Cachalote mergulha frente à ilha do Pico, nos Açores. Foto: BiodivAMP

Novo projecto quer ajudar as áreas marinhas protegidas de Portugal

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Equipa quer melhorar as ferramentas de gestão e de monitorização das 83 áreas marinhas protegidas que existem hoje em território português. A Wilder falou com o investigador Gonçalo Silva.

Baptizado de BiodivAMP – Desenvolvimento de Ferramentas para a Monitorização e Proteção de Biodiversidade em Áreas Marinhas Protegidas ao longo da Costa Portuguesa, o novo projecto é financiado pelo Fundo Azul, tutelado pelo Ministério do Mar. O objectivo é criar mais ferramentas para que as áreas marinhas protegidas cumpram o papel para que foram criadas, disse à Wilder o coordenador, Gonçalo Silva, que trabalha como investigador no MARE – ISPA.

Liderada pelo ISPA–Instituto Universitário e pelo MARE, a equipa conta também com especialistas da ANP|WWF, CCMAR, Câmara Municipal de Esposende, EcoAlga, Instituto Politécnico de Leiria, Museu Marítimo do Funchal e Naturalist. A conclusão dos trabalhos, que têm a duração de dois anos, está prevista para o final de 2021.

Em Portugal, as 83 áreas marinhas protegidas, de âmbito nacional ou local, representam 1% de todo o mar territorial, ou seja, até 12 milhas náuticas da costa. Ou apenas 0,03%, se for incluída nas contas toda a Zona Económica Exclusiva (até 200 milhas náuticas).

Foram criadas com diversos objectivos, por exemplo como refúgio para espécies marinhas mais ameaçadas, para proteger determinados habitats de práticas de pesca que os destroem ou para permitir a criação de áreas de turismo.

Mas apesar de “constituírem uma importante ferramenta de preservação dos ecossistemas marinhos, a maioria das áreas marinhas protegidas em Portugal é apenas moderadamente protegida”, considera Gonçalo Silva, lembrando que nalguns casos “nem existe qualquer monitorização ou gestão adequada”.

Como lembrou um relatório recente divulgado pela ANP|WWF, são várias as lacunas na maioria destas áreas. “Este projeto vai contribuir para reverter esta tendência”, acredita o mesmo responsável, que destaca três apostas deste novo projecto financiado pelo Fundo Azul:

1. Projecto-piloto com ADN ambiental

Mergulhador junto a um cardume de sardinhas. Foto: BiodivAMP

Os cientistas ligados ao projecto estão a testar uma nova metodologia já usada noutros países para a monitorização de áreas marinhas protegidas, conhecida como ADN ambiental, mas que em Portugal só tem sido aplicada pontualmente, explicou Gonçalo Silva à Wilder.

Este trabalho está a ser feito em seis áreas escolhidas pela equipa e pelos parceiros do projecto: Parque Marinho Professor Luiz Saldanha (Parque Natural da Arrábida), Litoral Norte, Berlengas, Parque Marinho do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, Parque Marinho do Garajau (Madeira) e Parque Marinho do Canal Faial-Pico (Açores).

“Fazemos recolhas de amostras de água e de solo com fragmentos de ADN que se libertaram dos organismos [que estavam nesse ambiente] e que existem livres na água”, descreveu.

Em termos de logística, Gonçalo Silva acredita que o trabalho é menos exigente do que outros métodos para monitorização de espécies no oceano – como os censos visuais, em que são necessárias equipas de mergulho, ou o recurso a câmaras de filmagem com iscos. “Neste caso é só recolher e filtrar as amostras, armazenar, e o resto do trabalho é feito em laboratório.”

Já no que respeita aos custos, acredita que fica “ao mesmo nível” das outras técnicas.

O objectivo vai ser “optimizar esta técnica de forma a que seja utilizada como mais uma metodologia na monitorização de áreas marinhas protegidas”, de forma a “complementar outros métodos e não a substituí-los”.

2. Criação de um manual de boas práticas

Cachalote mergulha frente à ilha do Pico, nos Açores. Foto: BiodivAMP

A equipa vai também criar um manual com um conjunto de medidas úteis e concretas a seguir por quem gere as áreas marinhas. “Pretendemos agregar a informação que está dispersa, tentar organizá-la, e através do nosso painel de especialistas produzir um manual que ajude a pensar como monitorizar e gerir uma área marinha protegida da melhor forma.”

“Vamos tentar abranger todas estas áreas, pois são muito diversas, desde a legislação até às respectivas características. Neste manual vamos dar bons e maus exemplos concretos do que temos no país”, adiantou Gonçalo Silva. “Vai ajudar as pessoas a tomar decisões de forma mais sustentável e informada.” 

O responsável do BiodivAMP acredita que o novo documento estará disponível no final do próximo ano, embora “devido à pandemia de Covid-19, outros trabalhos ligados ao projecto já tenham sofrido atrasos”.

Em Portugal, o Estado é responsável pela criação e gestão das áreas marinhas protegidas de interesse nacional e por colaborar na gestão das áreas de âmbito regional ou local. Isso acontece por meio da Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos, em articulação com o Instituto da Conservação da Natureza e Florestas e o apoio do Instituto Português para o Mar e Atmosfera.

Nos Açores esse papel cabe à Direção Regional dos Assuntos do Mar; na Madeira, ao Instituto das Florestas e da Conservação da Natureza.

3. Promoção das áreas marinhas protegidas

Cardume de peixes. Foto: BiodivAMP

Outra das obrigações assumidas pela equipa ligada ao projecto é “dar a conhecer ao público em geral o que são as áreas marinhas protegidas”, indicou ainda Gonçalo Silva.

“Para preservar é preciso conhecer, as pessoas precisam de ter afectividade para sentirem algo como sendo delas”, sublinhou o cientista do MARE-ISPA, que reconhece que “a maior parte das pessoas quando pensam em mar pensam apenas em praia”.

O combate a essa falta de conhecimento vai fazer-se através de um novo site criado no âmbito do projecto, que divulga também mais informação sobre os objectivos e a equipa do BiodivAMP e vai estar sempre em desenvolvimento até ao final dos trabalhos, concluiu o investigador.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.