Jacinto-dos-matos (Muscari matritensis). Foto: João Farminhão

Descoberta nova espécie de flor para Portugal, o jacinto-dos-matos

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O jacinto-dos-matos (Muscari matritensis), que nunca tinha sido detectado em Portugal, acaba de entrar na lista da flora portuguesa. Por enquanto, esta espécie apenas é conhecida num único local, na Mata Nacional do Escaroupim, em Salvaterra de Magos (Ribatejo).

As flores do bonito jacinto-dos-matos, conhecido apenas para Espanha e França, captaram a atenção de Fernando Pires, naturalista da Associação Clube Xzen (Educação para a Cultura, Ciência e Desenvolvimento Sustentável) que, a 21 de Maio de 2022, estava a fazer um inventário da biodiversidade da Mata Nacional do Escaroupim.

Jacinto-dos-matos (Muscari matritensis). Foto: Fernando Pires
Jacinto-dos-matos (Muscari matritensis). Foto: Fernando Pires

Agora, a 3 de Julho, a sua descrição como uma nova espécie para Portugal foi publicada num artigo na revista científica Acta Botanica Malacitana.

Fernando Pires contactou João Farminhão, da Sociedade Portuguesa de Botânica e do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, para o ajudar a validar a descoberta.

“Não resisti ao convite e marcámos uma expedição” à Mata à procura da espécie, contou hoje o investigador à Wilder.

A expedição aconteceu este ano, a 20 de Maio, quando a planta está em flor.  Na verdade, segundo este botânico, o jacinto-dos-matos estará em flor de finais de Maio a Junho. As duas últimas semanas de Maio serão a melhor altura para partir à descoberta deste jacinto.

A dada altura “ficámos um pouco preocupados porque vimos que algumas plantas já estavam secas. Mas depois lá encontrámos um jacinto em flor, magnífico”. As suspeitas ficaram assim confirmadas.

Estes jacintos foram encontrados em clareiras de uma plantação de pinheiro-manso (Pinus pinea), em matos sobre areias, onde existe também um tojo endémico de Portugal.

Jacinto-dos-matos (Muscari matritensis). Foto: João Farminhão
Jacinto-dos-matos (Muscari matritensis). Foto: João Farminhão

O registo representa um aumento significativo da área de ocorrência da espécie para ocidente e a altitude mais baixa onde a espécie tem sido encontrada.

O jacinto-dos-matos é muito parecido a um outro jacinto, o  jacinto-das-searas (Muscari comosum). “As diferenças são muito subtis”, explicou João Farminhão. Para distinguir as duas espécies é preciso vê-las “ao vivo e a cores”.

Uma das diferenças reside na cor das flores. “O jacinto-dos-matos tem cores malva e ocre, enquanto que o jacinto-das-searas tem cores acastanhadas e violeta”.

Foram preparados dois herbários com esta espécie que estão no Herbário da Universidade de Coimbra e no Herbário do Museu de História Natural e da Ciência em Lisboa.

Para a próxima Primavera, a Sociedade Portuguesa de Botânica tentará descobrir novas localizações de jacinto-dos-matos. Por enquanto apenas se conhece uma população “muito isolada em relação às outras ocorrências ibéricas”, segundo o portal Flora-On. Ainda pouco de conhece sobre a distribuição do jacinto-dos-matos.

Actualmente são conhecidos para Portugal três espécies do género Muscari: o jacinto-das-searas, o cebolinho-de-flor-azul (Muscari neglectum) e agora o jacinto-dos-matos.

Jacinto-dos-matos (Muscari matritensis). Foto: João Farminhão

“É sempre interessante termos os números o mais actualizados possível sobre a diversidade botânica do nosso território”, comentou João Farminhão. Mas “ainda estamos longe do inventário completo da flora do país”.

Esta descoberta atesta a “importância das areias do Baixo Tejo para a flora de Portugal. Há várias espécies, como o goivo-das-areias, que estão circunscritas a essa área no nosso país”.

As areias do Baixo Tejo, ainda estão mal conhecidas, mas nelas ainda existem pequenos oásis de biodiversidade. Conhecê-las ajuda a completar o inventário de base das plantas de Portugal, crucial para conservar tesouros da natureza que enfrentam várias ameaças.

A invasão por acácia-bastarda (Robinia pseudoacacia), que foi detectada perto de algumas plantas, pode ser uma ameaça potencial para esta população de jacinto-dos-matos. “A germinação desta acácia poderá levar à perda da qualidade do habitat”, avisou João Farminhão.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.