Ouriço. Foto: Alexandra München/Pixabay

Uma em cada cinco espécies de mamíferos com elevado risco de extinção em Inglaterra

Pelo menos uma em cada cinco espécies de mamíferos em Inglaterra têm um elevado risco de extinção durante a próxima década, alertou o relatório mais completo sobre estes animais dos últimos 20 anos.

 

O relatório “Review of the Population and Conservation Status of British Mammals”, feito pela The Mammal Society a pedido da Natural England (organismo do Governo britânico) e divulgado ontem, alerta que o esquilo-vermelho, o gato-bravo e o morcego-orelhudo-cinzento enfrentam sérias ameaças à sua sobrevivência. Por exemplo, estima-se que apenas restem 200 gatos-bravos.

A área de distribuição do esquilo-vermelho tem vindo a registar um declínio acentuado desde 1995, algo ligado com o aumento do número dos esquilos-cinzentos, espécie exótica. Hoje o rácio é de 10 esquilos-cinzentos para um esquilo-vermelho. As doenças, algumas transmitidas pelo esquilo-cinzento, e a competição por recursos são factores que estão a fazer reduzir as populações destes animais.

Outros mamíferos, como o ouriço e o rato-dos-lameiros, viram as suas populações diminuir até 66% nos últimos 20 anos. Segundo o relatório, apenas restarão 132.000 ratos-dos-lameiros, quando em 1995 seriam um milhão. As causas são várias, como as espécies exóticas e as alterações no uso do solo, incluindo drenagem de zonas húmidas e canalização de cursos de água.

 

Rato-dos-lameiros. Foto: Peter Trimming/Wiki Commons

 

Já o ouriço, a população estimada é de 522.000 animais, o que é 66% mais baixo do que em 1995. “Os ouriços estão em dificuldades graves porque os insectos de que se alimentam estão em declínio, por causa de alterações nas práticas agrícolas e uso de pesticidas, atropelamentos e perda de habitat para se reproduzirem”, explica o relatório.

As alterações climáticas, a perda de habitat, o uso de pesticidas e os atropelamentos colocam sob pressão alguns dos mais amados e reconhecidos mamíferos terrestres britânicos. Agora, este trabalho avaliou a tendência populacional, as ameaças e as probabilidades de futuro para 58 espécies.

“Isto está a acontecer mesmo à nossa porta, por isso cabe-nos a nós todos tentar fazer o que pudermos para garantir que as nossas espécies ameaçadas não sigam o mesmo caminho do lince, do lobo e do alce que desapareceram de cá para sempre”, disse, em comunicado, Fiona Mathews, da Mammal Society e professora de Biologia Ambiental da Universidade de Sussex.

No entanto, há mamíferos que estão de boa saúde. Cinco espécies aumentaram em número nos últimos 20 anos e 18 aumentaram a sua área de distribuição. A lontra, a doninha, o castor e o javali ocorrem hoje em mais locais do que há 20 anos atrás.

Segundo o jornal The Guardian, o relatório analisou mais de 1.5 milhões de avistamentos de mamíferos em Inglaterra, muitos desses feitos por voluntários e cidadãos. Depois, os investigadores acrescentaram dados de mais de 500 estudos científicos já publicados para chegarem a estimativas do tamanho das populações e da área de distribuição de cada espécie.

Mas ainda falta saber o que está a acontecer a muitas espécies, como as toupeiras e os coelhos. Por isso, a Mammal Society apela a mais investigação, com carácter de urgência, para obter uma visão mais clara e precisa das populações de mamíferos britânicas. No mês passado, esta Sociedade lançou a aplicação Mammal Mapper para que qualquer pessoa que goste de natureza possa registar avistamentos de mamíferos locais através do seu telemóvel.

“Há uma necessidade urgente de mais investigação para avaliar as densidades populacionais em habitats chave porque, de momento, os níveis de incerteza são inaceitavelmente elevados”, comentou Mathews. Esta investigadora salienta o caso do texugo, coelho, rato-dos-lameiros e do morcego-orelhudo-cinzento. “É preciso criar estratégias de conservação e gestão para os mamíferos antes que seja tarde demais.”

Chris Packham, apresentador naturalista da BBC, alertou ontem para um “apocalipse ecológico” em Inglaterra. De acordo com Packham, as pessoas já normalizaram uma “catástrofe nacional” e apenas veem vida selvagem em reservas naturais. “As reservas naturais tornaram-se instalações naturalistas de arte”, disse, citado pelo The Guardian. “É como se estivéssemos a olhar para o nosso Constable ou Rothko preferidos. Vamos lá, apreciamos e sentimo-nos bem porque vimos um abetouro ou alguns alfaiates ou orquídeas. Mas na viagem para casa não há nada, apenas pombos e faisões não nativos ou texugos mortos na berma das estradas.”

“É catastrófico e é isso que esquecemos. A nossa geração está a presidir a um apocalipse ecológico e, de alguma forma, tornámos isso normal.”

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Pode ler aqui o relatório técnico (em Inglês).

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.