Solta de Nara no Vale do Guadiana, em Maio de 2017. Foto: Helena Geraldes

Hoje é dia de soltar linces em Portugal

Odelouca, uma fêmea, e Ouriço, um macho, nasceram em cativeiro em Silves e serão libertados hoje, dia 1 de Março, na natureza, em Serpa. Pela primeira vez, a reintrodução de lince-ibérico acontece fora do concelho de Mértola.

 

Estes dois linces vão juntar-se à única população selvagem de lince-ibérico em Portugal, no Vale do Guadiana, no Alentejo. Aqui vivem 41 felinos de uma espécie Em Perigo de extinção.

Ambos nasceram na Primavera de 2017 no Centro Nacional de Reprodução do Lince-ibérico (CNRLI), em Silves. Odelouca é filha de Era e integra a primeira ninhada desta fêmea em oito anos de cativeiro. Ouriço tem menos de um ano de idade e ascendência genética de Hermes e Fresa.

Odelouca e Ouriço vão ser libertados na Herdade da Sobreira (Serpa), numa solta pública. A época de reintroduções em Portugal de 2018 – a quarta, desde que tudo começou a 16 de Dezembro de 2014 com Jacarandá e Katmandú – já libertou três linces de um total de seis.

 

Mel espreita viatura. Foto: Técnico/ICNF/LIFE Iberlince

 

A solta destes dois animais marca um novo capítulo na história de conservação que junta Portugal e Espanha para recuperar a distribuição histórica de uma espécie que se estima viver na Península Ibérica há, pelo menos, 27.000 anos. O concelho de Serpa junta-se agora ao concelho de Mértola como os únicos no país a ser palco de reintrodução desta espécie.

Esta decisão “deve-se ao novo contexto de distribuição da espécie, que conta com uma das fêmeas territoriais reprodutoras no concelho de Serpa”, Malva, explica o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) em comunicado. “Esta zona situa-se próximo do Pulo do Lobo, coração do Parque Natural do Vale do Guadiana, zona de matagais e onde se pratica uma gestão agro-silvo-pastoril e cinegética adequada ao fomento de coelho-bravo e à conservação de espécies selvagens”.

Actualmente a população selvagem do Vale do Guadiana terá nove fêmeas com território. Destas, pelo menos seis estarão prenhes e deverão ter crias durante o mês de Março, adianta o ICNF, com base nos trabalhos de monitorização no campo.

Ao todo, existem em Portugal cerca de 20 mil hectares com acordos de colaboração para a conservação do habitat do lince-ibérico e sua reintrodução.

 

Lince-ibérico. Foto: Programa de Conservação Ex-Situ

 

O lince-ibérico (Lynx pardinus) é um dos felinos selvagens mais ameaçados do mundo, um dos predadores carismáticos, tal como lembram as Nações Unidas, que estabeleceram o próximo dia 3 de Março como Dia Mundial da Vida Selvagem e o dedicam este ano aos Grandes Felinos, de forma a dar-lhes visibilidade e garantir que estarão entre nós nas gerações vindouras.

Mas para já, a “evolução do número de exemplares na natureza em Portugal e noutros locais da Península ibérica está a inverter a tendência regressiva da espécie que se acentuou nas últimas décadas do século XX”, segundo o ICNF.

Os mais recentes resultados do censo ao lince-ibérico, divulgados em meados de Janeiro, estimam a população mundial desta espécie em 547 animais. Destes, 402 concentram-se nos territórios andaluzes; os restantes 145 estão distribuídos por Castilla-La Mancha, Extremadura e Vale do Guadiana, em Portugal.

Este ano continuam os esforços de reprodução em cativeiro nos cinco centros da Península Ibérica (quatro em Espanha e um em Portugal) e as reintroduções na natureza, com a libertação de um total de 30 linces no total (seis no Vale do Guadiana). No ano passado foram libertados 40 animais (oito em Portugal).

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Leia aqui a entrevista que fizemos a Pedro Rocha, director do Departamento de Conservação da Natureza e Florestas do Alentejo, sobre as prioridades deste ano para o lince-ibérico no Vale do Guadiana.

Saiba como se liberta um lince na natureza.

Saiba como é cuidar dos linces no Vale do Guadiana.

Leia a nossa série “Como nasce um lince-ibérico” e conheça os veterinários, video-vigilantes, tratadores e restante equipa do CNRLI em Silves.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.