Paulo Presti: na ilustração, “quanto mais treinar, melhor você ficará”

Paulo Presti tem 30 anos, é um biólogo brasileiro e o vencedor da 7ª edição da Illustraciencia na categoria científica. Com mestrado pelo Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, está a fazer um doutoramento no Instituto de Biociências da mesma universidade. À Wilder contou que o treino é a “alma” de um bom ilustrador.

WILDER: Há quanto tempo faz ilustração científica?

Paulo Presti: Comecei a mexer com ilustração científica em 2011. Conheci a área num mini-curso de 12 horas que fiz durante a minha graduação (entrei na graduação em 2009). Neste mini-curso aprendi, brevemente, a trabalhar com nanquim (tinta permanente) e a partir deste contato inicial, procurei novas técnicas e novos cursos sobre ilustração científica para poder aprofundar mais. Até então, nunca tinha ouvido falar sobre ilustração científica. Em 2012/2013 fiz o meu primeiro trabalho profissional e desde 2014 venho dando cursos sobre ilustração científica. Então, posso dizer que estou na área de iustração científica há uns oito anos. 

W: Porque decidiu começar a desenhar?

Paulo Presti: Aqui é quase um cliché. Sempre gostei de desenhar, desde criança. Mas nunca cheguei a desenhar com o nível que trabalho hoje. Inclusive, nunca tinha imaginado chegar aos níveis de detalhes que consigo colocar numa obra colorida, por exemplo. Mas por causa dessa afinidade com o desenho, já tinha pensado em seguir carreiras mais ligadas ao desenho, como “Desenho Industrial” ou “Arquitetura”. Mas acabei indo para Biologia, uma outra área de grande afinidade que tenho desde pequeno. Quando entrei na graduação, não tinha pretensões de me tornar um ilustrador científico, até porque não tinha conhecimento desta área. Quando conheci a ilustração científica, adorei, pois combinava os dois mundos que gosto: a arte e a biologia. 

W: Porque escolheu os peixes para concorrer à Illustraciencia?

Paulo Presti: O peixe e os detalhes anatómicos que coloquei no concurso Illustraciencia são fruto do meu mestrado. Comecei o mestrado em 2017 e terminei agora, em 2019. Durante o mestrado, trabalhei com uma família de peixes (Polynemidae ou “threadfins”, o nome popular em inglês) e avaliei como se deu a evolução musculoesquelética nos animais desta família, realizando dissecções e descrições morfológicas detalhadas sobre, principalmente, a musculatura desses animais. Com isso, fui fazendo desenhos detalhados dos complexos anatómicos para poder retratar e documentar melhor os achados da minha pesquisa. Como estava imerso na morfologia destes peixes, acabei por produzir uma grande quantidade de ilustrações sobre o tema. Por isso optei por colocar uma parte destas ilustrações no concurso.

W: Qual foi a técnica ou as técnicas que usou para o “Threadfin Morphology”?

Paulo Presti: Usei lápis de cor Faber-Castell Polychromos para o corpo do peixe (colorido) e lápis grafite Staedtler para os três detalhes morfológicos (preto e branco).

W: Quanto tempo demorou a fazer a obra vencedora?

Paulo Presti: O corpo do peixe acabei por trabalhar a um ritmo rápido, considerando que se trata de uma ilustração colorida. Levei cerca de 20 horas para finalizá-lo. Quanto aos detalhes anatómicos devo ter levado cerca de 10 a 15 horas em cada um. Portanto, a obra como um todo foi finalizada em cerca de 56 horas.

W: O que significa para si esta distinção da Illustraciencia?

Paulo Presti: Acredito que a Illustraciencia é, atualmente, o maior e mais completo concurso de ilustração científica do mundo. A ilustração científica é, em si, uma área que ainda precisa de divulgação para a sociedade como um todo. Mas o trabalho desempenhado pela equipa da Illustraciencia é excepcional. Portanto, sinto-me muito feliz em ter ficado com a primeira colocação neste concurso que, inclusive, não é apenas um concurso, é um centro de divulgação e de formação de novos ilustradores científicos.

W: Qual a técnica e o assunto que mais gosta de desenhar?

Paulo Presti: Gosto muito de ilustrar temas relacionados com a zoologia. Tenho trabalhos botânicos também, mas sinto muito mais satisfação em retratar a fauna. Gosto bastante de ilustrar aves, também. Quanto às técnicas, gosto bastante de trabalhar com lápis de cor e para os trabalhos em preto e branco, gosto do poder de texturas que o grafite proporciona.

W: Que conselhos dá a quem quer começar a desenhar natureza mas tem medo de não conseguir?

Paulo Presti: O conselho é insistir. A chave para o desenvolvimento em qualquer técnica manual é a prática. Portanto quanto mais treinar, melhor você ficará.

W: Quais os principais elementos a ter em conta para ilustrar um peixe?

Paulo Presti: Os peixes são extremamente diversos e não há uma receita para se ilustrar um peixe. Mas, de uma maneira geral, deve-se sempre atentar ao número de escamas da linha lateral (quando presentes ou visíveis), é necessário prestar atenção ao número dos raios das barbatanas nadadeiras e a posição das mesmas ao longo do corpo. Na cabeça, o ilustrador também deve ter em atenção as linhas que se formam pela disposição dos ossos da cabeça, como a maxila, o pré-opérculo e o opérculo, por exemplo.


Saiba mais.

Pode ler aqui a entrevista com Elvis Antonio Salazar, o vencedor da Illustraciencia na categoria naturalista.


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Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.