Folhas de menta. Foto: Commonists/Wiki Commons

Como criar um jardim de plantas silvestres comestíveis?

Na série “Abra espaço para a natureza”, Carine Azevedo responde às dúvidas que temos quando pensamos em tornar um espaço mais amigo do mundo natural.

Um jardim pode ser uma delícia para os olhos, mas também para a boca. Adivinhamos o doce no vermelho dos morangos, a frescura no verde da menta e da hortelã, a tranquilidade na fragrância da erva cidreira. Criar um refúgio de perfumes e sabores silvestres no jardim é fácil, como vamos descobrir nesta curta viagem pela riqueza da flora nativa comestível que irá ligar os nossos sentidos ao melhor que a natureza tem.

Plantas silvestres comestíveis

Portugal possui uma vasta diversidade de plantas nativas que são excelentes opções para cultivar em jardins comestíveis. Cultivar estas plantas num jardim não só oferece uma diversidade de sabores, mas também desempenha um papel importante na preservação da biodiversidade e na promoção do equilíbrio ecológico.

Ao introduzir plantas silvestres comestíveis no jardim estamos a criar um habitat favorável para uma variedade de organismos, desde insetos benéficos até pequenos mamíferos e aves. Além de nos fornecerem alimento, estas plantas são uma importante fonte de néctar e pólen para polinizadores importantes, como abelhas e borboletas.

Borboleta almirante-vermelho. Foto: Alexandre Ultré/Wiki Commons

Já aqui escrevi anteriormente sobre jardins para a vida selvagem e jardins para borboletas.

Para começar a criar o seu próprio jardim de plantas silvestres comestíveis, aqui estão algumas plantas nativas que são excelentes opções para incluir e criar um espaço bonito e diversificado:

Amora-silvestre (Rubus ulmifolius)

Cerejeira-brava (Prunus avium)

Abrunheiro-bravo (Prunus spinosa)

Medronheiro (Arbutus unedo)

– Morangueiro-silvestre (Fragaria vesca)

– Mirtilo (Vaccinium myrtillus)

Sabugueiro (Sambucus nigra)

Murta (Myrtus communis)

Flores da murta. Foto: Giancarlo Dessi/Wiki Commons

– Urtigas (Urtica dioica)

– Orégão (Origanum vulgare)

Erva-cidreira (Melissa officinalis)

– Agrião (Nasturtium officinale)

Poejo (Mentha pulegium)

– Carqueja (Pterospartum tridentatum)

Rosmaninho (Lavandula stoechas)

Alho-porro-bravo (Allium ampeloprasum)

Alho-porro-bravo. Foto: Foto: Luis Fernández García/WikiCommons

– Funcho (Foeniculum vulgare)

– Tomilho (Thymus spp.)

Alecrim (Salvia rosmarinus)

– Belas-noites (Calendula arvensis)

– Borragem (Borago officinalis)

Violeta-brava (Viola riviniana)

Malva-de-três-meses (Lavatera trimestris)

Malva-real. Foto: Agnieszka Kwiecień / Wiki Commons

– Cebolinho (Allium schoenoprasum)

Hipericão-do-gerês (Hypericum androsaemum)

Espargos selvagens (Asparagus acutifolius)

– Rúcula (Eruca vesicaria)

Flor-de-mel (Lobularia maritima subsp. maritima)

Flor-de-mel. Foto: Cephas/Wiki Commons

Além de embelezarem o jardim, estas plantas podem ser uma fonte sustentável de frutos, flores e folhas que serão utilizados de várias maneiras na culinária, agregando sabor aos pratos de forma natural e saudável. As suas propriedades aromáticas e versatilidade tornam-nas verdadeiras aliadas na cozinha. O tomilho, o alecrim e o rosmaninho são ideais para aromatizar e realçar sabores, enquanto a flor-de-mel e a violeta-brava conferem um toque visualmente apelativo aos pratos. Por outro lado, a erva-cidreira, a urtiga e o funcho são excelentes para infusões e chás, proporcionando uma experiência sensorial única e contribuindo para o bem-estar geral.

Violeta-brava. Foto: Jörg Hempel/WikiCommons

Escolha do local e preparação do solo

Para criar um jardim de plantas silvestres comestíveis, é fundamental escolher cuidadosamente o local. Antes mesmo de pensar na disponibilidade de luz solar, drenagem do solo e disponibilidade de água, é importante ter em consideração a dimensão do espaço disponível. Se viver num apartamento e apenas tiver uma pequena varanda, por exemplo, pode optar por cultivar aromáticas em vasos ou canteiros elevados, já que estas plantas requerem menos espaço. 

Por outro lado, se tiver uma área exterior suficientemente grande, pode explorar opções como árvores grandes ou pequenas ou arbustos de frutos silvestres, por exemplo. Independente do tamanho, planear cuidadosamente o jardim e a quantidade de plantas a instalar garantirá um uso eficiente do espaço e um ambiente propício ao crescimento saudável daquelas.

No meu jardim, embora tenha uma área exterior grande, não tenho espaço suficiente para colocar árvores; por isso, apostei em alguns arbustos, como o medronheiro, a murta e o mirtilo. E ainda em outras plantas mais pequenas, como o alecrim, o rosmaninho, o morangueiro-silvestre, o orégão, a erva-cidreira, o cebolinho, o tomilho, as violetas, a flor-de-mel, entre outras, que me brindam com aromas e sabores incríveis.

Medronheiro. Foto: sara150578/Pixabay

Depois de verificado o espaço disponível, é necessário considerar as condições do local. Idealmente, devemos optar por áreas que recebam luz solar direta por algumas horas do dia e que estejam protegidas de ventos fortes. E, embora as plantas nativas tendam a ser mais tolerantes a condições adversas, como seca, calor intenso e solos pobres, é fundamental o acesso à água para promover o crescimento saudável e a produtividade.

A preparação do solo é igualmente importante para criar um ambiente propício ao bom desenvolvimento destas plantas. Antes de plantar, devemos remover toda a vegetação indesejada e promover o arejamento do solo para que as raízes se adaptem com mais facilidade, se desenvolvam livremente e absorvam os nutrientes necessários ao seu crescimento. A adição de compostos orgânicos, por exemplo, pode ajudar a melhorar a estrutura e a fertilidade do solo e aumentar a capacidade de retenção de água.

Plantação e cuidados

A etapa de plantação e os cuidados subsequentes são essenciais para garantir que as plantas cresçam de forma saudável e produtiva. Durante a operação de plantação ou de sementeira, é fundamental seguir algumas recomendações. Desde logo, esta deve ser feita de acordo com as instruções de cultivo específicas de cada espécie, incluindo:

– As plantas devem ser colocadas no solo na profundidade correta, garantindo que as raízes fiquem bem cobertas, mas sem enterrar demasiado o caule. Além disso, é essencial fornecer espaço suficiente entre as plantas para permitir que cresçam sem competição por luz solar, água e nutrientes.

– No caso das sementes, deve-se ter em atenção a profundidade da colocação das sementes no solo e a distância entre estas, por exemplo.

– No final da plantação ou da sementeira, é muito importante regar abundantemente as plantas para favorecer o estabelecimento das raízes e garantir uma hidratação adequada durante o período inicial de crescimento.

Terreno com plantas recém-nascidas. Foto: Hans/Pixabay

Os cuidados regulares, incluindo a rega adequada, a remoção de ervas daninhas e o controlo de pragas e de doenças são medidas essenciais para que as plantas se desenvolvam de forma saudável e para manter um jardim bonito. Por exemplo, as ervas daninhas podem competir por nutrientes e água, prejudicando o crescimento das nossas plantas. 

Adicionar uma camada de cobertura morta, casca de pinheiro, por exemplo, pode ajudar a reter a humidade do solo e a suprimir o crescimento de ervas indesejadas. Já as pragas podem danificar as folhas, as flores e os frutos, causando danos significativos na estrutura das plantas e afetando a produção desejada.

Por outro lado, algumas plantas podem beneficiar de uma poda ligeira para promover um crescimento saudável e manter o seu tamanho sob controlo. A fertilização regular pode também ser necessária, especialmente se o solo for pobre em nutrientes. Os fertilizantes orgânicos ou naturais são os mais recomendados, pois ajudam a promover um ambiente saudável, sem a introdução de produtos químicos prejudiciais. Para isso, a compostagem orgânica pode ser uma boa solução.

Colheita

Uma das partes mais gratificantes de cultivar plantas silvestres comestíveis é a colheita. No entanto, é importante certificarmo-nos de que esta é feita no momento certo para obter o melhor sabor e valor nutricional. Enquanto algumas plantas podem ser colhidas ao longo de toda a estação de crescimento, outras têm um período de colheita mais específico.

É também imprescindível garantirmos a identificação correta da planta antes da colheita, para evitar confusões com espécies tóxicas ou venenosas. Em caso de dúvida, é sempre prudente procurar uma orientação em fontes confiáveis antes de consumir qualquer planta.

Erva-cidreira. Foto: Michal/Wiki Commons

Para garantirmos que estas se regeneram, é fundamental seguirmos práticas sustentáveis de colheita. Em vez de colher tudo de uma vez, selecione apenas algumas partes da planta, permitindo que o restante continue a desenvolver-se e contribuindo assim para a saúde contínua daquela.

Este é o caminho certo para criar um jardim de espécies silvestres comestíveis que além de encantar os sentidos, também contribuirá para a preservação da biodiversidade e o equilíbrio ecológico. Ao cultivar estas plantas, estaremos a estabelecer um vínculo mais profundo com a natureza e a promover um estilo de vida mais saudável e sustentável. Então, mãos à obra!, comece a transformar o seu jardim num refúgio de aromas e sabores naturais.

Eu já comecei. Ao mesmo tempo que observo os polinizadores, como as abelhas e as borboletas, que são atraídos pelas flores das minhas plantas, contribuindo para a polinização e a saúde do ecossistema, posso colher morangos, mirtilos ou medronhos e saborear cada um deles com a certeza de que estou a experimentar um sabor autêntico da natureza. Colher folhas de menta, tomilho, orégão para as minhas infusões e temperos, e flores de flor-de-mel e violetas para decorar os meus pratos são outros dos motivos pelos quais tenho um jardim de plantas comestíveis. A natureza agradece, e eu também.

Flores de tomilho-vulgar. Foto: Salicyna/Wiki Commons

Na série “Abra espaço para a natureza” encontrará mais alguma informação que ajudará na escolha das espécies e nos cuidados a ter com as suas plantas. E se explorar a série “O que procurar: espécies botânicas” irá encontrar um vasto leque de espécies nativas que se poderão adequar às diferentes condições do seu jardim.

Aproveite para partilhar as fotos do seu jardim nas redes sociais com #jardimtemático e no Instagram, comigo (@biodiversityinportuguese) e com a Wilder (@wilder_mag).


Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas. 

Para acções de consultoria, pode contactá-la no email [email protected]. E pode segui-la também no Instagram.


A SPEA-Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves patrocina a secção “Seja um Naturalista”.