Um peixe-lanterna do género Gigantactis, fotografado a nadar por investigadores, no oceano Pacífico. Foto: Japan Agency for Marine-Earth Science and Technology

Estes misteriosos peixes do mar profundo passam a vida ao contrário

Cientistas publicam novo estudo sobre os peixes-lanterna do género Gigantactis, um grupo de espécies que pode ser também observado em águas portuguesas.

Uma equipa internacional de investigadores liderada pelo Museu da Nova Zelândia concluiu que um fenómeno que já tinha sido filmado há mais de 20 anos – peixes-lanterna que nadam numa estranha posição, de barriga para cima – será afinal um comportamento comum para estes misteriosos peixes do género Gigantactis.

As conclusões desta investigação, que se debruçou sobre oito vídeos filmados com peixes deste grupo em diferentes locais do mundo, desde as águas tropicais do Atlântico Leste até ao Pacífico, foram publicadas recentemente na revista científica Journal of Fish Biology.

“Mesmo quando pensávamos que não poderiam ficar mais estranhos, os peixes-lanterna conseguem ultrapassar-se a si próprios”, comentou Pamela Hart, uma professora da Universidade do Alabama que investiga este misterioso grupo de peixes, em declarações ao jornal The New York Times.

Peixe-lanterna filmado a 1300 metros de profundidade

Estes peixes do mar profundo vivem longe do alcance da luz solar e pertencem à ordem dos Lophiiformes, que inclui várias sub-famílias e géneros e mais de 300 espécies de peixes ósseos, como por exemplo o tamboril. Em muitas dessas espécies as fêmeas são bastante maiores do que os machos – podem chegar aos 40 centímetros de comprimento – e têm na cabeça o que se assemelha a uma cana de pesca com luz, um filamento bioluminescente. Dessa forma, atraem outros peixes na escuridão do fundo marinho, que são assim caçados e comidos. Já o comportamento dos machos, importantes na fase de reprodução, é de resto praticamente desconhecido.

Peixes misteriososos como estes são conhecidos em muitos locais do mundo, incluindo em águas portuguesas. Um exemplo é um peixe-de-farol (Himantolophus groenlandicus) capturado ao largo da Nazaré pelo rei D. Carlos há mais de 100 anos, actualmente em exposição no Aquário Vasco da Gama.

E sabe-se hoje que no mar português, ao largo da Madeira, vive também pelo menos uma espécie do género ao qual se refere o estudo agora publicado, o peixe Gigantactis ios. Os peixes que pertencem a este grupo em específico são conhecidos em inglês como ‘whipnose anglerfishes’, o que significa, traduzido de forma literal, “pescadores de cana de nariz de chicote”.

Um truque de caça?

Os cientistas acreditam que o comportamento de nadar virado ao contrário é geral para todas as fêmeas das espécies do género Gigantactis, sendo um “comportamento normal”. Objectivo? Não se engolirem a si próprias.

“Acreditamos que devido ao ponto de articulação daquele engodo, se estivessem a nadar de cabeça para cima e se atirassem a uma presa, haveria uma boa possibilidade de o engodo se dobrar para trás e para dentro da boca, e isso seria uma espécie de auto-golo”, indicou Andrew Stewart, curador de peixes no Museu da Nova Zelândia e primeiro autor do artigo científico, num programa da rádio CBC, no Canadá.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.