Vaca-loura. Foto: João Gonçalo Soutinho

Esta campanha permite-nos participar na conservação da vaca-loura

É o maior escaravelho da Europa e vítima do recuo de carvalhais e de soutos. O Vacaloura.pt, projecto até agora 100% voluntário, precisa de 7.500 euros para conservar a espécie em Portugal.

 

A campanha “Vacaloura.pt – Dar o próximo passo, para angariar fundos para este projecto de conservação, está a decorrer de 26 de Outubro a 20 de Dezembro deste ano na plataforma de crowdfunding PPL. Até agora, 68 pessoas responderam ao pedido de ajuda com um total de 1.380 euros.

Segundo os promotores da campanha, os fundos angariados serão usados já em 2019 em estudos genéticos das populações nacionais de vaca-loura (Lucanus cervus) e para perceber como estas irão reagir às alterações climáticas.

Antes de Maio de 2019, altura em que as vacas-louras voltam a voar, a equipa conta conseguir ter melhores plataformas de registo de avistamentos, fazer expedições científicas e ter mais material para promover a educação ambiental.

O Vacaloura.pt começou em 2016 e até agora já conseguiu saber mais sobre a distribuição da espécie em Portugal, especialmente com a ajuda de cidadãos cientistas.

 

Vaca-loura. Foto: Andrew Butko/Wiki Commons

 

“Quando o projeto começou, a área conhecida de ocupação da espécie era de apenas 9.700 quilómetros quadrados. Segundo os pré-resultados relativos a este ano, a área conhecida é de cerca de 19.800 quilómetros quadrados, o que equivale a cerca de 21,5% do território nacional continental”, contou à Wilder João Gonçalo Soutinho, coordenador do projecto. Estes valores não são definitivos. “Estes cálculos foram efetuados com base na presença/ausência em quadrículas com 100 quilómetros quadrados de área e, por isso, existe algum erro associado.”

A vaca-loura – espécie protegida pela Directiva Habitats e pela Convenção de Berna sobre a Vida Selvagem e os Habitats Naturais na Europa – está classificada na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) como Quase Ameaçada. Em Portugal sabe-se que tem vindo a perder muito do seu habitat, com a redução dos carvalhais e dos soutos. Conhecer a dimensão do problema é um dos grandes objectivos do Vacaloura.pt.

Em 2015, Portugal juntou-se à Rede Europeia de Monitorização da Vaca-Loura, que reúne 13 países com o mesmo propósito. Este é um esforço que reúne estudantes e investigadores da associação BioLiving, Unidade de Vida Selvagem do Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro, Sociedade Portuguesa de Entomologia e Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

“O projecto tem tido diversos avanços muito importantes, principalmente por se tratar de um projecto 100% voluntário, tanto da equipa que o coordena como dos cidadãos que nos ajudam e criam o verdadeiro valor que o projecto tem, os dados sobre a espécie”, disse João Gonçalo Soutinho.

Por exemplo, este ano mais de 300 cidadãos ajudaram a registar mais de 500 indivíduos, segundo os resultados preliminares. O censo decorre, normalmente, entre Abril e Setembro, o período durante o qual os animais estão mais visíveis.

É nestes meses que os escaravelhos acabam a metamorfose e passam de lagartas a escaravelhos propriamente ditos. Para trás ficaram três a quatro anos de vida dentro de madeira morta, enquanto lagartas que se alimentaram de raízes de carvalhos, normalmente de grandes dimensões, que morreram ou têm partes mortas. Por isso, são animais que ajudam a regenerar a floresta.

Os resultados definitivos do censo de 2018 só serão conhecidos no final do ano.

Na sua opinião, outro dos sucessos do projecto tem sido a sensibilização dos cidadãos “para a importância desta espécie e dos habitats a que está associada, madeira morta de carvalhos, principalmente em bosques com árvores autóctones”.

 

Souto da Lapa, Serra da Estrela. Foto: Wilder

 

A vaca-loura é apenas uma das 4.000 espécies de escaravelhos saproxílicos, ou seja, que ajudam a regenerar as florestas. Estes escaravelhos, que dependem da madeira morta pelo menos em parte do seu ciclo de vida, ajudam a decompor e a reciclar nutrientes nas florestas, assim como os fungos. Também são uma importante fonte de alimento para aves e mamíferos e algumas espécies deste grupo até são polinizadoras.

 

Financiamento para os próximos dois anos

Desde o início, a equipa de nove pessoas que trabalha no projecto tem sido voluntária. Agora, é altura de mudar.

“Esta campanha foi lançada agora porque achamos que precisamos de evoluir no que fazemos em relação à conservação da vaca-loura em Portugal”, explicou João Gonçalo Soutinho. “O voluntariado tem-nos permitido fazer muito, mas tem sempre as suas limitações. Este apoio financeiro permitirá responder a algumas questões que temos levantado e que por si irão também ajudar a definir melhor a estratégia de conservação da espécie a longo prazo no nosso país, além de melhorar as plataformas que temos, permitindo facilitar a relação entre os cidadãos que nos apoiam e o projeto.”

Os 7.500 euros representa o “somatório do que definimos como essencial para prosseguirmos e os custos que a campanha tem a nível de ressarcimento das despesas envolvidas”, acrescentou o responsável. “Esperamos que nos consiga ajudar durante os próximos dois anos e que acima de tudo nos permita descobrir novas fontes de financiamento a longo prazo.”

Para o futuro, a equipa quer continuar a trabalhar para “saber o máximo possível sobre a espécie em Portugal e definir o que de melhor pode ser feito para a conservar”. Já estão previstos dois estudos a curto prazo, “um relativo à análise genética das populações nacionais, o outro relativo ao que irá acontecer à espécie consoante os vários cenários de alterações globais que são esperados”, adiantou.

 

[divider type=”thick”]Agora é a sua vez.

João Gonçalo Soutinho sugere que crie habitats para a vaca-loura. Deixe que a madeira se decomponha de forma natural no seu quintal ou terreno. Assim estará a criar habitats para estas espécies. 

Na verdade, acrescentou o responsável, a “madeira morta não é só importante para estes animais”, como também aumenta a quantidade de matéria orgânica nos solos. “A sua decomposição permite o completar do ciclo natural das plantas, onde todos os minerais que a árvore que morreu foi acumulando durante a vida voltam à terra”. Solos mais ricos ajudam a melhorar o crescimento das novas gerações de plantas.

Além disso, “a madeira morta é muito importante na fixação de carbono atmosférico ou na retenção de humidade nos solos.”

 

[divider type=”thin”]O “Que Espécie é Esta?” recebeu um pedido de identificação de vaca-loura. Saiba mais.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.