Foto: Hans Braxmeier / Pixabay
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O que procurar na Primavera: o loendro

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A flora nativa de Portugal é composta por uma grande diversidade de árvores, arbustos e pequenas plantas. Estas espécies nativas são mais resistentes do que as espécies exóticas e garantem uma maior sustentabilidade e diversidade ecológica dos habitats.

Estas plantas estão mais bem adaptadas às condições edafo-climáticas do território nacional, além de serem menos exigentes em água e manutenção e também menos susceptíveis a pragas e doenças. 

As plantas devem ser plantadas de acordo com as suas condições naturais de desenvolvimento. A vegetação nativa, quando plantada no seu habitat natural, tem uma maior facilidade de adaptação. Logo, deve ser a principal aposta quando queremos instalar um jardim.

O loendro (Nerium oleander) é um exemplo de espécie nativa pouco exigente em manutenção e outros cuidados, muito adaptável e bastante resiliente. A sua floração exuberante e prolongada tornam-no numa espécie com grande valor estético e paisagístico.

O loendro

O loendro, também vulgarmente conhecido como oleandro, loureiro-rosa, adelfo, cevadilha, entre outros nomes comuns, é uma pequena árvore ou arbusto, da família Apocynaceae. Esta espécie perene pode crescer até aos seis metros de altura, formando uma copa ampla e muitos rebentos de raiz. Os ramos produzem um látex pegajoso, muito tóxico, que é facilmente exsudado quando são cortados.

Foto: Konevi / Pixabay

As folhas surgem dispostas em grupos de três por cada nó e são subsésseis, ou seja, possuem um pecíolo curto, que é a parte que as liga ao ramo ou ao caule. De forma lanceolada a linear, são agudas e coriáceas e a margem é inteira. A página superior da folha é verde-escura e a inferior é acinzentada. As folhas são glabras, logo não possuem pêlos, a nervura principal é saliente e as nervuras secundárias são evidentes. 

As flores do loendro são hermafroditas (femininas e masculinas), tubulares e pentâmeras, ou seja, as peças apresentam-se em conjuntos de cinco ou em múltiplos de cinco. As flores são grandes, assalveadas e compostas por cinco pétalas unidas na base e por cinco escamas franjadas. A corola é vermelha ou rosada na natureza, mas também pode ser branca, creme, amarelada ou roxa nos cultivares. Surgem agrupadas em corimbos terminais.

A floração do loendro inicia-se na primavera, prolongando-se ao longo de todo o verão.

Os frutos são do tipo folículo, fusiforme, simples, seco e deiscente. Em forma de cápsula e de cor castanho-avermelhado na maturação, o folículo abre por sutura ventral para libertação das sementes leves e tomentosas, de cor dourada e encimadas por papilho de pelos abundantes.

Foto: Luis Fernandez Garcia

A origem científica do nome da espécie é bastante curiosa e transporta-nos para a mitologia grega. Nerium deriva do grego Nerón, que significa húmido ou fresco e de Nerion, parente próximo de Nereu, Deus primitivo do mar, que era representado como o velho do mar, associado ao facto desta planta ser bastante comum nas margens do Mediterrâneo. Segundo alguns autores o epíteto específico oleander deriva do grego arodándrum e de rhododéndron, pela semelhança que as suas flores têm em relação às espécies do género Rhododendron. Outros autores sugerem que a designação oleander se deve à semelhança das suas folhas com as das espécies do género Olea, a oliveira.

Espécie mediterrânica

O loendro é uma planta nativa da região mediterrânica, desde a Península Ibérica ao Norte de África, e também do Sul da Ásia. Em Portugal encontra-se disperso por todo o país, mas é mais abundante nas regiões do Alentejo e Algarve. Pode encontrar-se também no arquipélago dos Açores, onde foi introduzido.

É uma espécie comum em matagais, ambientes rochosos e arenosos, em zonas frescas, e ao longo da margem ou do leito de linhas de água, em combinação com outras espécies ripícolas, como por exemplo o freixo e o amieiro. Também pode desenvolver-se em taludes e encostas rochosas. 

Desenvolve-se preferencialmente em regiões de climas temperados, em locais de exposição solar plena. Suporta bem o ar marítimo, sendo também comum junto ao mar. Está bem adaptado a qualquer tipo de solo, tanto básico como ácido, desde que possua alguma humidade e nutrientes e esteja bem drenado. É uma planta bastante tolerante à seca, e é bastante resistente a ventos fortes. Não é tolerante a temperaturas inferiores a 5ºC negativos. 

No habitat natural, o loendro encontra-se na forma de arbusto, contudo poderá ser conduzido como uma pequena árvore. Os espaços naturais onde o loendro é a espécie dominante denominam-se loendrais ou alandroais.

Foto: Zeynel Cebeci / Wiki Commons

O loendro é muito usado para estabilizar terrenos e é amplamente cultivado como planta ornamental, como exemplar isolado ou em composições com outras plantas, em sebe informal ou mesmo em floreiras e vasos, sendo muito comum em jardins particulares e em parques e jardins públicos, ao longo de avenidas e no separador central de muitas estradas e autoestradas.

Hoje em dia são inúmeras as variedades e cultivares desta espécie. Existem formas anãs, folhagens variegadas, flores simples ou dobradas e várias cores. A folhagem perene, a beleza e exuberância das suas flores e a sua grande resistência tornam-na bastante interessante. No entanto, a sua utilização e localização em espaços verdes deveria ser sempre antecedida de um rigoroso estudo e planeamento, uma vez que é uma das plantas mais tóxicas conhecidas.  

Uma das plantas mais venenosas do mundo

 A planta inteira (caule, raminhos, folhas, flores, sementes e raízes) é tóxica para qualquer animal e até para os humanos, devendo ser manipulada com muito cuidado. 

O loendro produz látex que, em contacto com a pele, pode causar irritação e até dermatites. A ingestão de uma folha ou de uma flor pode causar inúmeros problemas, nomeadamente bradicardia (ritmo cardíaco irregular ou lento) e o aumento da frequência respiratória, dispneia, distúrbios gástricos, incluindo vómitos, náuseas, diarreia e a sensação de queimaduras internas, distúrbios do sistema nervoso central, incluindo vertigem, tonturas e sonolência ou até mesmo coma e morte. Os sintomas podem ocorrer várias horas após a ingestão. Já ocorreram casos de mortes por ingestão de uma só folha em crianças e até pela utilização da madeira desta planta em paus para espetadas.  

A toxicidade do loendro deve-se sobretudo à presença de um alcaloide – a oleandrina, um glicósido tonicardíaco e diurético. No entanto, esta planta contém outros princípios tóxicos que são preservados mesmo após a secagem, como por exemplo a neriantina. Também as flores têm um aroma considerado tóxico, mas nada de alarmante.

Assim, se estiver a pensar em plantar esta espécie, deve evitar fazê-lo em locais frequentados por crianças e animais. O consumo de folhas desta planta pode provocar a morte de animais e até mesmo de humanos, se em grandes quantidades. Deve evitar-se que as crianças mexam na planta mas, caso aconteça, devem lavar muito bem as mãos depois de lhe ter tocado. 

Foto: upslon / Wiki Commons

Devido à elevada toxicidade, o loendro não tem aplicação na cozinha e as suas raízes atuam como raticida. 

Embora seja uma planta muito tóxica, alguns princípios ativos podem ser usados em homeopatia ou fitoterapia, possuindo propriedades cardiotónicas e diuréticas. Na medicina tradicional, as folhas têm sido utilizadas para diversos fins medicinais, incluindo o tratamento de doenças cardíacas, como diurético, antibacteriano e contra picadas de cobra. As raízes têm sido utilizadas externamente na medicina tradicional para tratar cancros, úlceras e lepra.

Alguns autores apontam o loendro como bioindicador vegetal de poluição atmosférica, nomeadamente por metais pesados, tendo já sido alvo de estudo para avaliar a contaminação em meio urbano, através da análise da concentração de metais em folhas de plantas expostas (lavadas e não lavadas) e da concentração dos metais do solo. Nesses estudos, os níveis elevados de metais pesados encontrados nas amostras de plantas e solo de áreas urbanas decorreram do intenso tráfego automóvel, considerado como principal fonte de contaminação por metais pesados, principalmente chumbo (Pb).

O que torna esta planta tão resistente?

O loendro, à semelhança de outras espécies vegetais, desenvolveu, ao longo de um extenso processo evolutivo, um conjunto de adaptações morfológicas e fisiológicas que lhe permitem resistir e sobreviver a condições ambientais adversas. As folhas revestidas por cutícula e os estomas protegidos por pelos, que evitam a perda de água por transpiração, tornam-no numa planta resistente ao frio, ao calor e ao vento. Desenvolve-se em qualquer tipo de solo, seja básico ou ácido, e é bastante resistente à poluição urbana. Não necessita de grandes cuidados de manutenção e tem um crescimento rápido.

Podemos ter um loendro no jardim, sim, pela resistência, adaptabilidade e generosidade, mas a sua localização deve ser pensada e refletida para evitar acidentes com crianças e animais. Se o procurar na natureza também ficará deslumbrado com a sua beleza natural. 


Dicionário informal do mundo vegetal: 

Subséssil – quase séssil, com pecíolo ou pedicelo muito curto

Tubular corola que possui um tubo muito alongado

Assalveada – flor com corola semelhante à da Salvia

Folículo – fruto seco, com várias sementes, que se abre por uma única fenda para libertar as suas sementes

Deiscente – fruto que, quando maduro, se abre naturalmente para libertar as sementes

Estoma – poro ou abertura localizada na epiderme da maioria dos órgãos das plantas, sendo mais abundante na página inferior das folhas, e que tem a função de estabelecer a “comunicação” do meio interno com o exterior, através das trocas gasosas (dióxido de carbono, oxigénio) e da transpiração (vapor de água)


Todas as semanas, Carine Azevedo dá-lhe a conhecer uma nova planta para descobrir em Portugal. Encontre aqui os outros artigos desta autora.

Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas. 

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