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Foto: Joana Bourgard

Cientistas alertam: Ecossistemas terrestres estão a absorver cada vez menos CO2

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Os ecossistemas terrestres têm um papel importante na mitigação das alterações climáticas, mas até que ponto estas últimas podem estar a afectar essa tarefa? Um novo estudo agora publicado lança algumas pistas.

Quanto mais dióxido de carbono (CO2) é absorvido pelas árvores e pelas plantas durante a fotossíntese, que o absorvem para transformar a energia do sol em nutrientes, menos este gás fica retido na atmosfera, onde provoca o aumento das temperaturas.

No entanto, uma equipa de cientistas deparou-se com um facto preocupante: “À medida que crescem os níveis de CO2 na atmosfera, 86 por cento dos ecossistemas terrestres a nível mundial estão a tornar-se cada vez menos eficientes a absorvê-lo”, explica um comunicado do Goddard Space Flight Center, NASA, divulgado esta segunda-feira.

É verdade que concentrações elevadas de CO2 são muito importante para o aumento da fotossíntese e para o crescimento das plantas, um mecanismo a que os cientistas chamam de “efeito de fertilização do CO2”, ou ‘CFE’, de acordo com a sigla em inglês. Todavia, a forma como isto funciona parece estar a alterar-se.

Foto: Helena Geraldes

Uma equipa internacional de investigadores analisou múltiplas bases de dados baseadas em informação recolhida a partir de trabalho de campo, satélites e construção de modelos para tentar perceber melhor o que se passa. Os resultados foram publicados a 10 de Dezembro na revista científica Nature.

“Neste estudo, ao analisarmos os melhores dados disponíveis a longo prazo […], descobrimos que desde 1982, o efeito de fertilização do CO2 decresceu de forma consistente de 21% para 12% por 100 ppm (partes por milhão) de CO2 na atmosfera”, disse Ben Poulter, co-autor do estudo e cientista no Goddard Space Flight Center, citado no comunicado. “Por outras palavras, os ecossistemas terrestres estão a ficar cada vez menos de confiança como mitigadores temporários das alterações climáticas.”

Se não fosse a relação entre a fotossíntese e a presença de muito CO2 na atmosfera, Poulter considera que as alterações climáticas teriam progredido muito mais depressa.

Mas os cientistas têm estado preocupados sobre até que ponto o efeito de fertilização do CO2 é sustentável, até começar a ser afectado pela falta de outros “ingredientes” indispensáveis para o crescimento das plantas: água, nutrientes e luz do sol. A equipa tratou de incluir esses elementos na avaliação.

tapete verde de plantas silvestres
Foto: Joana Bourgard

Conclusão? “De acordo com os nossos dados, o que parece estar a acontecer é uma limitação conjunta de humidade e de nutrientes”, afirmou Poulter. Por um lado, nos trópicos, explicou o cientista, “muitas vezes não há nitrogénio ou fósforo suficientes para sustentar a fotossíntese”. Já nas regiões temperadas e boreais de latitudes mais elevadas, “a humidade do solo é agora mais limitadora do que a temperatura do ar devido ao aquecimento recente.”

Isso significa, alerta a equipa, que as alterações climáticas estão a enfraquecer a capacidade das plantas de mitigarem mais mudanças do clima em grandes partes do planeta.

Assim, poderemos começar a assistir a um aumento do CO2 que permanece na atmosfera depois de acções de desflorestação ou de queima de combustíveis fósseis.

Foto: MonikaP/Pixabay

Isso por seu turno poderá afectar as contas que têm sido feitas. “O que isto significa é que para evitarmos um aquecimento de 1,5 ou 2ºC e os impactos climáticos associados, precisamos de ajustar o orçamento do carbono que resta para termos em conta o enfraquecimento do efeito de fertilização do CO2”, alertou o cientista da NASA. “Por causa desse enfraquecimento, já não poderemos confiar tanto nos ecossistemas terrestres para a mitigação climática nas próximas décadas.”


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Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.