada das suas populações.

“Aves como os pilritos e os maçaricos enfrentam já situações extremamente difíceis nos seus locais de nidificação – se lhes destruirmos os refúgios em Portugal, dificilmente sobreviverão”, acrescentou Domingos Leitão.

Também aves marinhas que passam o Inverno no nosso país – como a gaivota-tridáctila, a torda-mergulheira e o papagaio-do-mar – registaram um agravamento do seu estatuto de conservação em Portugal Continental. No grupo das aves marinhas, as nidificantes, como a cagarra (que tem nas Berlengas a maior colónia de reprodução da Europa) e a galheta não escapam às tendências negativas, um reflexo de ameaças como a sobrepesca, as alterações climáticas, a captura acidental na pesca e a poluição dos mares.

Mas também há boas notícias.

“Temos resultados que demonstram que as ações de conservação funcionam e que as espécies respondem bem às melhorias e restauro do habitat e à redução das ameaças de origem humana”, sublinhou Domingos Leitão.

Exemplo do sucesso de projetos e ações de conservação a longo-prazo são as aves de rapina, como os abutres e as grandes águias, que beneficiaram de ações de conservação que reduziram ameaças sérias como a perseguição direta, o uso ilegal de venenos e a mortalidade em linhas elétricas. Como resultado, espécies como o abutre-preto, o grifo, a águia-perdigueira (ou águia-de-bonelli), a águia-calçada, o bútio-vespeiro e a águia-sapeira têm agora menor risco de extinção do que na Lista Vermelha anterior (que data de 2005).

Por outro lado, espécies como os patos terão beneficiado da redução da pressão da caça, pela diminuição de caçadores e gestão mais equilibrada daquela atividade. Já espécies de garças, colhereiros e ibis viram a sua situação melhorar graças à maior abundância de alimento nos arrozais e outras zonas alagadas, bem como a uma maior proteção dos seus locais de reprodução.

A Lista Vermelha das Aves de Portugal Continental 2022 visa reavaliar o risco de extinção das populações de aves que utilizam de forma regular este território português e identificar as populações ameaçadas, atualizando a secção correspondente que integra o anterior Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, que data de 2005. Relativamente à Lista Vermelha anterior, o número de populações classificadas como ameaçadas de extinção aumentou de 88 para 95 populações.

Para a avaliação do risco de extinção contribuíram também os dados do III Atlas das Aves Nidificantes em Portugal, que avalia as áreas de distribuição das espécies que se reproduzem no nosso país. Os trabalhos deste atlas decorreram entre 2015 e 2021, e envolveram mais de 400 ornitólogos voluntários e profissionais, num esforço de mais de 4500 horas de contagens de aves. Os trabalhos do atlas permitiram inventariar 241 espécies de aves nidificantes repartidas pelos territórios do continente e regiões autónomas, das quais 225 são nativas e 16 são não-nativas com populações estabelecidas.

“Estes projetos tiveram apoio financeiro do POSEUR/Portugal2020 e do Fundo Ambiental, mas estes resultados só foram possíveis graças à participação de grande número de ornitólogos, voluntários e profissionais. A todos devemos agradecimentos, mas principalmente aos que fizeram trabalho voluntário, na recolha de dados no campo, na coordenação regional, na escrita de textos ou na cedência de dados e ilustrações”, conclui Domingos Leitão.

A Lista Vermelha das Aves de Portugal Continental e o III Atlas das Aves Nidificantes estão disponíveis no site www.listavermelhadasaves.pt.

Os trabalhos foram liderados pela SPEA e desenvolvidos em parceria com a Universidade de Évora, Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), Instituto das Florestas e Conservação da Natureza da Madeira (IFCN) e CIBIO/BIOPOLIS.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.