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Foto: Pixabay

A partir de 1 de Abril temos de começar a importar o peixe que comemos

Este ano, Portugal esgota o abastecimento de pescado local a 1 de Abril, mais cedo do que em 2016, alerta a plataforma PONG-Pesca. A partir desse dia, “Dia da Dependência de Pescado”, o país passa a depender de peixe importado de outros países para satisfazer a procura nacional.

 

O “Dia da Dependência de Pescado” (Fish Dependence Day) é uma iniciativa europeia que acontece todos os anos para “aumentar a consciencialização dos consumidores sobre a proveniência do pescado e da dependência da Europa de importações de produtos pesqueiros”, explica, em comunicado a PONG-Pesca, plataforma que reúne oito organizações não governamentais portuguesas.

Actualmente, apenas um quarto do pescado consumido em Portugal vem de águas portuguesas. Em 2016, gastámos o peixe capturado localmente a 20 de Abril. Este ano esgotámo-lo mais cedo, a 1 de Abril. A Europa a 28 terá o seu dia a 2 de Julho.

Esta dependência do pescado de outros países explica-se, especialmente, com um “excessivo consumo de produtos pesqueiros importados” e com a “sobre-exploração dos stocks europeus”.

Outro dado importante é que Portugal é o país europeu com maior consumo de pescado, segundo a Organização para a Alimentação e Agricultura da ONU (FAO). Actualmente, o país consome 62 quilos/per capita/ano, um número três vezes maior do que o europeu comum.

Para alguns recursos pesqueiros, as medidas de conservação que têm sido implementadas estão a dar “sinais positivos”, salienta a plataforma. Mas no geral, alerta a PONG-Pesca, Portugal e os outros países europeus passam a depender dos stocks de países terceiros, “fragilizados por políticas pouco sensíveis às questões de sustentabilidade na exploração de recursos marinhos”.

 

Que soluções?

Um dos caminhos será os consumidores diversificarem a sua dieta e passarem a consumir espécies que frequentemente não são aproveitadas. Rita Sá, da WWF e coordenadora da PONG-Pesca, disse hoje à Wilder que há inúmeras espécies que podemos comprar, como a cavala, o verdinho, a taínha de mar, o polvo e o carapau. “Há muitas espécies que, por hoje terem pouco valor comercial, são deitadas fora ou vendidas ao desbarato. Ao dar-lhes mais valor, vamos precisar de pescar menos as espécies mais exploradas”, explicou.

Uma das soluções passa por “criar mais mercado para outras espécies”, trabalhando com as autoridades responsáveis e grandes cadeias de distribuição para as tornar mais apetecíveis, desde que pescadas de forma sustentável.

Rita Sá lembrou ainda que os consumidores devem escolher “espécies na base da cadeia alimentar, normalmente espécies de crescimento rápido, e não predadores de topo, como o tubarão”. Estas “têm grande dificuldade em recuperar e existem em menor quantidade”. O desaparecimento destes predadores pode causar um “desequilíbrio” da biodiversidade marinha, de que os grandes avistamentos de medusas são um exemplo e consequência.

Quanto ao carapau, Rita Sá salientou que esta é uma espécie que está em “muito bom estado biológico”. Ainda assim, é preferível o carapau pescado por cerco e não por arrasto, uma vez que esta é uma estratégia que causa mais danos nos ecossistemas marinhos. “Na pesca de cerco, as redes não tocam no fundo do mar; fecham-se em redor de um cardume” mais perto da superfície.

Segundo a plataforma, a captura de pescado nas águas da União Europeia poderia aumentar 57% se os recursos fossem geridos de forma sustentável, citando um estudo de 2016 feito pela organização não governamental internacional Oceana.

“É, por isso, urgente aproveitar a oportunidade dada pela actual Política Comum das Pescas para aumentar e melhorar os actuais esforços no sentido de uma gestão sustentável, aproveitando o potencial produtivo das águas portuguesas”, conclui a organização. Pela sua parte, diz-se “disponível para colaborar com a administração e o sector das pescas nesse sentido”.

Fazem parte da PONG-Pesca a Associação Portuguesa para o Estudo e Conservação dos Elasmobrânquios (APECE), GEOTA (Grupo de Estudos do Ordenamento do Território e Ambiente), LPN (Liga para a Protecção da Natureza), OMA (Observatório do Mar dos Açores), Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza, Sciaena (Associação de Ciências Marinhas e Cooperação), Spea (Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves) e a WWF Portugal.

 

[divider type=”thick”]Agora é a sua vez.

Descubra mais sobre o que pode fazer pelo peixe no mar português com este Guia para Consumo do Pescado, sugerido pela WWF-Portugal.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.